Corações perfeitos (por Paulo-Roberto Andel)

CORAÇÕES PERFEITOS
(ou 14.000 maníacos)

(os os oito da América)

“Somos corações perfeitos/ e nenhum rancor nos tinge/ quem não soube abraçar o nosso amor/ perdeu o prumo na estrada/ enquanto navegamos outras histórias/ outras palavras/ escrevemos novos poemas e romances/ em busca de carinho e glórias/ somos corações perfeitos/ e pulsamos doces, fortes/ nosso calor permanente/ bandeiras ao vento, gritos na multidão e uma linda chuva de prata/ o sorriso de menina que arrebata/ eis a mais linda namorada/ nossos olhares tão desejosos/ buscam um interminável carisma/ uma flâmula/ uma rajada de amor no peito/ somos corações perfeitos/ e rumamos serenos/ qual é a paz que atordoa?/ será a de nossa felicidade?/ ou pequenos prazeres de hora e meia?/ somos corações perfeitos/ porque vivenciamos nossos sonhos/ eles reluzem em cores cheias/ em carne e osso/ em lágrimas e um tesão interminável/ em drama, gozo e conquista/ somos corações perfeitos/ porque sabemos viver nosso louco amor/ até mesmo quando ele nos despreza/ ou rejeita/ eis nosso retrato de marés flamejantes/ um incêndio nas veias/ uma procissão de paixão em chamas/ nossas cores no concreto são sina”.

Vencemos este jogo de ontem contra o Emelec horas antes da partida, caros amigos. Quando Abel foi mais Abel do que nunca e protegeu Michael da morte midiática, já éramos onze leões em campo. E o que dizer das nossas arquibancadas? As nossas lindas mulheres, os nossos ainda tão jovens leões das torcidas organizadas, com garra, fiéis numa linda chuva de prata. Nossos homens de meia-idade que, assim como eu, experimentaram uma noite ímpar em termos da paixão interminável que é o Fluminense.

Antes do jogo os amigos do PANORAMA bebericaram, comeram pizzas e bolinhos de bacalhau, sendo muito bem atendidos pela gerente do restaurante, capaz de nos oferecer uma caldeirada. Depois, seguimos a procissão dos maníacos até São Januário até encontrarmos velhos e queridos amigos dos tempos de faculdade. Os tricolores comandam a intelectualidade.

De tarde, alguém me disse que eu era muito distante de Nelson Rodrigues e vi todo sentido nisso, de modo que meu coração vermelho ficou mais apertado do que já é. Mas tudo passa quando você chega às catracas de São Januário:  basta ver Thaissa Armond e o mundo se ilumina – há quem queira ter o cartão preso de qualquer jeito na roleta só para fitá-la, também com todo sentido.

As arquibancadas de São Januário têm outra vida com as nossas cores estampadas vigorosamente. Some-se a isso o grito incontido dos nossos maníacos e pronto: mais uma ribalta pronta para um espetáculo de drama e calor.

Fizemos um primeiro tempo admirável. O time não sentiu as dores de domingo, não houve abatimento. Alternamos garra e talento a todo instante. Sempre prefiro falar do conjunto, mas como não falar da atuação impecável de Carlinhos? Ora deixando adversários no chão, ora voando pela esquerda e cruzando, fazendo o que dele se espera como um dos melhores laterais do país em termos técnicos. Como não falar de Fred e sua cabeçada mortal, talibânica, precisa? O talento do craque fala por si. Mesmo fora das condições ideais, foi decisivo. Os ares da Libertadores trouxeram na primeira etapa a campo o Thiago Neves de 2008. Digão, do jeito que lhe cabe, foi coração e força – também um coração perfeito. E Cavalieri é nosso homem de gelo: não se altera, vivencia o inferno de uma decisão como se estivesse sorvendo um picolé numa tarde de sábado à beira da praia. Poderiamos ter feito mais de um gol, tivemos ao menos três chances, uma pena que Nem esteja fora dos tempos ideais. Mas Libertadores é uma batalha e saímos bem. Os equatorianos abusaram das pancadas e isso também nos atrapalhou.

