Em busca da magia perdida (por João Leonardo Medeiros)

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Em algum momento de 2012, perdemos nossa magia. A cada dia que passa estou mais convencido de que nossa extraordinária campanha daquele ano provocou uma espécie de descolamento da alma da qual ainda não nos recuperamos. Não estou me queixando da vitória, nem da campanha em si, porque, para dizê-lo honestamente, adoro ganhar, de par ou ímpar ao que quer que seja (embora não a qualquer custo, vale a ressalva). Estou me referindo ao efeito curioso provocado pela campanha de sucesso no espírito tricolor.

Há times que vencem corriqueiramente daquela forma, com uma campanha de colonizador imperialista, sem fazer esforço aparente, com a fleuma de um Federer, de um Bolt, de um Schumacher. Creio que o São Paulo funcione dessa forma, assim como o Cruzeiro e a dupla Grenal. Tomando a história como um todo, não ganharam mais do que nós. Mas ganharam de forma diferente, nem melhor, nem pior. Times como o Flamengo e o Corinthians têm um terceiro padrão, nem sempre meritório (vezes em que o ganhar por qualquer meio se apresenta), mas também vencem limpamente e, quando o fazem, aproximam-se mais do São Paulo e dos outros citados do que de nós.

Nós somos o melhor exemplo da vitória doída. Não somos o único, mas somos o melhor deles. Nossas conquistas típicas têm heróis improváveis, um Mickey aqui, um Magrão ali, gols diversos nos últimos minutos, viradas inesquecíveis. Somos useiros e vezeiros em conquistar títulos em certames nos quais não figurávamos entre as equipes mais cotadas para a vitória. De tanto repetir esse feito, conseguimos ironizar o apelido pejorativo de “timinho” e tomá-lo para nós.

Em 2012, atropelamos. Eu adorei à época e adoro hoje. Foi o ano do nascimento do meu filho e me convenci que ele era o messias tricolor (ainda creio nisso e só nisso, porque não tenho outras crenças). Mas, de hoje, percebo que aquela vitória fez mal à alma tricolor. Foi uma conquista fácil, mas instrumental. Foi uma covardia, na verdade. Não porque nossa equipe fosse muito superior, mas porque jogava com a certeza da vitória. E ganhava, ganhava, ganhava, com goleadas de um único gol, fechada na defesa, ou não. Ganhava de todo mundo, dentro e fora de casa.

O Fluminense, para repetir, não é assim. Por que vocês acham que o gol de barriga de Renato Gaúcho entrou para a nossa história? Por que foi contra o Flamengo, no ano do centenário deles? Ora, isso é examinar o fenômeno pela ótica do Flamengo, valorizar o ponto de vista rival. O gol de Renato entrou para a história porque nosso time era muito pior, porque o técnico era Joel, porque Renato era um ídolo decadente, porque a gente estava há quase dez anos sem título. Nós jogamos com muita alma aquele campeonato e não podíamos perder. A barriga de Renato nos redimiu.

Para dizê-lo numa linguagem rodrigueana, nossas sandálias franciscanas da humildade perderam-se dentro do armário de 2012. Temos hoje dificuldade de retomar a magia, talvez porque pensamos que poderemos repetir 2012 eternamente. Não creio que sirva de parâmetro. Temos de repetir o Telê de 1952, o Mickey de 1970, a raça de Edinho em 1980, a corrida de Assis de 1983, a barriga de 1995, o cocuruto de Antônio Carlos em 2005, as jornadas mágicas de Adriano Magrão em 2007, o sangue e suor de Conca em 2010, apenas para tomar alguns exemplos. Temos de ganhar com o que tivermos em campo, com nosso toque de Midas habitual.

Nosso elenco atual é o melhor do Brasil? Não é, certamente. Mas pode conquistar alguma coisa expressiva se reviver o que nós sempre fomos: aquilo que o sambista tricolor Cartola representou em essência, genialidade revestida de corpo modesto e alma elevada. Não nos preocupemos em formar um esquadrão imbatível, coisa que nem grana temos para fazer. Seria melhor se pudéssemos ensinar a nossos jogadores, ao nosso treinador e aos novos torcedores um pouquinho da história do Flu. Basta isso para que retomemos o caminho das conquistas.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Imagem: JLM / PRA

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