1984 – XVIII (por Mauro Jácome)

1984 – Capítulo 18 - O que se falou

1984 – Capítulo 18 – O que se falou

Depois de dezessete capítulos, pretendendo trazer à tona uma bela conquista do Fluminense, pouco me resta falar ainda. Portanto, compartilho alguns bons textos que encontrei durante as pesquisas sobre o jogo final e o dia seguinte. Também, no final, faço um comparativo sobre os preços dos ingressos, atualizados, nos jogos decisivos de 1970 e 1984 com o jogo entre Fluminense e Cruzeiro, em novembro de 2012, no Engenhão, o da volta olímpica pela conquista do tetracampeonato.

FLUMINENSE É CAMPEÃO DO BRASIL

O Fluminense, “um clube tantas vezes campeão”, como diz a letra de seu hino, conquistou o título que faltava à sua coleção de muitas glórias: o de campeão brasileiro. A proeza foi obtida em um jogo muito disputado, com muitas emoções – e que acabou sem gols – diante do Vasco, que lutou até o fim pela vitória, único resultado que lhe servia.

A festa no Maracanã, que recebeu a renda recorde de Cr$ 638 milhões 160 mil, com 128 mil pagantes, começou por volta das 15 horas, quando as duas torcidas lotaram o estádio. Enquanto o Hino Nacional – que ninguém ouvia por problemas de som – era executado, as torcidas pediram em coro por “diretas já” e “um, dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil”.

A torcida do Fluminense, mais vibrante durante quase todo o tempo, só gritou o tradicional “é campeão” ao faltarem dois minutos, após dois ataques de Washington e Assis (JB, 28/05/1984).

BOLA DIVIDIDA (Sandro Moreyra)

O Fluminense é o novo campeão brasileiro e ninguém pode por em dúvida a lisura e o mérito e seu título. Ele foi conquistado por uma equipe que jogou obediente a um esquema inteligentemente planificado e que os jogadores aplicaram com absoluta correção.

Foi até simples: a mesma estratégia traçada nas semifinais contra o Coríntians funcionou nas finais contra o Vasco. Quando no jogo do Morumbi o Fluminense precisava da vitória, ganhou por 2 a 0, garantindo o direito de armar seu time para o segundo jogo de modo a não dar nenhum espaço para o adversário tentar desfazer a vantagem. O empate de 0 a 0 valeu a classificação. Contra o Vasco repetiu-se a dose. Primeiro a vitória de quinta-feira, por 1 a 0, e ontem o jogo solidário, o toque de bola consciente, a confiança e a frieza de quem tem uma boa vantagem e sabe que com ela chegará ao título.

A vitória do Fluminense, indiscutível e insofismável, é dos jogadores, do empolgado presidente Schwartz, da animada torcida tricolor, mas pertence também a Carlos Alberto Parreira. Faço o registro para aqueles que o chamam de técnico defensivo e sem imaginação. Saibam que, ao contrário, Parreira é um estudioso e um criativo. E um campeão.

Hinos nacionais em campos de futebol nunca foram aconselháveis. O que aconteceu ontem, porém, excedeu os limites. Foi um espetáculo desrespeitoso que, poderia ter sido evitado pelos dirigentes do estádio.

O erro partiu de quem mandou a banda dos Fuzileiros tocar o Hino quando só o Vasco estava em campo. Em plena execução, entrou o Fluminense e os gritos e foguetório interromperam o Hino pela metade, porque ninguém dava atenção. Pouco depois, numa hora em que o público já se mostrava impaciente com o atraso do jogo, anunciaram novamente o Hino. Então o Maracanã inteiro irrompeu no coro de Diretas Já, seguido de “um-dois-três-quatro-cinco-mil, queremos eleger o presidente do Brasil.” E de novo não se ouviu o Hino (JB, 28/05/1984).

P. Vítor garante vitória no final

A torcida do Fluminense comemorou o titulo até alta madrugada e deve isso ao goleiro Paulo Vítor, um mero espectador na partida de ontem, mas que aos 40 minutos do segundo tempo garantiu a festa: Arturzinho recebeu de Marcelo, entrou livre na área e, quando já se preparava para comemorar, se viu diante do goleiro, que defendeu com os pés.

