Ser Fluminense, tantas vezes Fluminense (por CH Barros)

Niterói, 5 de dezembro de 2010. Dia em que eu pude ver de perto, pela primeira vez, um pouco do que é ser Fluminense, ainda que tivesse apenas seis anos de idade. Foi naquele lugar, mais especificamente no apartamento de meu padrinho, com minha família, onde eu vi a tempestade caindo para lavar as almas tricolores transformando-se num mar de êxtase e felicidade, o qual serviu de banho para os tricolores, somente eles. Eu me banhei nele, sim, apesar de não entender muito de futebol, mas já compreendendo que o Fluminense havia reservado um lugar no meu coração a partir daquele dia.

As lembranças do jogo são poucas. Apenas recordo de quando o Emerson mandou a bola para dentro, fazendo todos delirarem, e depois de o título finalmente se concretizar após o apito final. Era gritaria, comemoração, e eu ali naquele meio familiar, admirando dentro de si toda aquela festa e já entendendo um pouco do que é o Fluminense. Teve a bandeira tricolor, que saiu na foto dos meus tios e de minha mãe – os três são irmãos –, com eles radiantes pelo título. Começava ali o sabor de ser tricolor, tal qual o início de um sentimento – ou melhor, o despertar dele. Anos depois, mais velho, escolhi esse clube para amar. Para vivenciá-lo, admirá-lo e contemplá-lo, independente de que hora for, para sempre.

Ser Fluminense não é uma tarefa qualquer. Para ser Fluminense, é preciso saber os valores tricolores que se fazem presentes desde sua fundação e adotá-los como um ensinamento, como algo a ser posto em prática todos os dias. Ser Fluminense é praticar a empatia, o amor, o respeito e a compreensão. Ser Fluminense é viver em poesia, é torcer para o clube que foi escolhido por tantas pessoas maravilhosas, é desafiar a matemática, o tempo, os placares absurdos, a mídia e tudo que possa vir ser contra nós.

Durante toda sua vida, o Fluminense foi contrariando os que diziam donos da razão, da matemática, da lógica e entendedores supremos do futebol. Foi cumprindo exatamente o que lhe foi destinado: incomodar àqueles que são donos da verdade, os despóticos e que se denominam “invencíveis”. E, assim, foi construindo seu charme e tornando sua essência cada vez mais íntegra, refletindo nas três cores que traduzem tradição, tão vitoriosa dentro e fora de campo.

Neste 21 de Julho, o Fluminense faz cento e dezoito anos. Em 2020, ele reafirmou seus princípios mediante à recusa à volta do futebol no meio da pandemia, quando os números de mortos por Covid-19 não paravam de crescer, incomodando, mais uma vez, os que não tem empatia e sensatez na mente e no cotidiano. Por mais que o futebol tenha voltado sem as bênçãos das Laranjeiras, o Fluminense foi campeão antes mesmo do Fla ter ganhado o terceiro Fla-Flu – com muito suor, ressalte-se – no quesito humanidade. E é isso que realmente importa, não um campeonato repleto de vexames e roubos nos últimos anos, que o fez perder sua graça e atratividade.

A grandeza tricolor vai além do gol de barriga, dos gols de Assis, Flávio, Rivellino, Fred, Ézio e tantos outros. Vai além dos títulos, das viradas heroicas, dos títulos inimagináveis, das vitórias no último minuto. Ela também manifesta-se na beleza das palavras de Nelson Rodrigues, de Cartola, de Ivan Lins, de Artur da Távola, de Mário Lago, de Bibi Ferreira, de Paulo-Roberto Andel (cronista e revisor desta casa) e de tantos outros tricolores admiráveis, sejam famosxs ou anônimxs. Ela manifesta-se, idem, quando o Flu doou um avião de caça para o Brasil na segunda guerra mundial; quando o Flu recebeu a taça olímpica, o prêmio nobel do esporte, em 1949, sendo o único time a conseguir esse feito no mundo; nas Laranjeiras, casa tricolor a qual é berço da Seleção Brasileira, que a recebeu e a acolheu em seus primeiros jogos, bem como nos primeiros títulos.

Ser Fluminense é ir além, sempre. É ser improvável. É ser poético por vestir as três cores. É confiar até o soar do último apito. É contar com o sobrenatural. É ser sobrenatural. É marcar presença na partida mesmo estando em casa, através do sentimento.

Ser Fluminense é uma dádiva. Portanto, sejamos gratos por ela.

Sejamos gratos por ter a missão de defender um time grande dentro e fora de campo, a qualquer hora, em qualquer tempo.

Parabéns, Fluminense. Obrigado por tudo. Pelo que você é e representa a essa legião apaixonada que te persegue em todos os momentos.

Encerro a crônica com uma das diversas frases belíssimas de Nelson Rodrigues: “Eu vos digo que o melhor time é o Fluminense. E podem me dizer que os fatos provam o contrário, que eu vos respondo: pior para os fatos”.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

#credibilidade

2 Comments

  1. O despertar do meu filho também foi aos 06 anos, CH Barros, na arrancada de 2009 contra o rebaixamento. Ele esperava, ansioso, pelo quadro “Fred, o agente da missão impossível”. No último episódio, “Fred, o herói da missão cumprida”, ele chorava e sorria ao mesmo tempo. Foi inesquecível!

    1. Olá, Vera, é sempre bom tê-la aqui! Obrigado pelo comentário. Que bacana, a história de seu filho é bem parecida com a minha. Não me lembro desse quadro (tinha cinco anos em 2009), mas hoje o vejo no youtube e, se eu me comovo, imagina quem pôde vivenciar tudo isso naquela época. Deveras, muito emocionante. ST!

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