Pokémon tricolor + Bafão na oposição (por Alva Benigno)

pokemon tricolor

PARTE TRÊS

19:45

Eu deveria estar namorando nesta noite de sexta-feira, mas a vida não é doce e meu amor tem outra… Bom, não é hora disso, mas eu sonhava com um telefonema ou mesmo um Whats.

Toca, toca, toca, sonho por um segundo e STTEEEF: a bichona máxima.

“Alvitaaaaaaaaa, amigaaaaaa! Tou BEGEEEEEEEE!”

Deixei meus desejos de lado e passei a ouvir.

Chiquinho Zanzibar total e absolutamente horrorizado com uma notícia de agora há pouco. Algo que podia abalar seu prestígio, seus negócios sujos e sua cadeira cativa no conselhão da amizade. Tudo por conta de um antigo acontecimento mal resolvido do passado.

“AIMEODEUXXXX”.

Charles De Lausanne era um sujeito bem apessoado. Ainda mais jovem, gostava de se gabar das relações pessoais que obtivera nos circuitos nacionais e estrangeiros. Um liberal em todos os sentidos, bem nascido e formado, delicado e discreto, poliglota e danadinho. Velho conhecido da Pecadópolis das Laranjeiras, chamada sauna do clube. Ele e Chiquinho eram tão colados que alguns pensavam ser irmãos, ou um jovem tio com seu sobrinho, ou ainda um jovem padrinho com seu afilhado. Frequentaram noites disco na Papagaio da Lagoa e até dividiram um mamão no Corujinha da Siqueira Campos com Domingos Ferreira, artéria aorta de Copacabana, velho downtown de gente que se entende:

“Garçooommm, pica pra dois por favor.”

“ESSA MONA SAFADA AINDA TEM AS INICIAIS CDeL! CONSELHO DELIBERATIVOOOO, MEODEUXXX!”

É, CDeL voltara da Europa recentemente, onde estudou por anos. Acostumado a salões vienenses, tchecos e até romenos, ficava encantado com os tradicionais banhos turcos. Também um adepto de robes e echarpes, nos lugares mais quentes não dispensava um leque francês. Obcecado por óperas, encantado com as gravações de Freddie Mercury com Montserrat Caballé, apaixonado por Jimmy Somerville desde os tempos de Bronski Beat, ensandecido com a literatura de Truman Capote, e mais recentemente com taquicardia ao ver Adele em cena. É claro que você, caro leitor, cara leitora, prezado ser, não tem mais dúvidas de que o novo personagem desta trama é um veadão intercontinental, sem preconceitos, claro.

“Ele me escreveu há dias, e disse que está de volta porque o Rio passou a ser a capital gay friendly do mundo. E ainda disse na minha cara que quer meu apoio, porque estará no cenário da política do clube e acredita que pode dar muito de si ao clube. Essa mona quer tomar minha sauna, meus levadinhos e ainda trazer essa oposição safada para dentro do meu poleiro.”

Engraçado ver que Chiquinho Zanzibar estava preocupado mas, ao mesmo tempo, dava ao seu tom de voz amargurado algo de saudade e retomada. Talvez fosse a linda amizade do passado. O fato é que estava inquieto. O Flu daria conta de dois líderes entendidos, um na situação e outro na oposição? Ou fariam uma grande composição? Ou um troca-troca sem a Máquina em campo?

A notícia o abalara a ponto de até se esquecer de seu mais novo alvo de cobiça: o escritor Lucio Bairral. Com ele, trocara safanões virtuais mas estava louco para lhe fazer um convite no reservado. Desprezado por Lucio – que é heterossexual convicto e considera o panfleteiro tricolor uma bosta humana -, caiu em pequena depressão que passou a se tornar pânico com a chegada de Lord Charles De Lausanne. Ou seria lady? Viva a liberdade. Viva alguma liberdade.

O Macunaíma gay tricolor ainda me contou que ficou apavorado com a concorrência da bicha nova, mas que isso poderia trazer frutos de alguma forma. Duas tias pensam melhor do que uma. CDeL poderia ser um parceiro constante, deixe que aceitasse ser o número dois da sauna. Dividir plateia é babado forte.

20:39

“Posso te ligar mais tarde?”

“Claro, mas você não prefere deixar para amanhã? Não quer encontrar seu velho amigão?”

“Isso é praga do filhão, botar uma biba da oposição atrás de mim. Eu vou desfazer esse ebó na encruzilhada. Juro. Filhão ciumento do caralho duro e cu piscando, só pensa em si e nos seus benefícios. É um Pokémon tricolor filha duma puta, com aquele rabicó mais investigado do que a Lava Jato. Deixa ele que vou meter uma rasteira na hora certa em que eu estiver fazendo.”

“A gente fala amanhã, amigo”.

“Tá bom, amiga, obrigado por me ouvir, tá? Eu volto. Beijérrimo.”

20:53

“Alô?”

“Boa noite, Alva, tudo bem?”

“Tudo, mas quem está falando?”

“Bom, você não me conhece, mas talvez já tenha ouvido falar de mim. Aprecio o teu jornalismo de vanguarda.”

“Quem está falando, por favor?”

“Meu nome é Pedro, mas pode me chamar de Peter.”

“Pedro de onde, por favor?”

“Eu estou te ligando por intermédio do Mário, certo?”

“Que Mário?”

“Ahhhhhhhhh! E aquele Pokémon filho duma puta, hein?”

(INTERVALO)

PARTE DOIS

Maldito telefone tocando outra vez, enquanto me viro como posso e atendo na cama.