Nossa história não rima com obviedades, mas muitas vezes ela se repete. Apesar de nossa clara superioridade técnica, no segundo tempo caímos de rendimento e o Emelec cresceu, apesar de suas limitações evidentes – numa delas, aí sim corremos risco muito sério. Um gol sofrido poderia ser nossa morte na competição. Nosso ataque cerrou portas, os cruzamentos contra nós eram ameaçadores, mas tudo não passou de pequeno receio. Era preciso dobrar o sangue e o suor em campo; então Neves, merecidamente muito aplaudido, deu vez a Rhayner, gigante de sempre correndo um quilômetro por segundo e ocupando os espaços de norte a sul do campo. E o prêmio pela atuação de Carlinhos foi mais do que justo: ele escorou a bola da direita, fez 2 x 0 e ninguém ali teve mais dúvidas de que o Fluminense estava classificado para as quartas-de-final da América. Bruno se machucou, Diguinho ressurgiu e Jean foi para a lateral-direita, que nos fez lembrar dos 3 x 2 do tetracampeonato. O Emelec não parou de bater um só instante e, por isso, teve dois jogadores expulsos. Fred, herói cansado, deu vez a Samuel. Nas arquibancadas, a força do canto era um poema e só faltou um verso para Narizinho, mas isso há de brilhar noutras jornadas.

Ontem nos abraçamos, rimos, sofremos, choramos, gritamos a plenos pulmões, acertamos, falhamos. Fomos de uma humanidade enorme. Vivenciamos na alma o que é uma disputa decisiva na Libertadores. E vencemos. Os desacreditados de sempre estão entre os oito gigantes da América. A madrugada foi pequena. Abel venceu o jogo antes com seu gigante coração perfeito. Carlinhos foi um monstro. Fred foi algoz. O que vem à frente, não sabemos dizer ao certo, exceto que se Thaissa nos recepciona à porta, há um sinal de que o espetáculo está garantido –  e tome lindas bandeiras, gritos de amor incontidos, uma deliciosa chuva de prata. A América é uma realidade. Temos uma nova estrada? O que nosso louco amor nos reserva? Perguntas que só o tempo irá responder.

Paulo-Roberto Andel

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: Rodrigo César O Rods

15 Comments

  1. Como eu queria ter estado com vocês!!! Odeio assistir jogo pela televisão…Ainda mais pela REDE “GROBO”, minha vontade, meu desejo era estar junto de meus queridos e queridas e principalmente comemorando a vitória de nossos GUERREIROS! Mas, infelizmente, não deu…coisas da vida!!1 Outros jogos, outras oportunidades e principalmente outras vitórias e títulos virão!!! Abraços….

  2. Parabens pela linda e emocionante crônica. Meus parabens ao nosso
    time, que com um lider em campo sempre se supera, Fred, seja mto bem vindo vc éo cara! e parabens a nossa maravilhosa torcida, que espetáculo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

  3. Parabéns tricolores, em especial para você e para o Vinicius, bela vitória. Infelizmente não tive ânimo para estar com vocês ontem…. Me perdoem ….. Um abraço a cada um de voces do Panorama..

  4. Em tempos em que nos referimos aos jogadores de futebol como objetos de trocas monetárias, imagens e marcas de valor publicitário, empreendimentos de entretenimento midiático, coisificados como se fossem um mero capital ou um patrimônio que demandou certo investimento dos clubes, “peça de reposição de elenco”, em que a personalidade, história, temperamento, alma, espírito, sentimentos são apenas considerados custos marginais transações; vejo um técnico da dignidade de Abel Braga se levantar contra toda essa ordem e dizer no fluminense as coisas são diferentes: seja entendendo do drama pelo qual passou o Carlinhos e pedir apoio à torcida, seja respeitando a história de um Deco, seja fazendo o que faz pelo jovem Michael ou mesmo apelando ao Fred para permanecer em campo. É por essas coisas que o time em campo corresponde com sentimento, com paixão, com o espírito aguerrido e não como peões movimentando-se automaticamente em um tabuleiro de jogo. É esse o Fluminense que o Abel cultiva, sua estratégia é saber extrair a vitória do coração. Para o bem ou para o mal.

  5. Mostrando raça a torcida vai junto. Fomos valentes e com sangue nos olhos. Jogar bonito na libertadores não indicio de titulo.
    Vamos juntos no peito e na raça. Assim deve ser o Fluminense

  6. Lágrimas! Essa sua capacidade de emocionar com as palavras é de outro mundo, Andel!

  7. Depois da tempestade; a bonança! É muito bom ser tricolor!

  8. Puxa Paulo, lindo texto…. eu senti muito com a notícia do Michael… sou mãe e sei que esse mundão a fora tem muitos “atrativos” para os jovens. Achei GRANDIOSA as declarações do Abel e posicionamento do Clube, tudo isso engrandece o espírito TRICOLOR. Michael estava lá ontem em São Januário.
    Nosso iceberg embaixo do gol foi perfeito, Carlinhos jogou com o coração e mereceu apoio, FRED não necessita comentários. E o show da TORCIDA? As bandeiras… lindo, lindo … (só achei que no segundo tempo ficou mais quietinha – foi a impressão pela TV a 1.200km de distância).
    Resta agora abrir o cardápio e pedir um óMELEK para o almoço.
    ST!

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