Paulo Vítor confessou ter sido esta a defesa mais importante da sua carreira. E não era para menos já que ela garantiu a conquista da Copa Brasil. O gol faria com que o titulo só fosse decidido no meio da semana, através de um jogo extra. Por isso, sua emoção era muito grande ao fim do jogo e antes de voltar para o vestiário fez questão de guardar a bola que ficará em sua casa como troféu (JB, 28/05/1984).

A emoção de Dante

Tricolor de coração, como fez questão de se definir, o Deputado Dante de Oliveira, do PMDB, autor da emenda pelas eleições diretas-já, esteve ontem no Maracanã e foi ao vestiário cumprimentar os jogadores pela conquista da Copa Brasil.

Conversando com o técnico Parreira, Dante de Oliveira disse que estava de “alma lavada”, pois viu seu time ser campeão e as torcidas, principalmente a do Fluminense, pedirem eleições diretas quando era executado o Hino Nacional.

– A explosão da torcida revelou mais uma vez o que está no coração do povo. Vamos conquistar agora as diretas já, que será um título de todo o povo brasileiro (JB, 28/05/1984).

Ainda no Jornal do Brasil, Oldemário Touguinhó contava:

O jogo já estava nos descontos e Parreira se movimentava no banco de reservas de um lado para outro. Havia muita gente na lateral do campo atrapalhando sua visão, quando, de repente, dezenas de microfones cobriram o rosto do técnico em busca de um depoimento sobre o título. Mas ele grita que o jogo não tinha acabado ainda. Olhar fixo no gramado. Os repórteres se embaralham entre os fios e quase derrubam Parreira. Ao seu lado, Admildo Chirol o ampara e quase vai ao chão também. Mas quando Romualdo Arpi Filho apita, Parreira corre para o túnel de acesso ao vestiário. A porta está aberta, protegida por um segurança baixo, mas de peito largo, ele sai do caminho e Parreira vai direto para a rouparia. Começa a chorar, com o rosto virado para a parede. Não quer falar com ninguém. O roupeiro fica olhando a cena, emocionado. Os soluços agora aumentam de intensidade, ele se descontrai e chora alto, livre, franco, as lágrimas descendo sobre o peito. Ao longe, a festa. E o barulho dela chegando até o treinador, sozinho, ele e sua grande emoção, depois confessada como uma das maiores de sua vida. “Graças a Deus. Ganhar um campeonato brasileiro orgulha qualquer um. E eu vivi momentos terríveis nos últimos meses, tentei impor um trabalho à Seleção e não consegui. Recebi muitas críticas, fui até mesmo ameaçado. Mas não houve tempo de mostrar nada, o time se apresentava num dia e jogava no outro. Por isso, quando aceitei dirigir o Fluminense, foi pensando em fazer alguma coisa para provar até a mim mesmo, daí não ter renovado o contrato com a CBF, que exigia um trabalho de sucesso imediato e isso é quase impossível numa Seleção”. (JB, 28/05/1984).

Por fim, para mostrar uma tendência, cada vez mais aguda, do encarecimento do espetáculo chamado futebol, um comparativo nos preços dos ingressos nas conquistas de 70, 84 e 2012:

A renda em 27 de maio de 1984 foi de Cr$ 638.160.000,00. O dólar no dia do jogo estava por volta de Cr$ 1.453,00. Então, a renda, em dólares, seria US$ 439.201,65. Dividindo-se esse valor pelo público pagante de 128.781, temos um valor médio do ingresso de US$ 3,41 dólares.

O jogo entre Fluminense e Cruzeiro, em 18/11/2012, teve uma renda de R$ 862.110,00. O valor do dólar naquele dia era de R$ 2,09, portanto, a renda, em dólares, foi de US$ 412.492,82. Dividindo-se pelo público de 35.167 no Engenhão, chegamos à média de US$ 11,73 dólares o ingresso.

No primeiro título brasileiro do Fluminense, 1970, o valor médio fora de US$ 0,96 por ingresso.

No próximo e último capítulo, o destino dos campeões. Até lá.

Revisão: Rosa Jácome

Foto: Jornal do Brasil

Capítulo 17: http://www.panoramatricolor.com/1984-xvii-por-mauro-jacome/

1 Comments

  1. É Jácome, saudades do jb e de seus grandes jornalistas.
    Hoje só temos a versão on-line, pois à impressa acabou em 2010.
    ST.

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