Uma chinelada na Gávea via rádio (por CH Barros)

Ao analisar a frase do saudoso e eterno Nelson Rodrigues que diz: “O Fla-Flu surgiu quarenta minutos antes do nada”, podemos afirmar que, sem dúvidas, o Fla-Flu é um clássico diferenciado – queiram uns ou não – simplesmente por ter tido um dos maiores escritores de todos os tempos como seu admirador. Isto é fato.

Por ser o colunista mais novo da casa do PANORAMA Tricolor, não peguei a época em que os jogos só podiam ser ouvidos pelo rádio ou vistos pessoalmente, pois eram poucos que possuíam televisão. Meu pai, meus tios e meu avô sempre contam a emoção que era ouvir um jogo pelo rádio, ainda mais com os narradores que existiam: Jorge Curi, Doalcey Bueno de Camargo, Garotinho etc. Era emoção pura, e eu digo isto por ouvir, às vezes, as narrações deles no youtube. Esplêndidos!

Entretanto, mesmo já tendo as opções de ver os jogos pela televisão, ainda pude ter o privilégio de ouvir alguns no rádio – e ainda ouço – por não ter assinado alguns canais de tv. Hoje, irei relembrar um deles: o fantástico Fla-Flu de Cuiabá, realizado em 2018.

Este jogo, recordo-me bem, foi transmitido somente pelo Premiere para o RJ e eu estava na casa do meu avô – ele não era assinante. Logo, eu e ele fomos para o velho rádio – este, um pouco mais moderno: era o da televisão, mas a emoção era a mesma – ouvir o jogo do nosso amado Tricolor. Os nervos estavam à flor da pele, claro, afinal, era Fla-Flu: o maior de todos os clássicos.

Lembro-me de estar meio desconfiado, pois no último confronto com eles tínhamos perdido absurdamente a vaga da Copa Sul-Americana, num empate em 3 a 3 no qual prefiro nem pensar. Contudo, o velho Fluminense foi ao gramado querendo a revanche, e foi em grande estilo: um 4 a 0 emblemático e cirúrgico pela parte tricolor, que não tomou conhecimento do centenário rival que outrora remava e apenas passou a ter futebol – assim como os outros – devido a fundação do Fluminense Football Club.

Todavia, a goleada não foi o único motivo de alegria para mim naquele dia: eu estava ao lado dos meus avós, tricolores de corpo e alma, ouvindo a partida, e comemorar uma vitória tão mágica ao lado deles não teve preço. Por ser um Fla-Flu, foi mais especial ainda.

Recordo que meu avô estava tenso, faz parte: repito, era Fla-Flu. Minha avó, doce e calma como sempre, estava confiante na vitória. Eu, exigente: quando estava 2 a 0, queria que saísse logo o terceiro para matarmos o urubu de vez. O rádio me deixava nervoso – sempre deixou – por não poder ver os gols e ter que imaginar todas as jogadas feitas – esse é o deslumbre que só o rádio tem. Não queria que déssemos mole pra eles mais uma vez, até porque, não via a hora de vencê-los.

Mas, veio o bálsamo: quase no final da etapa inicial, Gilberto marcou o terceiro e tranquilizou um pouco a minha inquieta alma tricolor. Isso não quer dizer que já cantava a vitória: é uma coisa que, particularmente, detesto. Futebol é futebol; estava alegre, mas, preparado para a guerra do segundo tempo.

Começou a segunda etapa. O Fla do incansável Carpegiani fez algumas modificações para tentar mudar a esfera do jogo, mas de nada adiantou: explorando o fraco lado esquerdo rubro-negro, o grande Marcos Junior marcou o quarto tento do Flu de cabeça, sacramentando a vitória para as Laranjeiras. Eu, gritava: Golaçooo! Goleada, porra! Tem que fazer o quinto, o sexto, porra! NENSEEEEE!

Meu avô, que de calmo não tinha nada, no auge dos seus mais de oitenta anos de amor ao Fluminense, falava: calma, meu filho! O jogo recomeçou! Vem ver!

E lá fui eu, sentar ao lado dele. Ríamos à toa, estávamos felizes demais e literalmente pouco se importando com a pronta desculpa esfarrapada rubro-negra de que eles foram com a equipe mesclada. Ficamos lá, sentados e esperando se sairiam mais gols. Foi em vão: o Fluminense se acomodou e não marcou mais. Obviamente, isso não amenizou a nossa alegria; foi uma tarde de muitas emoções.

Privilegiados foram os bravos guerreiros tricolores cuiabanos que marcaram presença na Arena Pantanal e assistiram ao vivo e a cores um dos maiores triunfos tricolores contra rivais locais fora do Rio de Janeiro.

Evocar essas lembranças agora é preciso, afinal, é fundamental ocuparmos a cabeça no momento de extrema angústia em que estamos vivendo. Obrigado pela atenção, saudações tricolores e o recado de sempre: proteja-se, cuide-se; fique em casa. Vai passar.

Panorama Tricolor

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