A dialética do arrastão (por Paulo-Roberto Andel)

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Curioso perceber que o início de 2017 remete ao de 2014, não propriamente pelos acontecimentos de campo na temporada anterior, ao falarmos do Fluminense. O caso é a belicosidade.

Naquele início de temporada, involuntariamente beneficiado pela Flamenguesa, o Fluminense se tornou a Geni do futebol brasileiro. Torcedores tricolores eram ameaçados e agredidos nas ruas, irresponsáveis jornalistas espumavam a baba da cólera em redações e estúdios e, se não fosse a mobilização de uma parte da torcida tricolor para evitar o caos, ele teria predominado com consequências muito danosas e até imprevisíveis. Era a dialética do arrastão: uma turma vinha no grito tentando tomar e danificar o que pudesse, com intimidação, ameaças e verborragia no volume máximo. Havia um forte estímulo para o ódio contra tudo que não agradava aos auto proclamados proprietários da verdade suprema, ansiosos por uma enxurrada que varresse o Fluminense do mapa.

Em 2017, o cenário é outro, com menor intensidade e atores infinitamente mais modestos. Sem dinheiro e com uma conta a explodir de tão inchada, o novo governo tricolor optou pelo saneamento básico, montando um time que, se parece longe dos anseios dos tricolores, também não é pior do que muitos por aí. A cólera então voltou retumbante, mas alimentada por outro processo: alguns tricolores, dentre inconformados com o resultado eleitoral de 2016 – e também os que colheram prejuízos pessoais, profissionais e financeiros desta – passando por um ou outro aspirante a subsubcelebridade das redes sociais – resolveram fazer do Fluminense a própria Geni. Se o resultado eleitoral não foi o desejado, tudo é uma merda e quem apoia o sucesso da gestão 2017-2019 ou nela votou – ou ainda quem entendeu que as outras possibilidades eleitorais do pleito não atendiam à construção de um novo Fluminense – ou também quem percebeu que atirar pedras do lado de fora era menos produtivo do que arregaçar as mangas e trabalhar dentro – não é tricolor, merece morrer, é vendido, fdp, o time já está rebaixado sem ter estreado na temporada etc. (Alguém me avise onde é o caixa, pois não somente não recebi um tostão como ainda paguei do próprio bolso, o que nem todo parlapatão de internet pode dizer).

Uma nova dialética do arrastão, intensificada em agressivos tuítes e pôstis, talvez porque um ou outro cabo eleitoral derrotado não tenha nada além disso para oferecer. Resta saber quem está lucrando com este carnaval de cólera, porque o Fluminense certamente não está. Aliás, ultimamente as palavras “lucro” e “cólera” têm sido irmãs siamesas quando se trata do nosso Tricolor, sem qualquer benefício para o clube. Alguém sabe dizer o que deu certo no Fluminense feito à base de ódio nestes quase 115 anos?

A crítica é fundamental para corrigir desvios de rota ou a eventual empáfia por conta de efêmeros sucessos. Mas a dialética do arrastão, não: ela é absolutamente inútil porque já nasce com vigorosa anemia intelectual. Eu mesmo já fui vítima dessa anemia, quando minhas críticas à gestão de Peter Siemsen eram tratadas como “mágoa” por causa de uma leviandade jurídica cometida contra mim em 2015 – e chancelada por gente que saiu das eleições 2016 pela porta dos fundos. Minha resposta veio com quatro livros sobre o Fluminense. Afinal, tenho mais o que escrever.

A democracia deveria estimular o diálogo e não o ódio, ainda mais entre tricolores. Quem ganhou a eleição não é mais tricolor do que quem a perdeu. Todos são tricolores e o direito à tribuna na internet é livre, desde que respeitadas as estradas constitucionais. Mas o tempo, mano velho, há de colocar as coisas no seu devido lugar, assim como a história saberá registrar quem lutou exclusivamente pelo Fluminense ou apenas pela própria prosperidade individual. O tempo é implacável e invencível.

Que a mais absoluta liberdade de expressão prevaleça sempre, é o que defendo, mesmo com toda essa energia negativa, depreciativa e até covarde que se vê por aí. Assim, todos saberemos exatamente quem é quem. Mas, pensando bem, todos já sabemos. O que não falta na dialética do arrastão são figurinhas carimbadas.

Terça feira tem a estreia na Primeira Liga. Que tudo dê certo. O Flu tem um time modesto, que precisará de reforços, principalmente quando o Brasileiro chegar. Mas a hora é de torcer para que as coisas deem certo. Crítica ou entusiasticamente, torcer pelo Fluminense – e não pela diretoria eleita ou derrotada – é o mínimo que se espera de um tricolor.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: rap

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1 Comments

  1. A maior virtude do grande é ser modesto. Nosso time é modesto e jovem, o caminho para ser grande esta diante dele a ser trilhado. Nossa historia esta sendo reescrita. Fico feliz de ver cronistas como voce lutando contra a mesquinharia, o sectarismo e o ódio. Torcedor de arquibancada no Brasil, no exterior ha 23 anos, vejo de longe que não somos iguais por sermos tricolores. So o tempo não resolve temos que lutar como queremos que faça nosso time. Que o Panorama lute até o fim! Abraço Tricolor.

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