Samba, carnaval e futebol tricolor (por Paulo Tibúrcio)

Neste sábado começa oficialmente (alguns já anteciparam a data) o Carnaval no Brasil e no Rio de Janeiro. É uma data amada por muitos e detestada por outros tantos. o Carnaval encarna o profano e, talvez por isso, cause tanta polêmica.

Vivemos hoje um tempo de jogadores comportados e religiosos. O bom-mocismo é necessário ao marketing, traz dividendos. E de quebra, mantém o bom relacionamento com Deus a cada dedo apontando para o céu nas comemorações, mostrando-se como o escolhido em detrimento de todos os demais jogadores.

Nem sempre foi assim. Vários jogadores eram figuras carimbadas no carnaval. Jogos neste período eram, na maioria das vezes, um transtorno para os times. Muitos atletas não abriam mão de participar da folia. Do carnaval de rua de Jacozinho ao desfile na Sapucaí de Júnior e Edmundo. Este último um participante assíduo mesmo quando jogava na Europa. A seleção brasileira era regida pelo pagode dos jogadores. A ginga do samba era refletida, de certa forma, na maneira de jogar da época. Futebol de dribles, do toque sutil e da jogada inesperada. “Hoje está tudo mudado. Tem muita gente no lugar errado…” E o gingado do futebol vai dando lugar aos esquemas de disciplina e força…

Na minha concepção, futebol e carnaval são indissociáveis em muitos aspectos. São festas que, apesar das inúmeras tentativas de se elitizar, têm sua verdadeira força no povão e no coletivo. Em São Paulo, a paixão pelas duas coisas faz desta união algo concreto. A torcida organizada é o amálgama que une Escola de Samba–Time de futebol. Nosso Fluzão também se faz representado. O Bloco Máquina Tricolor tem alegrado o Carnaval da simpática cidade de Nova Friburgo.

Uma representação interessante desta ligação foi o samba enredo da Beija-Flor de Nilópolis do carnaval de 1986, O Mundo É Uma Bola: “É milenar, a invenção do futebol…”.

Segue o samba enredo, interpretado por Neguinho:

https://youtu.be/J7mZtN3K4Ms

Beija-Flor é a minha escola do coração. O rigor não é o mesmo que o utilizado no futebol, onde o Fluminense é soberano. Na época, a ligação estava mais forte. Lembro-me bem do desfile deste ano. O fato do enredo ser sobre futebol tornou minha torcida mais forte. O Fluminense tinha conquistado o tricampeonato carioca e um Campeonato Brasileiro neste ínterim. A Beija-Flor era presença marcante nas comemorações. Foi um dos desfiles mais memoráveis que já passou pela Marques de Sapucaí. Por ironia do destino, a Escola não levou o título. Por uma infelicidade, ou vontade dos deuses em eternizar o momento, choveu torrencialmente durante o desfile da Beija-Flor de Nilópolis. O samba foi levado na raça, tal qual o time de futebol que, mesmo na adversidade, põe sua alma em campo. Os integrantes foram guerreiros e contagiaram as arquibancadas, mas não deu. Menos mal que ganhou a Estação Primeira de Mangueira com o genial Caymmi. Estes acontecimentos mostram outro aspecto que se fazia presente tanto no futebol quanto nas escolas de samba. O não se importar tanto com as regras, ser menos competidor e mais artista, oferecer ao público um espetáculo. “Velhos tempos que não voltam mais”.

A grande importância do futebol e do Carnaval é esta magia que permite que as pessoas comuns, principalmente aquelas alijadas das vantagens materialistas da sociedade moderna, possam, por um momento, se afastar do sofrimento e luta diária e viver um momento em que o que importa é a alegria, a irreverência e a livre manifestação. Seja com sua camisa de time ou torcida organizada, com a fantasia do bloco ou da Escola de Samba. O ser humano tem o direito de ser feliz.

Há quem ache que sejam movimentos alienantes. Discordo. São movimentos espontâneos e da espontaneidade podem surgir vozes de protesto, longe da manipulação e interesses escusos de algumas lideranças. De todo o meu tempo frequentando arquibancadas e folias, não vejo mais alienação ali do que em algumas reuniões religiosas ou passeatas cujos heróis são torturadores ou oriundos de castas de privilegiados e estimuladas por uma mídia duvidosa.

O “pane e circo” romano também era local de demonstrar revolta e insatisfação.

O futebol resiste, embora se diminua cada vez mais o espaço de várzea. O Carnaval segue na luta. Os blocos estão na rua. Tem muita gente querendo acabar com estes movimentos, em prol de uma elitização, que representa, no final das contas, o privilégio para poucos. Deixem o povo se divertir!

É como diz o Chico…

Apesar de gostar de Carnaval, pretendo passar um feriado mais light, entre seriados e músicas. Talvez uma passadinha em um bloco ou outro. Quarta feira de Cinzas tem Fluminense e Salgueiro, que não é a simpática Escola de Samba Tijucana. Que o Fluminense acerte o conjunto e a harmonia. O enredo é vencer ou vencer.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @paulotiburciojr

#JuntosPeloFlu

Imagem: bit