“AIMEODEUX”

“Que houve a essa hora, Francesco?”

“RECEBI UM BILHETE ASSUSTADOR, ALVA! ME MANDARAM 24 VEZES SEGUIDAS POR VÁRIAS PESSOAS. É DA SEITA DOS ALIZAPIKACHU!”

chiquinho zanzibar bilhete japonês

Claro que era impossível ler, e daí vinha o temor do nosso escroque oficial. E de onde teria partido aquele recado Chinatown do inferno ou qualquer coisa parecida?

“Aconteceu que eu tive uma linda amizade com um rapaz da patota do Fluminense. Era meu amigo fiel e verdadeiro, pau para toda obra. Eu o conheci antes do meu casamento com Esmeralda. Durante muitos anos ele foi um tricolor apaixonado e abnegado, até que conseguiu seus objetivos dentro do clube. Tivemos que nos afastar porque ele se tornou cada vez mais detestado e agressivo, longe do menino doce e delicado dos tempos românticos da Sempre Flu. Estamos do mesmo lado, mas não próximos. Outro dia, ele me mandou uma mensagem direta no Twitter pedindo que eu atacasse bofes tricolores, que eu também detesto, mas adogo, você entende. Como me recusei a fazê-lo naquela hora, ele me bloqueou e passou a mandar imagens com textos em linguagem oriental, mas essa agora é tricolor. Eu não sei dizer se foi só por isso ou porque quando conversamos a dois, ele ficou com ciúmes de alguém que eu tivesse comentado”.

A seguir, o escroque mor paga de analista, acreditem:

“Tivemos uma linda amizade, mas ele parece estar até doente. Antes, nós tomávamos chopes no Amarelinho da Cinelândia e depois íamos ao Orly fazer traquinagem, ele adorava. Ou então pegávamos o carro e passávamos na (Augusto) Severo para curtir a Enfermeira, sempre a postos na calçada, também pau pra toda obra, pé direito 25. Depois que veio esse negócio de Fluminense, ele só fala disso o tempo todo. Se bobear, não transa, não engana a esposa, não toma banho, não faz nada. Meu querido Pokémon está fora de órbita, fez um monte de inimigos à toa. Tudo bem, eu concordo com ele que tem que acabar com torcida organizada, preto e pobre no estádio: quer ser Fluminense, seja decente. Tem que fazer limpeza étnica mesmo porque eu quero meu time sendo a elite que sempre foi. Agora, ficar nesse poc poc o dia todo parece coisa de bicha louca, louca de problema, que tem que ir pro Pinel. Era tão parceiro o meu querido Pokémon, tão fiel, tão doce, e agora fica aí pagando de agressivo, que bobagem: eu mesmo tirei ele pra não apanhar dum entendido na Alaska quando ele era pintinho novo, as barbies queriam arrasar ele, pra que isso?”

“Eu acho que ele ficou irritado porque temos os mesmos adversários no clube mas, bom, você sabe, temos as mesmas admirações e talvez ele esteja com ciúmes de mim.”

“ORA, SE SÃO SÓ CIÚMES, PORQUE VOCÊ ACHA QUE ESSA PORCARIA É UM BILHETE ASSUSTADOR? VOCÊ TEM ALGUM MOTIVO PARA TEMAR ALGUMA COISA, ALÉM DAS SUAS BARBARIDADES RACISTAS E FASCISTAS? TODO MUNDO SABE QUE O AGNALDO TIMÓTEO É GAY, ASSIM COMO VOCÊ TAMBÉM É.”

“Nããããããããããão, nãooooooooooooooo, está completamente equibocada Alvinha. Eu tenho esposa e filhos, sou um conselheiro respeitável, eu não exponho minhas relações, são privadas e respeitosas! Nem assumido nem desassumido, eu sou apenas Francesco de Zanzibar & Zanzibar, mas pode me chamar de Chiquinho que te quero mucho!”

luciana gimenez 1

claudia cruz 1

Pedi ao gajo que relaxasse, devia ser só uma dessas babaquices de garotos das redes sociais, sem muito o que fazer de útil. Dei tchau e voltei a deitar.

Maldito telefone tocando 2:

“AMIGA, me mandaram um link no Whatsapp, dizendo que era do grupo “Fundadores do Fluminense. O que será que quer dizer disso? Pode ser vírus?

“Chiquinho, não seja idiota. Só se foi psicografado pelo Chico Xavier. Todos os fundadores do Fluminense morreram há décadas. Faça-me o favor. Ninguém pode ser estúpido a ponto de achar que 1902 é agora…”

“É sério, você abre pra mim antes?”

“Ok, manda”.

Nada além de um link para o YouTube. E cliquei nele. Não era nada de mais, mas imaginei que tivessem mandado errado. Afinal, embora um tanto imaturos e até ridículos pelo que ouço e leio, o lance deles não é infantil, mas adulto. 

Avisei ao Chico que, na verdade, o que a turminha do Whatsapp queria compartilhar com ele era outra coisa. Quando ia entrar em detalhes, Zanzi me interrompeu subitamente.

“Alvita, te ligo depois. É que o FILHÃO está me chamando no Twitter… é a campanha…EU PRECISO DO MEU POKÉMOOOOONNNNNN, ELE MANDA NO CLUB.”

“Vá, borboleta. Mande um beijo para as mariposas.”

Daqui a pouco a bicha volta.

david hodo verde

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Imagem: beni

alva japonês tricolor