101 anos de Fla-Flu – I (por Mauro Jácome)

81 - 30062013 - 101 anos de Fla x Flu - Cap 1

Ao ser incumbido, pelo Paulo Andel, de escrever sobre os 101 anos de Fla x Flu, pensei em várias hipóteses. Dentre todas que me vieram à cabeça, achei interessante falar sobre alguns gols que foram marcantes para mim.

Como tenho 51 anos, acompanhei, somente, metade da história. Todos os gols do Fla x Flu são importantes, mas há aqueles que simbolizam alguma coisa, ficam guardados e nada é capaz de apagá-los de nossa memória. E, para mim, depois de fazer exercícios de volta ao tempo, cheguei ao número de 10 gols. Não por acaso é o da camisa de Assis, talvez, o maior responsável por aquilo que o clássico para nós representa nos últimos anos.

Para cada gol, busquei notícias da época para contextualizar o jogo e o que se falou, transcrevi narrações de rádios e, por fim, procurei depoimentos de amigos que, também, viveram aqueles momentos.

1969 – Fluminense 3 x 2 Flamengo – Flávio

“Fluminense e Flamengo fazem às 17 horas de hoje, no Maracanã, a mais importante partida disputada até agora pelo Campeonato Carioca de 1969: se o Fluminense vencer, terá assegurado o título com uma rodada de antecedência; a vitória do Flamengo deixará os dois juntos no primeiro lugar e abrirá novas esperanças ao Botafogo em relação ao tricampeonato, neste caso com a realização de um super; e o empate – o que mais se verificou até hoje em toda a história do clássico – adiará a decisão por mais uma semana e poderá resultar numa melhor de três.” (JB, 16/06/1969).

171.599 pessoas foram ao Fla x Flu. É o 6º maior público do futebol brasileiro de todos os tempos e o 3º de jogos entre clubes. Aos 34 minutos do segundo tempo, o jogo estava 2 x 2. O Flamengo jogava com um a menos. Dominguez, seu goleiro, fora expulso, por Armando Marques, quando o Fluminense marcou seu segundo gol. Cláudio Garcia, que fez uma excelente partida naquele dia, começou a jogada do gol do título. Na Rádio Globo, Waldir Amaral narrou assim:

“…vai levando Cláudio, entregou a Samarone, tabelou com Cláudio, perigo para o Flamengo, a Flávio, encheu o pé, é gol, gooooooooooooooooooooooooooooool do Fluminense. Flávio, Flávio, Flávio Peito de Aço, quando as bandeiras tricolores estão desfraldadas e a grande torcida do Fluminense sacode o Mário Filho. Flávio! Fluminense 3, Flamengo 2. Nove é a camisa dele. Indivíduo competente o Flávio. Tem peixe na rede do Flamengo. Choveu na horta do Fluminense…”.

“De uma jogada de Samarone para Cláudio e deste para Flávio, até então implacavelmente vigiado por Onça e Guilherme, surgiu o gol da vitória, aos 34 minutos. Cláudio deu de cobertura sobre Guilherme para Flávio – e o artilheiro, de meia-virada, completou com êxito.” (JB, 17/06/1969).

“Eu tinha 16 anos e estava na torcida do Fluminense, ao lado direito da Tribuna. Estava espremido, pois havia muita gente no estádio. Fui com meus avós, que adoravam futebol, ele tricolor e ela americana. Cada gol do Fluminense era uma alegria só. Mas o 3º feito pelo Flávio nos trouxe a certeza de que seríamos campeões. Vibrei muito e vi que nosso título estava conquistado” – Marcos Borges, 59 anos. Frequenta o Maracanã desde 1964.

“Morava em Anápolis. Com 7 anos, eu não tinha, ainda, muita noção de futebol. Meu pai gravou toda a transmissão de Waldir Amaral num gravador de rolo. Interessante que, na hora do jogo, estava tendo uma corrida de carro nas ruas da cidade e na gravação, ao fundo, ouvia-se o ronco dos motores. Além do barulho dos carros, às vezes, o som sumia e ficava aquele chiado tradicional de rádio AM. Lembro que ouvi esse jogo por vários anos e, sempre, voltava a fita no gol do Flávio” – Mauro Jácome.

