O outro gosto do guaraná (por Fagner Torres)

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Este não é um texto partidário. Para o escritor, a defesa da Liberdade deve ser inerente às cores políticas.

Voltando em ritmo tão lento quanto Fred em pré-temporada na Disney – S2 para o capitão, chego para o segundo texto neste Panorama – agora como colaborador contínuo – tocando numa de nossas feridas. O ano promete, é verdade, mas não pretendo evitar temas que, por serem espinhosos, são importantes e necessitam de reflexão.

Reconheço-me Fluminense desde 1988. Ok. Tenho fotos com nossa camisa alguns anos antes, mas, para ser justo, prefiro me apresentar tricolor a partir da primeira lembrança, neste caso, ocorrida naquele Campeonato Brasileiro – que para nós, terminou em eliminação para o Bahia, na antiga Fonte Nova.

Foi ali, no começo de nossas vacas magras, que aprendi que ser Fluminense era sinônimo de elite.

Embora contraditório – nasci em uma família proletária –, nunca encarei o termo como referência ao seleto grupo social que, apesar do pensamento decadente, mesmo hoje dita os rumos de nossa cidade/estado/país.

Em casa, ser tricolor significava elegância, influência intelectual. Fosse na política, arte ou em qualquer outra expressão cultural. “Fascina pela sua disciplina”. Gente do quilate de Artur da Távola, Chico Buarque, Cartola, Bibi Ferreira, Tom Jobim, entre outros.

Mas por que diabos isso agora, Fagner?

Todos os dias vazam notícias de negociações entre Fluminense e uma suposta patrocinadora master. Falou-se muito na Caixa Econômica – cuja transação aparentemente deu pra trás –, e mesmo que pessoalmente eu tenha restrições a investimentos estatais no futebol – sobretudo em momento de crise – seria de bom grado andar ao lado de uma empresa segura, sendo o Fluminense um clube claudicante financeiramente, ainda.

Sim. Todos queremos um Flu saudável e forte, capaz de competir em igualdade com rivais. Porém, há um detalhe pouco explorado nesta discussão, que vai além da grana, da marca estampada na camisa: uma eventual nova parceria significará, de maneira intrínseca, o fim da nossa infame relação com a empresa vendedora de mate.

Nada contra o nicho do negócio. A questão, é que bastam dez segundos de Google para conhecer quem o comanda e o que pensa a figura à qual estamos atualmente vinculados.

Neville Proa. Este é o homem que ainda despeja – com controvérsias – alguns milhões que contribuem para a manutenção de um Fluminense viável. Ontem militar, o comandante da Viton 44 é contemporâneo da época de chumbo, e, segundo ele próprio, ainda não esqueceu seus tempos de clarim e quartel. Apoia abertamente um dos períodos mais nefastos da vida nacional: vinte e um anos de uma ditadura timidamente debatida em nosso país, torturadora e assassina, e que de tão pesada, tem reflexos pairando em nossa atmosfera meio século depois.

Leia mais: Ex-militar, presidente da Viton 44 recebeu ordens para prender Dilma Rousseff

Para mim, uma descoberta difícil. Uma história que segue na contramão daquilo que revisito quando volto no tempo, em minhas lembranças iniciais do conceito de elite tricolor ensinado em família. No Fluminense que idealizo – e falo também por este espaço – não se admite truculência, soberba e rancor.

O Fluminense deve ser plural e democrático. Pioneiro como Cox e transformador feito Guinle. Elegante como Marcos Carneiro de Mendonça e polivalente como Preguinho. Nosso Fluminense é o que combateu o Nazismo em 1942.

Deve ser altruísta como Castilho, sereno como Mickey e genial como Horta e Rivellino. Pode ser rebelde e insurgente como Caju e Afonsinho, destemido como Edinho e Romerito, amoroso como Ézio e obstinado feito Conca.

Nosso escudo que sorri, nossa marca, de tantos sentimentos, não deve se indispor atrelada aos espectros atrasados da sociedade brasileira, que em nome de um anacronismo histérico, rondam o imaginário popular. Conforme sempre escreve Andel, grão-mestre deste Panorama: o Fluminense ruge! Por respeito ao diferente, pelo diálogo e pelo contraditório. Uma grandeza que se reconhece na missão de incomodar o status quo, não de com ele, compactuá-lo.

Portanto, confirmando o novo patrocínio: vade retro, Proa!

* Fagner Torres também escreve no Blog Laranjeiras, do portal ESPN FC Brasil.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @TorresFagner

Imagem: ft

PANORAMA TRICOLOR poster

5 Comments

  1. Eu não acho que dinheiro seja bom, independente da origem, temos outros critérios além da “contabilidade”, espero. Voto contra, meu time não pode receber dinheiro de quem defende ideias imundas, sou tricolor e isso deveria fazer alguma diferença. Se a maioria discordar, tenho um problema nas mãos…

  2. Excelente, grande Fagner (nome de outro TRICOLOR!)!!!!

    Ao grão-mestre Andel, os parabéns pelo grande reforço adicionado à equipe PANORAMA! Sem soberba, acho difícil encontrar tanta qualidade nos sites dos rivais como se encontra aqui no PTricolor!

    SSTT4!!!!

  3. Concordo que esse Proa é figura indigesta, mas o dinheiro dele é tão bom quanto qualquer outro, o mau uso de dinheiro, é causado pelas pessoas, não pelo dinheiro em si.
    Continuo contrário, nesse país de abismos, a verba de dinheiro público sendo distribuída em áreas que se financiam sozinhas como o futebol, quando o governo briga para não remunerar o fgts com a mesma taxa da poupança por exemplo.
    Não posso pensar diferente, pq o Flu pode ser beneficiado com esse patrocínio nefasto e desigual…

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