A inação institucional do Fluminense (por Paulo-Roberto Andel)

O problema é antigo e de difícil solução. Por isso, irrita a tantos torcedores do clube.

Mais uma vez, o Fluminense foi garfado, jantado e deglutido com azeite por uma arbitragem. O resultado da partida contra o Resende foi adulterado pela desastrosa arbitragem. Não, não é desculpa nem chororô nem mínimo: basta rever o incrível gol anulado por impedimento inexistente, ou ainda o pênalti absurdo cometido pelo goleiro resendense.

Assim como nos últimos 30 anos, e mais especialmente nos últimos 10, esperava-se da diretoria do clube uma ação enérgica, mas não aconteceu. Dá a impressão de que as sucessivas gestões tricolores só se incomodam com seus eventuais críticos da torcida, mas não com os imensos prejuízos que o Fluminense tem nessas garfadas. Prejuízos técnicos e econômicos também.

A garfada foi no Carioca, que muita gente não gosta e quer que acabe, ok. Explica mas não justifica. Nenhum tricolor quer ver o Flu sendo surrupiado seja lá onde for. Tanto é que, mesmo com o campeonato sendo linchado à luz do dia, a grita contra a arbitragem foi grande.

É natural que todos os olhares estejam atentos para a Libertadores, mas uma observação é fundamental: ela é parte importante da nossa vida neste 2021, mas não é A nossa vida. Se tudo fica concentrado nela, num eventual insucesso colocamos tudo a perder.

Não adianta notinha de repúdio. É preciso energia. Energia.

O Fluminense deveria sair de sua inação institucional e agir em defesa de seus interesses no campeonato, pelo menos com a mesma volúpia que seus dirigentes gostam de ter contra seus opositores políticos.

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Daria uma coluna inteira para explicar os motivos, mas tentarei ser breve a respeito do que penso sobre o Campeonato Carioca e o Brasileiro, além das nossas copas continentais.

Há quem diga que o futebol evoluiu e, com isso, a globalização fez valorizar as competições internacionais a tal ponto que exige mais e mais datas. Assim sendo, campeonatos “menores” deveriam ser extintos.

Taças como a Libertadores, a Copa do Brasil e a Sul-americana já ocupam boa parte do calendário anual do futebol. Fica difícil ver onde se poderia esticá-las cada vez mais. Sobram o Brasileiro e os Estaduais.

Em 2003, sob a espada de Ricardo Teixeira, copiamos a fórmula do campeonato italiano e a adotamos para o nosso certame nacional. Poucos se deram conta de que a Itália é aproximadamente do tamanho do Rio de Janeiro, enquanto somos boa parte do continente. Com isso, jogamos muitos times para o alto. O Brasil tem um potencial esportivo muito maior do que o de 95% dos países quando o assunto é futebol: torcidas em todas as Unidades da Federação, grande apelo popular, consolidação de mercado. Aí, por um estrangeirismo oco, dinamitamos nosso próprio mercado, estrangulando a capacidade de formação de jogadores nas equipes que não estão na vitrine principal, grandes ou menores. Coincidência ou não, desde que este modelo prevaleceu, nossa formação de craques escasseou e não ganhamos mais a Copa do Mundo. Forçamos a barra para criar novas rivalidades entre os grandes clubes, mas é inútil: as principais já estão consolidadas há décadas.

Salvo exceções, o Campeonato Brasileiro é lento, modorrento, pouco atrativo e, em geral, atrai mais atenção em seu desfecho pela luta contra o rebaixamento do que pela briga pelo título. Times com campanhas medíocres, sétimo, oitavo, décimo-primeiro, se “classificam” para a Sul-americana – e cá entre nós, a queremos muito porque não a temos ainda, mas é preciso reconhecer que ela é a série B da Libertadores – e esta, cada vez mais inchada, inchada, inchada.