“Todos nós, acredito, temos uma fase em que o futebol fica em um segundo plano, tantas são as mudanças na vida. Estava eu assim em 1969, prestando serviço militar e preocupado com vestibular, com mulheres, com o ingresso na fase adulta. Mesmo na condição de tricolor apaixonado desde os seis anos de idade, o Flu ocupava um plano, não digo secundário, mas não prioritário na minha vida. Afinal, desde 1964 não ganhávamos um Carioca, o campeonato mais importante do país naquela época. No dia 15 de junho de 1969, véspera de meu aniversário de 19 anos, no entanto, senti de novo a velha paixão – alguém nessa idade tem uma “velha paixão”? Estava empolgado com a contratação do centro-avante Flávio, um Fred daquela época, ao Corinthians. O ataque, com Wilton (ou Cafuringa), Samarone (ou Cláudio Garcia), Flávio e Lula era infernal. Era o primeiro ano da carreira de Telê Santana como treinador. Portanto, resolvi me dar, a mim mesmo, um presente de aniversário: assistir no Maracanã a um título do Fluminense em cima do arquirrival Flamengo. Eu tinha certeza do título. Aproveitei que não estava de plantão no quartel e juntei-me aos mais de 170 mil torcedores no estádio – sim, naquela época, públicos assim eram rotina em Fla-Flus. Juntei meus caraminguás e senti de novo a velha (?) emoção. Nem me lembro dos gols deles. Lembro-me do primeiro do Flu, de Wilton, em falha do goleiro argentino Dominguez, considerado um dos melhores do mundo. Do segundo, em que Cláudio Garcia dominou na área e fuzilou o “gringo”, como todos o chamavam. A urubulândia alegou impedimento, chorou, e o goleiro partiu como louco pra cima do juiz Armando Marques, que já se retirava, aos requebros da nádegas magras, para o meio do campo. Tanto pressionou o Dominguez que Armandinho o expulsou. Ficou fácil, e no final do jogo Flávio, o Minuano, sacramentou nossa vitória. A partir daí, ano sim, ano não, Fluzão campeão. A torcida do urubu e os jornalistas amestrados acusaram Dominguez de estar “vendido” ao Flu. A falta de elegância deles é antiga e nunca teve limites…”. – Cézar Mota – tricolor filho de pai rubro-negro. Frequenta o Maracanã desde 1958.

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1973 – Fluminense 4 x 2 Flamengo – Manfrini

“O Fluminense poderá sair esta noite do Maracanã como campeão carioca, pois basta-lhe o empate contra o Flamengo para ficar com o titulo, enquanto seu adversário precisa da vitória para adiar a decisão até domingo, quando então os dois times jogariam em igualdade de condições.” (JB, 22/08/1973).

Aos 35 minutos do segundo tempo, o jogo estava eletrizante. O Fluminense fizera 2 x 0, ainda no primeiro tempo, gols de Manfrini, aos 39, e Toninho, aos 45. Na volta do intervalo, o Flamengo foi para cima, reagiu e Dario marcou duas vezes, aos 25 e 33. Logo após o segundo gol rubro-negro, o Fluminense desempatou:

“A torcida do Flamengo ainda comemorava o gol quando o Fluminense voltou a marcar, acabando com suas esperanças. Marco Antônio desarmou Zico, escorregou mas ainda assim, fez ótimo lançamento para Lula. O ponteiro avançou, passou por Moreira e entregou a Manfrini. No meio, Fred e Chiquinho correram em cima do atacante para desarmá-lo, com ótimas possibilidades de sucesso. Entretanto, quando tudo levava a crer que isto aconteceria, apareceu Renato, que em desabalada corrida, saiu de sua área e derrubou seu companheiro Fred, deixando o gol vazio para que Manfrini apenas tocasse a bola com tranquilidade e marcasse o terceiro gol. Decorriam 35 minutos. Este gol liquidou com a reação do Flamengo.” (JB, 23/08/1973).

1973

“Vi o jogo, pela TV, ao lado de meu pai. Lembro-me pouco, mas não esqueço do que aconteceu quando do terceiro gol do Fluminense, marcado por Manfrini: meu pai teve um acesso de loucura e esmurrou por várias vezes a cadeira que estava à frente. Em cima da cadeira havia um cinzeiro, que voou e espalhou cinza e tocos de cigarro pelo chão. Nunca esquecerei o semblante alucinado de meu pai, a sujeira e o cinzeiro emborcado no chão” – Mauro Jácome.

“Não fui nesse jogo, pois foi no meio de semana, eu tinha prova no dia seguinte no São Bento e chovia muito (se bem que a chuva era o menor problema). Ganhávamos de 2×0 e o Dadá Maravilha empatou. A torcida deles veio abaixo, e Manfrini fez um gol maravilhoso, acabando com a euforia e reação deles.” – Marcos Borges, 59 anos. Frequenta o Maracanã desde 1964.

No próximo capítulo, continuaremos a reviver gols marcantes no original clássico das multidões.

Mauro Jácome

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Revisão preliminar: Rosa Jácome

4 Comments

  1. Esse clássico é muito especial. Os dois lados não querem nunca perder essa partida.
    Esses jogos que relatastes são antológicos, principalmente o de 69, pelos quase
    180.000 pagantes.
    Abraço, Mauro!
    ST.

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