Diniz, ave exótica (por Paulo-Roberto Andel)

Vamos lá: você é um profissional de futebol, tem boas ideias, mas seus resultados são pífios. Fracassa em vários clubes, até que num deles finalmente você se torna campeão, ganha o respeito nacional que jamais teve, chega à seleção de seu país (mesmo ficando temporariamente) e ganha o reconhecimento de seu meio. E então, o que você começa a fazer?

Passa a debochar de pessoas, a usar um tom permanentemente bélico em todas as suas manifestações. Quem não concorda com você é imbecil, idiota, não sabe nada. Defende o futebol empírico e se irrita com quem não aplaude suas sandices. Você passa a achar que é Leonardo Da Vinci, Miles Davis, Glauber Rocha ou Jack Kerouac, mesmo que nada justifique isso. E acha bom.

Infelizmente, os dois parágrafos acima traduzem a trajetória do treinador Fernando Diniz no Fluminense.

Apesar de ser bom treinador, dos bons mesmo, ainda que muito menos do que pensa ser, o treinador está perdido num mar de estupidez, menos pelos seus resultados esportivos e mais por sua personalidade contraditória, que oferece vários momentos desagradáveis ao público.

Até dois anos atrás, Diniz estava para o futebol brasileiro como uma ave exótica, uma cacatua, um calau de malabar. Suas boas ideias não tinham resultados esportivos consistentes. Recebia da imprensa e do público o mesmo deboche que hoje desperdiça em suas coletivas. Quem lhe deu estofo e confiança foi a torcida do Fluminense, lotando o Maracanã diversas vezes em partidas que sequer eram decisivas. A seguir, as conquistas do Carioca de 2023 e da Copa Libertadores do mesmo ano (não se esqueçam dos sufocos contra Argentinos Juniors e Internacional) o levaram ao Olimpo, de forma até exagerada num mundo de muito marketing, onde a Libertadores era tudo e a vida do Fluminense entre 1902 e 2022, nada – uma estupidez, é claro.

Foi consagrado o Dinizismo, mesmo que seus defensores mais fanáticos não saibam explicar muito bem do que se trata. Ok, o torcedor tem direito a arroubos, exageros e hipérboles. Quem não tem é o profissional de futebol, especialmente nos clubes grandes, onde compensa eventuais pressões com salários multimilionários.

O fato de ser campeão carioca, da Libertadores e da Recopa (um caça-níquel que nenhum tricolor sequer comentava ano passado) não justifica, não explica e nem dá direito a Fernando Diniz para constranger, humilhar e ofender pessoas representando o Fluminense em entrevistas. Ninguém tem esse direito, nem teve, nem mesmo nomes históricos gigantescos ligados ao Fluminense como Telê Santana, Carlos Alberto Parreira, Zezé Moreira e Abel Braga, para ficar em alguns exemplos.

O fato é que em 2024 o Fluminense não está jogando nada. Não cabem desculpas nem muletas como a das férias tardias dos jogadores tricolores. Preparados para voltar ao batente na nona rodada do Carioca, acabaram retornando cinco partidas antes, surpreendendo a todos. O noticiário deu conta de que os próprios jogadores quiseram voltar antes. Que diabo de planejamento é esse? Ora, se o problema era das férias, que os titulares terminassem exclusivamente para a Recopa e o Fluminense disputasse o Estadual com o time alternativo – que por sinal foi muito bem, bem melhor do que o quadro principal.

Outra conversa para boi dormir é essa história da carochinha que fomos eliminados porque o Flamengo tem o triplo de receita. O Fluminense tem muito dinheiro, só que gasta mal com um monte de veteranos caríssimos e encosta seus jovens por motivos no mínimo inusitados. O craque das semifinais do Carioca é um garoto de 22 anos, da base do Fluminense, que nunca foi aproveitado e agora brilha no Nova Iguaçu: Yago, filho de Iranildo Xuxu.

Há também um clima de deslavada hipocrisia no ar. O mesmo treinador que diz se preocupar com os seres humanos é o mesmo que assedia e constrange jornalistas com suas respostas grosseiras. O mesmo treinador que defende o jogo bonito e técnico é o campeão de expulsões no país. Seu destempero incide diretamente no elenco: o Fluminense tem um pelotão de jogadores expulsos desde o ano passado, isso sem contar outras entrevistas atravessadas concedidas por André e Marcelo, jogadores como Felipe Melo e Ganso querendo acossar torcedores e, por fim, a figura grotesca de Eduardo Barros – o homem que quis ensinar futebol para Tostão. Todos esses fatores contribuem diretamente para a queda de rendimento do Fluminense, vista a olhos nus por quem não pretende fugir da realidade ou viver de negacionismo por paixonite.

É muito difícil alguém entender porque o Fluminense joga com dois volantes improvisados na zaga, tendo um jovem quarto zagueiro voando como Felipe Andrade. Ou que critério técnico envolve a contratação do veterano goleiro Felipe Alves, que por coincidência trabalha com Diniz em seu oitavo clube. Uau! Será que existe alguém tão ingênuo a ponto de não compreender os movimentos recentes de jogadores como Gabriel Pirani, Giovani Manson e Alexandre Jesus no Fluminense?

Temos agora o sorteio da Libertadores. Alijado do Estadual pelas decisões erradas de seu treinador, o Fluminense tem tempo de sobra para rearrumar as coisas. Não cabe mais desculpa nem conversa fiada, nem faniquito. Outra coisa: o Flu é grande demais para que qualquer funcionário seu praticamente cuspa na cara dos outros, valendo-se de eventuais títulos. Nosso clube é marcado pela grandeza humana de seus personagens históricos, e muitos campeões ganharam o desprezo eterno quando falharam eticamente.

Por fim, se Fernando Diniz se incomoda tanto com o que chama de “blogzinhos”, sendo imediatamente copiados por sua excêntrica claque, devia deixar o papel de leitor de araque de lado e realmente lê-los. Por exemplo, neste PANORAMA ele já foi muito defendido, às vezes até exageradamente. Pouco importa se há sites, blogs, YouTubers, influencers e o diabo a quatro maiores ou menores: todos têm públicos, às vezes muito maiores do que se pensa, devidamente atentos ao cotidiano do Fluminense. Nem todo mundo cai nas velhas histórias do boitatá tricolor.

O treinador tricolor é bom, é campeão, tem qualidades indiscutíveis e deve continuar à frente do time. Agora, se insistir no belicismo contra jornalistas e muitos torcedores, não poderá reclamar da réplica.

Ah, sim, o treinador tricolor é bom, é campeão e tem qualidades indiscutíveis. Porém, se acha muito maior do que realmente é.

Hora de lucidez. O Fluminense é elegância, não faniquito.

1 Comments

  1. Não há cobrança vindo de cima também. É um protecionismo a quem não rende mais nada e desprezo a quem tá pedindo passagem e ama muito a camisa. A base está sendo tratada como estorvo

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