1984 – VI (por Mauro Jácome)

1984 – Capítulo 6 – Tudo é carnaval

Clube protesta na CBF pela renda

O Fluminense protestou na CBF, ontem, denunciando a evasão de renda, contra o ABC, quarta-feira, em Natal. Estádio quase lotado, inclusive com o presidente da federação local prevendo um mínimo de Cr$ 25 milhões, foi anunciada uma arrecadação de apenas Cr$ 15 milhões. Deste jogo e do disputado contra o Confiança, em Aracaju, o clube arrecadou apenas Cr$ 13 milhões. Com o pagamento de gratificações – quase Cr$ 4 milhões – mais despesas com hotéis, pouco restou ao clube (JB, 24/02/1984).

Findada a primeira fase, o Fluminense sentiu na pele o que se previra antes do início do campeonato: fora de casa, enfrentando equipes que só fariam número, as arquibancadas receberiam bons públicos, no entanto, em casa, contra essas mesmas equipes, os estádios ficariam vazios e o prejuízo seria certo. Nos três jogos fora de casa, contra Ferroviário, ABC e Confiança, a média foi de 15.691. No Rio, em Moça Bonita e São Januário, a média dos jogos contra essas mesmas equipes foi de 2.765 pagantes. Os dois jogos entre Fluminense e Santos foram assistidos por 24.392 torcedores em São Paulo e, no Rio, por 25.903 pagantes.

Vinte e oito anos depois, no Brasileiro de 2012, o Fluminense enfrentou o mesmo problema jogando no Engenhão. Talvez, os motivos sejam diferentes, mas até hoje, os dirigentes do futebol brasileiro (clubes e CBF) ainda não implantaram uma fórmula eficiente para colocar um público satisfatório nos jogos do torneio nacional. A longevidade nos cargos é mais importante do que o cumprimento das obrigações.

Também naquela época, o perfil de notícias de alguns setores da mídia, era muito parecido com o que vemos hoje em dia. Plantar crises sempre foi uma estratégia para chamar a atenção:

Romerito pode provocar crise no Fluminense

Em que posição escalar Romerito no time do Fluminense? Se o atacante paraguaio jogar o futebol que apresentava no Olímpia, Seleção Paraguaia e, depois, Cosmos, não será uma tarefa difícil. Para o vice-presidente de futebol, Antônio Gil, a camisa do jogador será a 9, atualmente entregue a Washington, que não vem agradando. Dito isso, foi levantada a hipótese de um boicote a Romerito, já que o grupo é muito unido e poderia ficar desgostoso com a saída de um dos seus jogadores (JB, 2/3/1984).

Era Carnaval. O futebol parou. Os olhos do brasileiro viraram-se para o samba. Na capital mundial das escolas de samba, começava um novo tempo: o Sambódromo, obra de Oscar Niemeyer, era inaugurado:

Povo lota arquibancada na inauguração da Passarela

Com as arquibancadas cheias – exceto a da Praça da Apoteose – o Governador Leonel Brizola inaugurou, ontem à noite, a Passarela do Samba. Após descerrar a placa comemorativa, Brizola repetiu um tradicional gesto e beijou os estandartes de escolas de samba e blocos (JB, 3/2/1984).

E a Mangueira foi a grande vencedora daquele carnaval de estreia do Sambódromo, com o samba-enredo ‘Yes, nós temos Braguinha’: Vem…/ Ouvir de novo o meu cantar/ Vem ouvir as pastorinhas/ A luz de um pássaro cantor/ Yes nós temos Braguinha/ Bela época/ Quando o poeta floresceu/ Oh! Meu Rio/ Então cantando amanheceu/ Num fim de semana em Paquetá/ Ouvi Carinhoso amei ao luar.

A fase seguinte da Copa Brasil, também, seria dividida em grupos. O Fluminense ficaria no “I”, juntamente com Bahia, São Paulo e Goiás. Na prática, o campeonato brasileiro iria começar. A partir dali, os jogos seriam bem mais difíceis e seletivos. Só avançaria para as fases seguintes quem tivesse bala na agulha. A ordem dos jogos do Fluminense seria: Bahia (fora), Goiás (casa), São Paulo (fora), Bahia (casa), São Paulo (casa) e Goiás (fora). A torcida estava sorrindo de orelha a orelha, com a iminente chegada da bala ideal para a agulha tricolor:

Flu prepara festa para Romerito com bateria e ala da Beija-Flor

Só falta marcar o dia da estreia. Quanto ao resto, tudo está certo. Romerito tem sua chegada prevista ao Rio sexta-feira, às 20 horas, no Aeroporto Internacional, onde o Fluminense espera recepcioná-lo com uma grande festa, incluindo sua torcida e, provavelmente, parte da bateria da Beija-Flor acompanhando uma das alas da escola (JB, 7/3/1984).