Então, para manter esses trambolhões, argumenta-se que os estaduais devem acabar porque são fracos, falidos etc. Desculpem-me, mas uma competição que recebe times de sexto, sétimo ou décimo-primeiro lugares pode ser atraente, rentável, mas não é forte.

Baseados em teorebas, executivos pendurados no mundo do futebol repetem a mesma ladainha do término dos estaduais. Para quê? Inchar ainda mais as competições continentais? Aumentar a aporrinhação do Brasileirão arrastado – e que, assim que acabar o contrato com a Globo, será tão deficitário quanto as competições locais? No mínimo cabe uma reflexão profunda a respeito.

O futebol brasileiro se desenvolveu e cresceu por conta das rivalidades locais. Os clássicos cariocas e paulistas, o Gre-Nal, Atlético e Cruzeiro, o Ba-Vi, o Re-Pa, a tríade pernambucana, Fortaleza contra Ceará. Na hora em que isso for destruído pela sanha corporativa do business, podem ter certeza: o futebol irá para o ralo de vez, sem volta. Eu quero ganhar a Libertadores, eu quero ganhar a Sul-americana, mas não quero abrir mão de grandes jogos contra meus rivais de mais de 100 anos. Não tenho rivalidade contra o Independiente Del Valle, o Defensor, o Colo-Colo ou o The Strongest, nem há como. Na Europa isso ainda é possível porque os países são pequenos e todos integrados por transporte de massa, é fácil se deslocar. Na América do Sul, não.

Ah, sim: durante muito tempo, décadas a fio, os times pequenos foram verdadeiros celeiros de jogadores que depois se consagraram em grandes equipes.

Ao serem asfixiados pelo futebol “moderno”, os pequenos pararam de produzir craques e hoje só lutam para não morrer. Enquanto isso, as gestões dos grandes clubes tocam o barco negociando promessas de 17 ou 18 anos para sobreviver ou algo mais. Quantas feras não vieram do Campo Grande, do São Cristóvão, Madureira, Olaria, Bonsucesso? Será possível que achem normal o que tem acontecido com o America?

Qual é a solução? Destrui-los. Que legal: no mundo moderno vamos acabar com dois mil times nossos porque temos um fascinante futebol a ser disputado contra as potências sul-americanas.

Tudo isso exigiria no mínimo muita reflexão, porque a opinião pública está é cheia de certezas ocas.

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Há quase dez anos e em quase 1.100 colunas aqui, tenho escrito que, se houver bom senso, o futebol pode ser remodelado sem precisar assassinar as equipes menores, nem os tradicionais rivais.

Não é ter “pena” de Vasco e Botafogo, nem saudosismo do velho Carioca. Ele acabou. Aquele Maracanã acabou, aquela atmosfera acabou.

Apenas penso que, diante do desastre, é preciso refletir sobre o que realmente importa para que, depois da tragédia pandêmica, o futebol do Rio e do Brasil precisa para se recuperar. E, sinceramente, acho que não é destruindo o pouco que resta que vamos construir algo bom.

Voltarei a falar disso.

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Hoje, 75 anos de um dos meus ídolos: David Gilmour. Que 100 seja pouco.

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Últimos dias da campanha de crowdfunding do meu livro sobre a Portuguesa da Ilha

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1 Comments

  1. A INDIFERENÇA ANTE A INACREDITÁVEL, SURREAL, DESCARADA, DESPUDORADA E CORROMPIDA ATUAÇÃO DOS ÁRBITROS TORNA CÚMPLICE O MÁRIO E EXPÕE SUA PERIGOSA E ACROBÁTICA PERFORMANCE NESSA CORDA BAMBA E FRÁGIL D’UMA FLU SÓCIO CUJO PASSADO CONDENÁVEL SE SUSTENTA EM UM CONSELHO, OUTROSSIM, SUSPEITO E A SER INVESTIGADO?…ESSE SILÊNCIO NÃO É DOS INOCENTES….

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