Goleiro, Fluminense, Marcos Felipe (por Paulo-Roberto Andel)

Ontem foi Dia do Goleiro, uma profissão barra pesada. Não pode errar, não pode vacilar, se respirar está errado. Atacantes perdem gols inacreditáveis, meias dão passes ridiculamente errados, zagueiros furam de forma absurda, mas nem sempre a crucificação virá. Experimente o goleiro errar…

Vou falar do Fluminense que eu vivi ao vivo, um terço da história do clube. Vi Félix, Roberto, Renato, Wendell, Paulo Goulart, Paulo Victor, Ricardo Lopes, Ricardo Pinto, Jefferson, Nei, Ricardo Cruz, Wellerson, Leo, Alex, Ronaldo, Fabio Noronha, Adílson, Ailton Cruz, Diogo, Gabriel, Murilo, Zetti, Kleber, Diego, Fernando Henrique, Rafael, Ricardo Berna, Diego Cavalieri, Júlio César, Muriel e, agora, Marcos Felipe, sem contar alguns que jogaram pouco mas lá estiveram, como Klever (bom goleiro), Felipe (péssimo), Hugo (que deu muito azar) e outros. Não lembro se Edson Cimento chegou a jogar. Paulo Sérgio eu só vi quando já tinha saído.

Bem antes disso, o Fluminense marcou história pelos goleiros que teve: Marcos Carneiro de Mendonça, Batatais e Castilho, o símbolo do clube. Outros, importantes, Veludo (goleiro de Copa do Mundo) e Jorge Vitório. Se esqueci alguém, me desculpem; depois retificarei.

Na lista do segundo parágrafo, há grandes e médios goleiros, vários campeões. Alguns foram mal por vários fatores, mas o principal era pensar a respeito do seguinte: reparem quantos goleiros o Fluminense teve entre fins dos anos 1960 (com Félix) até Paulo Victor (1988), e de lá para cá.

Independente da desgraça entre 1996-1999, o fato é que, salvo Fernando Henrique – este, com enorme paciência da torcida – e Cavalieri – que começou muito mal pela falta de ritmo, mas depois foi excelente -, todos os outros goleiros tiveram pouco tempo de clube, mesmo os que conquistaram títulos. Uma enorme impaciência fez com que, ao primeiro erro, o goleiro fosse passível de exorcismo e culpado por todos os erros das equipes tricolores montadas.

Caso recente: mesmo tendo Marcos Felipe, formado na base e com passagem pelas seleções, ao perder Júlio César (que preferiu sair para ser reserva no Grêmio), o Flu não botou fé e apostou em Rodolfo e Agenor, que foram mal. E aí surgiu Muriel, que teve uma carreira mediana mas que, dentro da emergência tricolor, foi bem em alguns jogos e imediatamente alçado à condição de herói da meta. O exagero cobrou a conta e Muriel foi para o banco.

Todos os goleiros falham. O ser humano falha diariamente. Quantos goleiros já desperdiçamos no Fluminense por conta do imediatismo? Quantos foram vitoriosos na base e sequer jogaram no profissional?

Marcos Felipe me agrada em alguns pontos: serenidade total, seriedade, nenhum gesto espalhafatoso. Depois de cinco anos no profissional e um empréstimo ao Macaé, ganhou a posição de titular aos 25 anos. Falhou algumas vezes, como todos os goleiros. Fez defesas ótimas também. No jogo diante do River poderia ter evitado o pênalti? Para nós, que não estávamos em campo, sim – lá é diferente. Temos o dever de reconhecer que o bravo empate diante do multi campeão argentino tem a presença de Marcos Felipe: não fosse sua defesaça no começo do segundo tempo, dificilmente o Fluminense tiraria a vantagem adversária de dois gols.

Pode ser que Marcos Felipe não seja mais um integrante da galeria dos grandes goleiros tricolores, embora suas credenciais na base o habilitem à tentativa, mas uma coisa é certa: é preciso deixá-lo jogar e mostrar seu futebol. Ter tempo.

Paulo Victor, herói de muitos tricolores no tricampeonato nos anos 1980, dono de grandes números na história do clube, foi quase escorraçado em 1981/1982 – para aplacar a ira da torcida, revezava com Paulo Goulart. O próprio Fernando Henrique, campeão carioca, brasileiro e vice-campeão da Libertadores com grandes atuações, foi barrado por deficiência técnica – note-se que, apesar dos malabarismos, era um goleiro de grande frieza e equilíbrio. Estes tiveram muito tempo. E os outros, que foram defenestrados à primeira falha? Quantas vezes a impaciência de dirigentes e torcedores abreviou carreiras promissoras no gol tricolor?

Falar depois é sempre mais fácil. Prefiro falar antes que torço muito por Marcos Felipe, porque quero ver de novo um goleiro do Fluminense brilhar no país. Se não der certo, não tenho o menor problema em admitir o erro de minha torcida, estou aqui para isso. Agora, creio que a paciência é fundamental para que ele se garanta de vez. Um jovem goleiro que passou pela Seleção em três categorias merece respeito e confiança, no mínimo.

Que seu trabalho faça o Fluminense brilhar na Libertadores e nas semifinais do Carioca 2021.

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