1984 – Capítulo I (por Mauro Jácome)

 

1984 – Capítulo 1: Como se fazia campeonato

Volto ao tempo, mais uma vez, para relembrar um pouco a história do Fluminense. 1970 satisfez parte de algo que alimentava há alguns anos: contextualizar o futebol na história. Principalmente na história nacional. Sempre gostei muito de história e, parafraseando Nelson Rodrigues, sou fanático por futebol desde os 40 minutos antes do nada.

Seguindo essa linha, estendi o assunto até 1984 e, da mesma forma que na série anterior, a trajetória do bicampeonato será contada em capítulos e entremeada com assuntos políticos (vivíamos uma época de muita movimentação com a campanha das Diretas-Já), econômicos (hiperinflação), extraterritoriais (ditaduras sulamericanas), entre outros do próprio meio do futebol.

Então, vamos lá: o Campeonato Brasileiro de 1984, ou Copa Brasil, foi disputado por 41 times. Até a organização dos torneios por pontos corridos, a partir de 2003, o campeonato brasileiro passou por inúmeras fórmulas e quantidades de participantes. De 1959 a 2003, não faltou criatividade para acomodar, numa mesma tabela, até 94 times, em 1979, ou 116, na Copa João Havelange de 2000.

Para se ter uma ideia de até onde a organização do futebol brasileiro chegou, o próprio campeonato de 1984 começou com 40 times e terminou com 41 times. Sério! O Uberlândia, campeão da Taça CBF, um tipo de segunda divisão da época, entrou na terceira fase. Incrível! O campeão da Série B subiu no mesmo ano.

Não é fácil explicar, mas, vamos lá. Esse sistema de acesso no meio do campeonato começara em 1980, quando a recém-criada CBF decidira criar três divisões: Taça de Ouro, Taça de Prata e Taça de Bronze. De 80 a 83, os quatro melhores da primeira fase da Taça de Prata subiram e, no meio do caminho, juntaram-se aos remanescentes de fases anteriores da Taça de Ouro.

Os participantes de cada divisão não eram definidos pela colocação final no Brasileiro do ano anterior, mas no estadual, recém-disputado. Nesse critério, Palmeiras (1981) e Corinthians (1982) começaram na Taça de Prata e terminaram na Taça de Ouro.

Em 84, houve uma mudança: só um subiria. Diante do constrangimento que times grandes estavam passando, resolveu-se que, em 1984, duas vagas seriam reservadas para clubes consagrados que não se classificaram nos seus respectivos regionais. Portanto, Vasco (7º no carioca de 1983) e Grêmio (3º no gaúcho) fecharam a conta dos 40 times.

Além de Vasco e Grêmio, que entraram pela janela, os demais foram escolhidos da seguinte forma: os seis primeiros colocados do campeonato paulista; os cinco primeiros do carioca; o campeão e o vice de RS, MG, PR, BA, PE, CE e GO e os campeões dos outros 13 estados. Fico imaginando se, em vez do Fluminense, o campeão tivesse sido o time do Triângulo Mineiro.

Em termos de complicação, o regulamento não era diferente. O Brasileiro de 1984 teve quatro fases, com direito à repescagem. Na primeira fase, foram formados oito grupos de cinco equipes. Jogaram em turno e returno. Os três primeiros de cada grupo se classificaram diretamente para a fase seguinte. Os oito quartos colocados dos grupos foram emparelhados dois a dois e, em jogo único, mais quatro se classificaram. Os 28 foram divididos em sete grupos de quatro clubes. Então, jogaram dentro dos grupos, em turno e returno, e classificaram-se os dois primeiros de cada grupo mais o terceiro de melhor campanha. Os 15 classificados mais o Uberlândia foram divididos em quatro grupos de quatro e jogaram a terceira fase. Ao final dessa fase, os dois primeiros de cada grupo foram emparelhados e, no sistema de mata-mata, ida e volta, disputaram-se as quartas de final, semifinal e final. Ufa, ufa! Uma verdadeira Constituição. A Folha de São Paulo do dia da estreia do campeonato, 28 de janeiro, faz as seguintes criticas:

Copa Brasil: suor, amor e bagunça

 Serão 310 jogos para se chegar ao título, 27.900 minutos de bola, para nenhum torcedor botar defeito e o cartola sorrir com satisfação.

