Será que a culpa é dos Guerreirinhos? (por Wagner Victer)

Viralizou nas redes sociais um grupo de garotos, da ordem de dez anos de idade, cantando hinos da mulambada usando a camisa de franquias da escolinha, chamada Guerreirinhos Tricolores.

Entre nossa torcidas e aqueles até mais apaixonados, houve um certo frisson.

Alguns queriam expulsar as crianças e fechar a franquia, aliás até anunciado como decisão pela direção do Flu, porém não conseguiram compreender o que está por trás de tudo isso, que é mais um pequeno iceberg que se desprende, mostrando para reflexão a forma como estamos conduzindo a nossa chamada base, que não se resume só a Xerém.

Me lembro que, durante uma competição sul-americana, nas diversas vezes que estive assistindo jogos no restaurante do Fluminense, Dom Hélio, observava que no mesmo dia e horário, nossas escolinhas – que deveriam estar concentradas naquele jogo decisivo e torcendo pelo clube, até idolatrando -, tinham por coincidência infeliz suas atividades mal planejadas, pois logicamente ficavam impedidos inclusive de criar e desenvolver aquela relação afetiva com o Clube.

Da mesma forma, recentemente, um dos jogadores do nosso time, até bem associado à marca, pois adaptou um veículo antigo às cores do Fluminense, quando perguntado não soube responder quem era o Casal 20.

Isso me remeteu ao que vivenciei como Secretário de Educação, quando estive com um conjunto de jovens da base de Xerém do Fluminense, e que levei para visitar à Game XP e fiz perguntas básicas sobre a história do Fluminense, sobre detalhes do nosso hino e ate se haviam visitado nosso Centro Histórico de Memória. Para a minha surpresa, a grande maioria demonstrava total desconhecimento sobre a história e a relação com o Clube.

Em nossa base, tão fértil na produção de talentos, muitos ex-funcionários que conduziram esses jovens se tornaram agentes de futebol, como os famigerados Zangoes, e adotam uma postura ética totalmente inaceitável, até navegando tranquilamente dentro das dependências do Clube durante os treinamentos, enquanto os pais que levam seus filhos para treinar são submetidos à situações vexatórias, como ficarem junto ao muro em escadas alugadas, sob o sol e chuva, sem ter um lugar, inclusive, para ir ao banheiro.

A ligação e o carinho com o Clube se constroem desde baixo e não é fechando escolinhas, brigando ou esperneando quando um atleta sai para outro clube e se diz torcedor dos mulambos que iremos resolver essa questão.

O desenvolvimento da relação histórica e de pertencimento ao Clube, e principalmente à postura de respeito ao Fluminense, não vem naturalmente com um garoto que, muitas vezes já chega ao clube com seu time de futebol, mas sim através de um trabalho sério, ético, dedicado e principalmente com método.

Não é tratando esses jogadores como mercadoria desde seu início, tratando mal os seus pais e submetendo-os às sevícias comerciais de agentes que saíram do próprio Flu, que vamos criar uma identidade tricolor que representará respeito ao clube, à sua história, à sua tradição, mesmo que o garoto ainda continue com seu time de coração (que normalmente herdou dos seus pais) e que chegou ao time já tendo essa identidade.

No caso das crianças do Guerreirinhos cantando música dos mulambos, a responsabilidade principal é do clube, dos seus supervisores e dos gestores desses projetos, que não conseguem incutir uma relação à identidade com o Fluminense.

Detalhe: essa omissão e falta de compromisso com o clube não é coisa que surgiu na atual administração, que logicamente continua bastante permissiva em relação ao tema e até ampliando, mas já vem de longa data.

Ter na formação do jogador desde pequeno não só a parte técnica, mas principalmente o conhecimento da história do Fluminense e também trabalhar o desenvolvimento e o respeito e a forma inclusive como um atleta deve se comportar, mesmo que um dia venha a sair do Fluminense, faz parte da formação de um atleta.

Cancelar o contrato com o Núcleo de Guerreirinhos é ter uma visão curta dos reais responsáveis e similar ao marido traído, que vende o sofá onde sua esposa o trai.

1 Comments

  1. Querido Victer, quem eu quase sempre concordo, por saber que a vida é muito mais complexa do que supõe nossas vãs filosofias.
    Eu diria, que nesse tema, concordo e discordo ao mesmo tempo. Estamos juntos quando a responsabilizar direta e tacitamente a diretoria do Fluminense e não só essa, como seu texto já apresentou. Mas uma ação firme, de descontinuar o contrato com a unidade, é um recado, direto e reto, para que não haja dúvidas, houve negligência por parte do franqueado. Alguns valores devem ser preservados. Possivelmente em letras miúdas de contratos, que deveriam ser melhor praticados.
    Certo de que devamos ter melhores práticas na excelência que deveria nortear nosso Fluminense, mas alguns tiros e demonstrações são deveras importantes para sinalizar à sociedade que não podemos aceitar alguns desrespeitos como casos banais.

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