Segue a vida (por Marcus Vinicius Caldeira)

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Carlos Alberto Moraes de Lima. Para o pessoal do Panorama, Seu Limão. Para os amigos de IBM, Xerox  e HP, o Lima. Para mim, simplesmente, meu pai. Ontem foi a hora do até logo a ele. Aquela hora que nenhum filho quer passar, mas que naturalmente irá passar. Meu pai nos deixou no domingo às 10:40h após o surgimento de um câncer no intestino que chegou fulminante. Ele foi guerreiro, valente, digno (não perturbou uma vez sequer médicos e enfermeiros). Lutou. Mas não deu.

Desde que começamos o Panorama em 2012, ele esteve conosco. E vestiu a camisa, como tudo que fez na vida. Não tinha uma segunda que deixasse de filmar e um dia que deixasse de fazer a divulgação. E ainda cultivou um hábito simples e bacana demais: quando entrava pela manhã para divulgar nossas publicações saia dando “Bom dia” por mensagem do Facebook para algumas pessoas. Pra mim, era todo dia. Soube que dava também para minha esposa, minha irmã, meu irmão, para Érica, Fernanda Britto e muitos outros. Esse era meu pai, generoso. Hoje, e será assim até o fim de minha vida, não terei mais seu “bom dia”. Hei de me acostumar com sua ausência.

Na vida profissional construiu uma carreira brilhante em multinacionais como EDS (HP), IBM e principalmente na Xerox, onde foi gerente de tudo na parte de informática e ficou por mais de 30 anos lá. Pegou os primórdios da computação no Brasil. Conheceu a ciência quando trabalhava fazendo a folha de ponto da ALERJ. Um dia, visitou um órgão público que fazia a folha de 3.000 pessoas em poucos dias usando o computador. Ele demorava quase um mês para fazer uma folha de 300 funcionários. Resolveu estudar aquela geringonça gigantesca que ocupava um andar inteiro, mas facilitava a vida das empresas. Fez um curso. Depois foi para a IBM. Largou a faculdade de economia na PUC para completar o curso de analista de sistemas na IBM. E não largou mais a carreira.

Era muito prático, metódico e organizado. Tinha uma letra linda que eu tentava copiar sem sucesso. E adorava hobbies. Cultivou vários. Aeromodelismo, Radioamador, pintura, turismo e fotografia.

Teve a possibilidade de dar uma vida excelente para mim e meu irmão, tanto que cheguei a estudar no Colégio São Bento. Lembro-me dele chegando do trabalho na sexta-feira, desarmando a sala e montando o autorama Aurora, importado com carros pequenos (baratinhas) que possibilitava fazer pistas gigantescas e dava sensação de velocidade. Era o máximo. E adorava viajar conosco – tanto que por anos acampávamos nos campings do Camping Club do Brasil. Fomos para a Bahia de carro. E ele viajava muito para o exterior por conta do trabalho. Numa dessas ficou mais de um ano na California e nos levou nas férias pra lá. E adorava a família da minha mãe, grande do subúrbio carioca.

Aos quarenta e seis anos, por conta de trabalho, fumo, vida sedentária e má alimentação, teve um enfarto. Sofreu intervencões, sobreviveu e mudou sua vida. Conviveu com a questão cardíaca até hoje.

Depois que ele se separou da segunda esposa, começamos a curtir a vida juntos. Íamos para o samba, pulávamos carnavais juntos, muitas histórias divertidas. Ele reclamava que eu não parava com namorada nenhuma. E tinha razão. Mas não tinha muita moral: casou-se quatro vezes, duas com a mesma esposa. Meu pai, né? Nestes últimos anos era um frequentador assíduo das rodas e shows do grupo de samba que faço parte.

No final de sua vida ainda deu-me mais uma alegria: converteu-se tricolor. Normalmente, os filhos se tornam tricolores por causa do pai. Meu pai se tornou tricolor por causa do filho e, claro, por conta da convivência diária aqui no Panorama. Passou a frequentar os jogos conosco e ia a todos sem tricolebar. Teve jogo que ele foi e eu não fui. E ele adorava.

A dor realmente é muito grande. Queria que ele visse meu filho nascer. Mas não deu. A vida é isso, chegadas e partidas, encontros e despedidas. Não tenho do que me queixar. Ele cumpriu sua missão aqui na Terra. Viveu, foi feliz, fez amigos, família, viajou, divertiu-se, amou e foi amado.