No Maracanã, com transmissão pela TV às 21h15 ou 21h30, dependendo da novela, começa hoje a 14ª Copa Brasil, inaugurando novo nome (ano passado era Taça de Ouro), mantendo 40 clubes e garantindo a tradição dos remendos de última hora que sempre beneficiam amigos da CBF, clubes que por méritos próprios estariam condenados à Taça CBF (em 83, Taça de Prata).

Dinheiro só aparece nas finais

 A Copa Brasil só dá lucro mesmo para quem ultrapassa as primeiras fases. É justo, por exemplo, que o São Paulo seja atração no Pará, mas o Tuna Luso dificilmente lotará o Morumbi? O Flamengo certamente encherá o Mané Garrincha, mas quem irá ao Maracanã ver o Brasília, clube mal classificado em todas as suas aparições no Campeonato Brasileiro?

Ao Fluminense, coube jogar no Grupo C com: Santos, ABC, Ferroviário-CE e Confiança. Espalhados por outros grupos, tínhamos alguns times de que, atualmente, mal se ouve falar: Tuna Luso, Nacional-AM, Santo André, Catuense, Operário-MS, Brasília (meu time de Pelezão – estádio que existia no DF – na adolescência), Rio Branco-ES, Operário-MT, Anapolina (fui criado assistindo jogos da Rubra com meu pai), Auto Esporte-PI e Moto Clube.

A tabela do Fluminense na primeira fase, com jogos em ida e volta, foi assim definida: 29/01 – Santos-SP – Morumbi; 01/02 – Ferroviário-CE – Castelão; 08/02 – ABC-RN – Moça Bonita; 11/02 – Confiança-SE – São Januário; 19/02 – Confiança-SE – Lourival Batista; 22/02 – ABC-RN – Castelão; 26/02 – Santos-SP – Maracanã; 29/02 – Ferroviário-CE – São Januário. Até então, a distribuição dos títulos pelos times brasileiros era a seguinte: Palmeiras e Santos com 6 cada; Flamengo e Internacional com 3 e com 1, São Paulo, Fluminense, Vasco, Bahia, Botafogo, Cruzeiro, Grêmio, Atlético-MG e Guarani. 

E assim se fazia campeonato. Para chegar aos formatos dos atuais Brasileiros, mesmo necessitando de ajustes, principalmente em relação ao calendário, muitas confusões já assistimos e muitas mesas já foram emborcadas. E só o Fluminense carrega a fama…

No próximo capítulo, a largada para o título. Até lá.

Mauro Jácome

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Revisão preliminar: Rosa Jácome

Demais fontes: RSSSF Brasil; www.flumania.com.brwww.futebol80.com.br

7 Comments

  1. Mauro,
    boa iniciativa. Sobre o assunto, recomendo o ótimo livro do Sérgio Trigo, que escrevia colunas há algum tempo mas anda sumido, sobre o tricampeonato carioca de 83 a 85 e o brasileiro de 84. O livro é rico em detalhes e traz também toda essa parte que voce abordou, de panorama político e regulamentos. Recomendo. Parabéns pelo trabalho.
    Renato Santana

    1. Obrigado. A história será contada tranquilamente e com detalhes que já sumiram da lembrança.

  2. nossa maurão, adorei, nunca tinha lido nada a respeito, mas sabia q sempre tinha sido essa bagunça danada, agora so faltam colocar o calendario de acordo com o da uefa, ai sim vai ficar bom….. e deixarmos de ser refens do cancer rede globo….

    1. Obrigado. O calendário depende, também, da revisão dos estaduais, que espremem o restante da temporada.

    2. Acredite ou não , uma das bases de mudancas do Platini ao se candidatar a presidente da FIFA será a mudanca do calendário europeu aos moldes do sulamericano…para o aproveitamento do verão europeu com jogos ao invés de jogos no inverno… 😉 Fique atentos… 😉

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