O enigma (por João Leonardo Medeiros)

João Leonardo

Ninguém consegue fazer o Fluminense jogar bem. Comparando o time de 2016 com o time de 2014, por exemplo, a mudança é radical: restam pouquíssimos remanescentes daquele ano apagado, vários treinadores passaram pelas Laranjeiras, mudou a preparação física, mudou o médico, a situação financeira é melhor. Mas o futebol continua o mesmo, ou ainda pior, fazendo lembrar 2013.

Não tenho dúvidas: Eduardo Baptista vai ser demitido em breve. Sua única e pequenina chance é promover uma revolução do nosso modo de jogar em pouquíssimo tempo. Considerando que, em uma de suas últimas entrevistas, Baptista criticou o imediatismo das torcidas, creio que ele mesmo saiba que sua cabeça está a prêmio. É possível até que saia antes de ser saído, exatamente como fez no Sport quando aceitou a proposta do Flu. Proposta, aliás, que premiou a incompetência, porque Baptista estava há 10 rodadas sem vencer no comando do campeão brasileiro de 1987.

Repito: já mudamos de técnico várias vezes e mudamos também o elenco. Não é possível que a permanência de três jogadores da antiquíssima, um deles goleiro, explique a duradoura má fase. Tem uma esfinge nas Laranjeiras cujo enigma ainda não conseguimos decifrar. Como consequência, estamos sendo devorados, ano após ano.

Posso fazer conjecturas. Uma delas é que o problema é do técnico mesmo. Trocamos várias vezes de treinador desde que Abel deixou as Laranjeiras no fim de 2012, mas NENHUM dos contratados até agora tem currículo vencedor com a prancheta nas mãos e o apito no pescoço. Ninguém ali ganhou títulos em sequência ou fez de um bom time um esquadrão. Um ou outro teve um brilhareco fugaz, mas nada que pesasse como brasileiros diversos, Libertadores, mundiais etc. A exceção, naturalmente, é Luxemburgo, mas parece que o fracasso lhe subiu à cabeça há tempos.

Outra conjectura: a falta de um VP de futebol e/ou de um gerente de futebol que entenda do riscado. Só tivemos improvisos no comando da área-fim do clube nas últimas temporadas: primeiro Siemsen, depois Bittencourt + Simone. Pode ser que a falta de uma pessoa do ramo no comando esteja influenciando a performance da equipe, por exemplo, por conta de uma eventual falta de dedicação aos treinamentos. Um elemento que serve de indício para reforçar essa conjectura é a inexistência de batedores de falta, condição cujo desenvolvimento exige uma dose extra de dedicação. Não acredito que um jogador que bate bem na bola como Scarpa não possa se desenvolver até virar um ótimo batedor de faltas.

Mais um palpite: o problema é de esquema. Não me refiro aqui às contratações nebulosas, pois me faltam elementos para acusar quem quer que seja de locupletar-se em negociatas para contratar ou vender jogadores. Falo do esquema tático, que obviamente não é definido pelo técnico dos profissionais. Todos os últimos n técnicos do Fluminense adotaram o mesmo esquema, com pouquíssima variação. Todos colocaram dois meias abertíssimos, um marcando a torcida do Flu, outro marcando a tribuna de honra. Todos deixaram um buraco na frente da zaga e colocaram os laterais batendo cabeça com os meias-laterais. Todos deixaram o centroavante isolado. Não pode ser escolha isso: é a tal da padronização do esquema que foi macaqueado do Barcelona.

Se a questão é o esquema, é preciso dizer ao inventor da moda no Flu: não está dando certo. O Barcelona, a propósito, ganha como ganha não porque tem um esquema padrão, ou porque foi um dia treinado pelo Guardiola, mas porque seu time está cheio de craques que nós não poderíamos contratar atualmente. Bote Messi, Neymar, Iniesta e Suárez ao mesmo tempo no Flu com qualquer esquema que a gente leva o brasileirão com 10 rodadas de antecipação, mesmo com Drubsky no banco de reservas.

Pode ser o esquema, o VP de futebol, o técnico, os jogadores ou uma combinação de tudo isso. Eu só consigo fazer conjecturas, embora seja a figura mais importante do clube, o torcedor. É preciso que alguém dentro do clube seja capaz de diagnosticar o problema e atacá-lo com seriedade. É certo que a gente não vai resolver o problema demitindo Baptista, embora possa resolver contratando um treinador vitorioso (se a primeira conjectura estiver correta). O problema, contudo, parece ser mais profundo e exige uma solução imediata. Se não tem ninguém nas Laranjeiras para decifrar o enigma, tragam um Édipo de fora. Mas resolvam logo isso.

Panorama Tricolor

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Imagem: JLM / PRA

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1 Comments

  1. Não me parece que haja um enigma. O problema se vincula à sua segunda conjectura. É só considerar a história recente para verificar que, deliberadamente, o Fluminense se tornou uma fazenda de criação de jogadores, e agora, também de engorda, com a aposta em promessas. Este é “o negócio”, o resto é só contexto.

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