Nas pesquisas que fiz, uma notícia daquela época chamou minha atenção. Transportada para os dias de hoje, sabendo da trajetória de Branco com a camisa tricolor, podemos aplaudir a visão de um dirigente:

Flamengo quer ficar com Duílio e Branco

O zagueiro-central Marinho e o lateral-esquerdo Adalberto por Duílio e Branco. Essa troca, sondada pelo Flamengo, foi recusada pelo Fluminense, segundo o representante do clube na Federação, Carlos Eugênio Lopes. O Fluminense não aceita a troca, mas não esconde seu interesse por Marinho. Conforme deixou transparecer o vice-presidente de futebol, Antônio Gil:

– Todo bom jogador nos interessa, mas sem qualquer negociação que envolva jogadores essenciais ao elenco. Branco tem apenas 20 anos e outro dia mesmo contra o Confiança, em Aracaju, salvou o Fluminense de tomar dois gols. Ele é jovem e será um craque, um craque de seleção. Portanto, inegociável (JB, 8/3/1984).

Comparando as duas épocas, 84 e hoje, fico pensando: quantos craques já se perderam por esse mundo de idas-e-vindas do futebol? O Branco tricolor, por duas vezes e em pouco tempo, esteve na encruzilhada do destino: uma desejada, mas não executada, agressão a um bandeirinha e, se verdadeira, uma sondagem rubro-negra.

Enfim, o craque paraguaio e futuro ídolo de uma geração de tricolores chegou a sua nova e, dali em diante, eterna casa:

Romerito já é ídolo da torcida

Não bastou o carnaval programado para as Laranjeiras. Ansiosa por ver de perto e tocar o novo ídolo, uma grande e barulhenta torcida do Fluminense não arredou pé do Aeroporto Internacional até às 22h30min, momento em que Romerito surgiu no saguão (JB, 10/3/1984).

O carnaval acabou, Romerito chegou, Branco ficou. O Fluminense foi a Salvador para enfrentar, na Fonte Nova, no dia 11 de março, o Bahia de Beijoca de tantas histórias, todas de confusões. Jogo do Bahia, com Beijoca em campo, era confusão na certa. Inclusive, naquele jogo contra o Fluminense, Beijoca foi expulso, após duas entradas violentas em Vica:

FICHA TÉCNICA

BAHIA 1 X 1 FLUMINENSE

Árbitro: Carlos Sérgio Rosa Martins (RS); Renda: Cr$ 47.925.800,00; Público: 33.940
Gols: Wilsinho aos 30 e Osni (pênalti) aos 33 do 1º Tempo.
Bahia: Ronaldo, Edinho, Osires, Édson Soares e Paulo César; Helinho, Ralph e Toninho Taino (Raimundinho, 14 do 2º); Osni (Sousa, 11 do 2º), Beijoca e Róbson. Técnico: Florisvaldo Barreto.
Fluminense: Paulo Victor, Getúlio, Duílio (Vica, 14 do 2º), Ricardo e Branco; Jandir, Delei e Assis; Wilsinho, Washington (Daíco, 38 do 2º) e Tato. Técnico: Carbone.
No próximo capítulo, o reencontro com Travaglini.

Até lá.

Mauro Jácome

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Revisão preliminar: Rosa Jácome

Capítulo 5: http://www.panoramatricolor.com/1984-v-por-mauro-jacome/

Demais fontes: www.futebol80.com.br

5 Comments

  1. Se não me engano, o Antônio Gil é (ou era, não sei) tio do Antônio Gonzales, vide de futebol do time que caiu para a terceira divisão.

  2. O excelente Ântonio Gil era um bem sucedido empresário espanhol e foi ótimo dirigente.

  3. Esse dirigente, antônio Gil, o qual não conhecia, foi feliz demais ao não
    aceitar a troca, envolvendo Duílio e Branco.
    Jogadores que foram importantes na conquista do bicampeonato Brasileiro!
    ST4!

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