Como a Globo moldou a anatomia do futebol brasileiro em dez anos (por Marcelo Savioli)

Amigos, amigas, o estudo da História mostra a importância de conhecermos o passado para compreendermos o presente e enfrentarmos os desafios do futuro.

Quando a Globo põe em prática sua estratégia de desmontar o Clube dos Treze, tinha em mãos a estratégia e a propaganda certa para moldar a anatomia do futebol brasileiro à imagem e semelhança de sua vontade.

No projeto global a Dissidência era o protagonista a ser construído, já que se encontrava falida e completamente perdida politicamente, com sequência de administrações desastrosas.

Para viabilizar seu projeto de hierarquização do futebol brasileiro, a Globo adotou um conjunto de estratégias. Em primeiro lugar, com o discurso falacioso de que tamanho de torcida representava mais audiência, acenou para a Dissidência e o Corinthians com uma participação muito superior nas receitas de transmissão em TV aberta e fechada. Criou, ainda, um obscuro modelo de participação em receitas no PPV, que serviu para sedimentar o desequilíbrio econômico a favor da Dissidência.

Para convencer os outros grandes clubes, criou uma espécie de estratificação do futebol brasileiro a partir da distribuição das cotas de TV. Para cada desvantagem sobre uns, havia uma vantagem sobre outros. Sem contar que logo de saída todos os grandes clubes obtinham um aumento substancial de receitas, superior mesmo aos 100%.

Esse modelo, que imitava o ultrapassado modelo espanhol, já superado no próprio país, mas que lograva êxito naquele momento, com Barcelona e Madrid mandando na Europa, fez com que a Dissidência, em dez anos, se aproximasse de um ganho superior a clubes como Fluminense, Atlético MG, Cruzeiro, Botafogo, Inter e Grêmio, na faixa de R$ 1 bilhão. Suficiente para pagar dívidas, se organizar e iniciar uma trajetória hegemônica.

Outra estratégia da Globo foi manter as cotas de TV para os grandes do Clube dos Treze que porventura fossem rebaixados para a Série B. Com isso, esses times disputavam a competição com um desequilíbrio econômico gigantesco. Como consequência, não houve caso de quem não retornasse à Série A no ano posterior.

Há um momento em que o plano logra êxito e a Dissidência ascende ao protagonismo desejado pela Vênus Platinada, mas isso incomoda os demais clubes. A solução encontrada foi remodelar a distribuição de receitas de televisão, repetindo a solução da Premier League, colocando na agenda a meritocracia.

O problema é que esse novo modelo em praticamente nada transformou a realidade, porque a Dissidência, já empossada economicamente no mais alto degrau do futebol brasileiro, continua se beneficiando da colossal diferença na distribuição das receitas de pay per view. São mais de R$ 120 milhões garantidos anualmente, quando quase todos os grandes clubes não chegam à faixa dos R$ 30 milhões. Sem contar que ter times competitivos leva ao maior ganho em receitas de televisão e, consequentemente, em premiações.

Em compensação, os clubes tradicionais, como Grêmio, Fluminense, Inter, Bahia, Vasco e Botafogo, tiveram queda de receitas com televisão e se equipararam a outros players, como Fortaleza, Ceará e até o novato Cuiabá. Só que essa queda se transformou em desvantagem, pois as más gestões de muitas das grandes grifes do futebol nacional levou os clubes a uma dívida desproporcional às receitas. Isso acabou dando vantagem competitiva a times que antes eram meros coadjuvantes, mas que não acumularam dívidas astronômicas.

Para aceitar adotar o modelo da Premier League, a Globo impôs a esses grandes clubes uma nova regra, que está sendo um dos principais indutores da nova ordem. Eles não mais receberiam, ao cair para a Série B, as mesmas cotas da Série A, anulando-se aquela vantagem econômica a que eu me referia. Como consequência direta, o Cruzeiro caminha, embora tenha suas próprias mazelas a agravar a crise, para o terceiro ano jogando a Série B, enquanto o Vasco corre sério risco de repetir essa trajetória.

É cedo, ainda, para decretar que essa realidade significará o fim de grandes grifes do futebol brasileiro como forças competitivas. É preciso analisar a realidade de cada um. O Atlético MG tem uma situação financeira para lá de confusa, mas obteve investimentos capazes de transformá-lo em uma das três forças do Brasil em 2021. Além disso, tem projeto.

O Palmeiras está bem estruturado e tem a Crefisa. O Fluminense tem potencial para virar o jogo, atraindo investimentos, a partir do poderio de Xerém, e remodelando sua matriz de receitas a partir do projeto de revitalização das Laranjeiras, infelizmente boicotado pela atual gestão.

Uma coisa, no entanto, Palmeiras, Atlético MG, Fortaleza, Athlético PR, Cuiabá e Bragantino nos mostram com clareza: não é possível administrar mais o futebol com antigamente. É preciso gestão profissional, investimento e capacidade para explorar suas próprias potencialidades.

Outro aspecto é a formação da Liga. É preciso que os grandes clubes percebam que não têm mais vantagem alguma sobre os demais, e que nada justifica continuarem pensando individualmente, permitindo que a Globo continue com sua política abusiva de beneficiar o clube de coração de seus proprietários.

De qualquer forma, a competição se dará no terreno da competência para buscar soluções individuais, enquanto o crescimento coletivo só será viável com a Liga, com a valorização econômica de nossas competições e retirada do monopólio e poder da Globo sobre o nosso futebol. Que não perdoará quem fica marcando passo no mesmo lugar e olhando para trás.

Saudações Tricolores!

1 Comments

  1. Savioli, não tenho como provar, inda mais morando a 500 km do Rio, mas penso que há muita negociata nessas administrações do Flu. Não dá pra entender que com toda qualidade de Xerém, nossas promessas sejam negociadas a preço tão menores que os da dissidência. E nossos recursos gastos com veteranos e jogadores de qualidade duvidosa ( Wellington por exemplo ). E o Flu virar paraíso de empresários, periga virar URAM.FUTEBOL.CLUBE. O que me leva a desconfiar que alguém está levando allgum por fora. Sendo assim, como a teta é boa, pode-se esquecer de voto online, busca de títulos e tudo o que a…

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