Volver a empezar (por Paulo-Roberto Andel)

Todos os olhos, corações e sonhos estão voltados para o drama da América na próxima quarta-feira. Eu, que caminho tão sozinho neste mundo, desprezado pelos deuses e humanos, tenho tido um sentimento irremediável de que o Fluminense estará entre os quatro gigantes quando a quinta-feira chegar. Isso é só um palpite de um reles mortal desimportante nessa terra gigante, mas é o que tenho sentido. Queremos a América, queremos que seja só nossa para sempre. Não será fácil, mas isso é outra história que fica para amanhã ou depois.

Então voltamos a campo. Começar de novo. Discreto, o campeonato brasileiro começa sem pompa ou alarde, quase escondido, como se tudo fosse uma estratégia de marketing antivamp por excelência. Parece estranho, mas o que não é estranho no país do futebol?

VOLVER A EMPEZAR

Pois bem: à frente, o velho rival de velhas cores. Atlético Paranaense. Não guardamos rancor daquela entrega suja, o tempo e os livros cuidam disso. Já passou. Hoje somos outros, bem melhores, avançados, temos outras histórias a escrever. Agora quem volta da segunda divisão são eles, nós lutamos pelo pentacampeonato. Damo-nos ao luxo de escalar o time reserva e jogarmos de igual para igual, mesmo sofrendo algumas pressões: a Gávea genérica tem um time jovem, impôs correria, chutou bolas na trave e, no fim do jogo, sufocou o eterno estilo que temos adotado: segurar o resultado em casa sem grande opulência ofensiva. Mas isso está longe de ser uma “cornetagem”, apenas um comentário – ninguém pode dizer que não deu certo em 2013.

Fizemos 1 x 0 na boa cobrança de pênalti feita por Sobis, jogador que tem a América tatuada no rosto. Samuel foi trucidado pelo zagueiro paranaense. Depois eles empataram numa bobeada nossa: bola parada, o incrível Manoel (um dos piores zagueiros da história do futebol) vem sozinho de cabeça e quebra Ricardo Berna. Do nosso goleiro, volto a dizer o de sempre: só os ingratos esquecem o que ele fez em 2006 e 2010 pela nossa camisa. Não há dúvidas de que Cavalieri é o melhor goleiro do Brasil, mas como é bom ter Ricardo Berna em nosso elenco. Discreto, sem espalhafato, aceitou dissabores sem amargar, é o jogador mais antigo do atual elenco do Fluminense e, espero eu, que chegue a dez temporadas conosco – ele merece.

Felipe não brilhou nas soluções criativas, mas é bom ver seus passes – a bola desliza, leve, macia, feito o poema que pretende torpedear o coração da mulher amada. É o estilista de um futebol que já não existe mais, em seus momentos derradeiros. Aproveitemos.

Segundo tempo, lá e cá, a correria atleticana em campo, o Fluminense golpeando, veio a estocada final: bola da esquerda, mais uma excelente jogada de Sobis, o cruzamento e Samuel teve seu momento de Romário: finalizou como nunca, impecável, abriu a vantagem no marcador e consolidou o caminho para a vitória. Mais vinte minutos, os caras nos pressionaram muito, Berna brilhou, tiramos de canela, cabeça ou como fosse possível. Foi bom ver o garoto Eduardo em campo, bela promessa. Duro mesmo foi ter ficado de fora da estrada no último momento: onde foram parar meus fiéis? A turma que sempre vai a tudo lá esteve. De longe, fui um estrangeiro solitário: nem a melhor tela plana do mundo consegue captar as cores, os sonhos e os amores que florescem quando o Fluminense está num gramado.

Nossos corações estão voltados como rifles para a América, mas sempre é bom estar na dianteira do campeonato brasileiro. A primeira vez, a primeira vitória, o primeiro passo de um novo caminho de volta a América, quem sabe? Isso se, para desespero de pequenos jornalistas, não chegarmos muito mais longe do que se pensa nesta Libertadores.

Alguma coisa acontece em nossos corações.

Paulo-Roberto Andel

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: “Volver a Empezar”, José Luis Garci, 1982, Oscar de melhor filme estrangeiro. 

ANUNCIO 1995

3 Comments

  1. “…a gávea genérica…”
    Sensacional!! Hahahahahahahahaaha!
    Rumo ao penta-bi!
    ST.

  2. Caro Paulo, noto que estamos todos preocupados em ser tachados de corneteiros. Não existe isso quando se critica falando a verdade, que é o papel do colunista. O fato de o Flu abdicar do ataque em seus jogos é uma realidade, não uma crítica. Fechar os olhos para essa escandalosa verdade em nada nos ajuda. Não queremos viver no mundo da Pollyana, onde tudo é cor de rosa e os dramas reais escondidos sob o tapete. O Flu que queremos não somente vence, mas convence. O grande adversário do Flu tem sido ele próprio e toda as as dificuldades por que tem passado tem sido criadas pela sua forma de jogar, que oferece aos adversários espaço e oportunidades de se impor psicologicamente em campo, sejam fortes ou fracos. O escritor tem o dever de escrever sem medo das críticas. Corneteiro não é quem diz a verdade e quem tenta ajudar o clube. Todos temos orgulho do Flu e queremos o melhor pra ele, mas não será com subterfúgios que o iremos ajudar. Abraço

    1. Jorge, há muitas vertentes. Eu não pretendo ser o dono da verdade. O resumo é de cada um. Braxxx de sempre.

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