Para falar tudo que queria falar do meu pai, daria um livro. Antes de entrar na mesa de cirurgia que iria infelizmente levá-lo à morte, estava assistindo comigo no quarto ao jogo Fluminense x Paysandu. Dali nunca mais voltou.

Por fim, deixo um texto da Madre Teresa de Calcutá que ele me enviou uma vez e que nunca mais esqueci. Meu pai não era religioso, era agnóstico (não acreditava e nem duvidava). Mas esse texto não fala só de religião, mas também de vida e mostra toda a bondade do meu pai e apreço pela vida que ele tinha.

O nome do texto é “Dádiva de amor”:

“A vida é uma oportunidade, agarre-a
A vida é uma beleza, admire-a
A vida é uma ventura, saboreie-a
A vida é um sonho, faça dela uma realidade
A vida é um desafio, enfrente-a
A vida é um dever, cumpra-o
A vida é um jogo, jogue-o
A vida é preciosa, cuide bem dela
A vida é um riqueza, conserve-a
A vida é amor, goze-o
A vida é um mistério, penetre-o
A vida é promessa, cumpra-a
A vida é tristeza, supere-a
A vida é um hino, cante-o
A vida é um combate, aceite-o
A vida é uma tragédia, enfrente-a
A vida é uma aventura, ouse-a
A vida é felicidade, mereça-a
A vida é vida, defenda-a
A vida é palavra, transmita-a
A vida é silêncio, ouça-o…”

É isso.

Obrigado por tudo, meu pai.

Um dia a gente se encontra para outra folia.

Amor eterno.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @mvinicaldeira

Imagem: em

28 Comments

  1. Sentimentos, profundos, um amigo insubstituível, carinho e generoso, Muita luz .
    Nos fará muiiiita falta .

  2. E com certeza ele deixou aqui um grande exemplo, meu amigo. Meus sentimentos pela perda. Qualquer coisa, conte comigo! Abraço,

  3. Nessas horas não há muito o que se dizer! Importante é que vc viveu intensamente com seu pai! ST

  4. Tive a oportunidade e o privilégio de trabalhar com o Lima na EDS. Rimos muito e trabalhamos muito também, e ele sempre mostrando o bom humor para todas as dificuldades. Com certeza já está lá em cima fazendo a alegria dos anjos.

  5. Caldeira.
    Lamento muito pela perda do seu pai.
    Vejo que tive trajetóra semelhante, mas não tão brilhante como a do seu pai, pois também trilhei os mesmo caminhos na área de TI após fazer o mesmo curso de Análise de Sistemas pela IBM em 1979 patrocinado pela CSN (Volta Redonda).
    Sou grande admirador seu, acompanhando seus textos, não só aqui no Panorame, mas também no Twitter (inclusive os políticos, dos quais concordo plenamente…).
    Força aí junto aos colegas, esposa e filhinho que está…

    1. Que legal essa história da IBM! Muito obrigado, meu camarada.

  6. Seu pai foi um homem admirável. Com certeza deixou em você o melhor que pôde. Paulo Victor saberá valorizar o avô que não conheceu.
    Um forte abraço!

  7. Caldeira, não o conheço pessoalmente mas sou mais um tricolor de coração , fã das resenhas do panorama.
    Muito bonita a sua amizade com seu pai.
    Me solidarizo com sua perda e lhe desejo muita força e fé, seja ela qual for.
    Que seu filho seja tão seu amigo como vc foi do seu pai.
    Que um dia todos nos tricolores nos encontremos para falar do nosso Fluminense.
    Abs
    Waldo

  8. Fé e esperança neste momento. Como você falou, “chegadas e partidas”… É dura a perda, mas a chegada de seu filho será a sua fonte de energia… Forte abraço, Caldeira.

  9. Um cara tão legal com um filho chato pra cacete!

    Muita força ai.
    Grande abraço!

    Zeh

  10. Gostaria de colocar algumas palavras sobre Carlos Lima.
    Trabalhamos juntos na EDS, foi meu líder de turno por uns 2 anos, talvez. Tivemos alguns desentendimentos, no inicio, por diferença de opiniões, até nos conhecer melhor. Carlos me ajudou muito na minha trajetória, inclusive com meu Inglês, que ele dominava muito bem, como poucos. Eu achava ele muito engraçado, uma figura unica, rimos juntos varias vezes. Trocamos e-mail mês passado, quando ele me falou de sua doença. Vai deixar saudades.

  11. Meus sentimentos….Andel…que Deus e João de Deus o receba de braços abertos…ST

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