Gays, futebol & FlaPre$$ (por Paulo-Roberto Andel)

felipeh campos

Em 2013, era da diversidade, ainda se discute – com exageros e distorções gravíssimas, chegando a crimes – sobre a questão da opção sexual em todo o mundo. Homossexuais são perseguidos, agredidos e até estupidamente assassinados por conta de um direito natural. Desnecessário falar da questão religiosa no entorno. Naturalmente, num meio ainda machista como é o futebol, o tema é sempre controverso.

Ainda é recorrente nas arquibancadas de todo o Brasil a indicação rasteira de homoafetividade para se “ofender” um indivíduo ou mesmo uma torcida inteira (numa sociedade minimamente equilibrada do ponto de vista mental, isso não consistiria em ofensa alguma). Times como Fluminense e São Paulo têm suas torcidas regularmente tratadas como de “boiolas”, como se as passeatas que levam milhões de pessoas anualmente às ruas do Rio de Janeiro e de São Paulo só tivessem torcedores do Tricolor das Laranjeiras e/ou do gigante do Morumbi. Patético. Uma tremenda bobagem: em pleno século XXI, todas as torcidas dos grandes times do futebol brasileiro têm grupos discreta ou notoriamente homoafetivos, organizados ou não – ou mesmo as próprias torcidas organizadas -, muito numerosos e causa espécie que isso ainda possa causar motivo para discriminações ou mesmo crimes previstos em lei.

Gays nas arquibancadas? Ora, estão também nos gramados, na reportagem, nas narrações, nos estúdios e redações – todo mundo sabe. E em todas as metrópoles ou cidades do interior. E daí? Em contrapartida, jornalistas e blogueiros-humoristas esportivos costumam tratar o tema com deboche persecutório – no Rio de Janeiro, Jorge Nunes e Arthur Muhlemberg são dois exemplos claros desse tipo de comportamento. Um torcedor do Vasco da Gama e outro do Flamengo, ambos divertidos, mas que às vezes erram na mão e vão na contramão histórica de seus próprios clubes de coração: um dos maiores torcedores do Vasco, líder de uma das suas maiores torcidas organizadas, conselheiro do clube e professor de altíssimo gabarito sempre foi dignamente assumido em sua opção sexual. Do Flamengo, falamos depois. No rol de torcidas organizadas do Fluminense, um dos mais admirados e respeitados de seus presidentes é também homoafetivo. Um dos maiores símbolos de liderança por décadas das torcidas organizadas do Botafogo, já falecido, homoafetivo. Qual o problema, ora?

Um grande passo para o combate à homofobia no futebol foi dado nesta semana, por conta da iniciativa do jornalista corinthiano Felipeh Campos – popularmente conhecido por ter interpretado o cantor Pablo no programa “Qual é a Música”, no SBT -, criando a torcida organizada Gaivotas Fiéis que, sem dúvida, será uma das forças dos Corinthians nas arquibancadas – dono de uma das maiores torcidas do futebol brasileiro, profundamente identificada com as classes mais populares, a torcida do Timão chega a todos os segmentos sociais e, claro, não teria o menor sentido que a população homossexual estivesse fora do mundo corinthiano. A ousadia da gremista Coligay foi importantíssima nas arquibancadas gremistas em tempos de ditadura no Brasil. Hoje, ao se fazer pesquisa em redes sociais, a são-paulina Bambi Tricolor, a atleticana Galo Queer, a celeste Cruzeiro Maria, a alviverde Palmeiras Livre, a Timbu Livre do Náutico e tantas outras mais. Respeito às manifestações democráticas e aos direitos individuais, simples assim.

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Uma das maiores expressões gays das arquibancadas do Brasil surgiu em 1979. Também uma ação ousada no Governo Figueiredo. Entretanto, sua livre manifestação foi imediatamente cerceada pelos vizinhos de torcida e tal fato incrivelmente permanece até hoje. Ora, bolas, se o Flamengo tem “a maior torcida do mundo” (hipérbole engraçadíssima), como não contaria com milhões de torcedores homoafetivos em seus quadros, já que eles estão em todos os lugares do mesmo mundo? Bom, aí entra mais uma vez o fenômeno de subversão jornalística denominado FlaPre$$: salvo em determinadas ocasiões do morde-fronha–e-assopra, o silêncio de 34 anos reina sobre o assunto – é fato conhecido que, neste mesmo período, o rubro-negro teve ao menos dois presidentes homoafetivos. Silêncio sepulcral.

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Expressão máxima em números das torcidas do futebol brasileiro – segundo auto-declarações -, a Gávea deveria ter a missão de liderar o combate, tanto pela sua importância quanto pela atitude de vanguarda tomada naquele 1979 pelo grupo liderado por Clóvis Bornay, intitulado FlaGay. Mas não tem. Na contramão da história – e sem qualquer trocadilho – a emissora detentora dos direitos televisivos do futebol faz questão absoluta – e justa – de expressar a vida homoafetiva livre em suas principais produções, que chegam a milhões de telespectadores diariamente: as novelas. Então, qual o sentido de se enrustir o tema quando chega o horário do futebol? Cercear, acobertar por quê? Não há sentido. Ronaldo Nazário que o diga.

Estabelecida nos tempos da ditadura cívico-militar, a FlaPre$$ ainda carrega consigo as marcas e comportamentos daquele tempo. Mais uma vez na contramão – e também sem trocadilho -, uma das suas maiores expressões jornalístico-televisivas reza a cartilha do arco-íris. Que não me condenem ao Caramanchão por isso.

Nasci e fui criado em Copacabana por 25 anos. Estou acostumado ao respeito ao próximo e à pluralidade. Tenho vários amigos homoafetivos, involuntariamente namorei uma garota homoafetiva em tempos de recesso dela, admiro vários músicos, escritores, poetas, atores e artistas em geral homoafetivos. Que problema eu posso ter com isso? Nenhum. Minha condição heterossexual é tranquila e feliz; quem pode testemunhar o fato é minha namorada. Estou ao lado do grande João Saldanha em 1979.

saldanha hoje

Vamos vivenciar nossas arquibancadas com honestidade, respeito e alegria. Elas são de todos e não de feudos fascistóides. A festa no futebol não depende de opção sexual.

Chega de preconceito e hipocrisia.

Abafa, FlaGay! Abre teus paetês e liberta-te!

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagens: IG/ JB/ JS

Trilha sonora: Hino da FlaGay, 1979 (Clóvis Bornay)

4 Comments

  1. O Sr tem como postar novamente esse vídeo. Não entendo o porquê foi removido, afinal ele trata de um trabalho do carnavalesco Clovis Bornay. Tem tanta coisa que incita o ódio e a violência no youtube, principalmente por parte dos protegidos, e simplesmente ignoram.

    1. Emanuel, a justificativa do Youtube foi “incitação ao ódio”, embora não houvesse nenhuma manifestação odiosa em nada no vídeo, apenas o registro de torcedores gays do Flamengo.

  2. Boa tarde, sempre soubemos que a maioria dos gays e ladrões são torcedores do crf, por um simples motivo, são a maior torcida do Brasil. É fato e vão lá boiolas e lesbicas torcerem pelo seu time de coração, dá-lhe Fla Gay!!!

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