Pedro, macaco e Senna (por Ernesto Xavier)

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Pedro silêncio

Maria solta um último grito, de parcas forças. Maria silêncio. Maria na cama.

Pedro grita.

Quem grita anuncia vida. Silêncio é coisa de quem parte.

Dão de comer a Pedro. Ele mama. Não sabe por que mama. Quer viver. Espanta a morte com o grito. Vive porque tem medo.

Todo ele cresce. Tudo nele parece maior a cada dia. Cresce de teimoso.

Pedro é bom de bola. Pedro é bom de escola. Pedro é bom.

Pedro cheio de sonhos. Mesmo que a Pedro não tenha sido ensinado sonhar. Sonha, Pedro. Sabe que é difícil realizar. Quebra o muro, Pedro. É preciso atravessar.

Dribla a bola. Dribla a vida. Pedro é bom de bola. Pedro não está na escola. Foge pra não te pegar. Dribla o tempo. Só não dribla a história. Pedro é bom?

“Bandido bom, é bandido morto”. Pedro, preto, bandido? Morre, Pedro.

Vive, Pedro.

Quero viver. Vivo pra seguir sonhando. Sonho mais que vivo. Nado na escuridão. Alcanço a borda pra não afogar.

Vive, Pedro.

Deixem-me viver!

O homem de farda não gosta de Pedro. Não gosta de preto. Pedro, preto, pobre, bandido?

Pedro não sabe viver. Só aprendeu a sonhar.

Deixa de sonho, Pedro. Isso vai te matar.

A bola que rola Pedro sabe driblar. Olha o homem de farda, Pedro. Ele vai te matar.

Pedro é preto. É pobre.

Bandido?

Corre, Pedro. Corre que o mundo vem aí e passa por cima. Dribla a vida pra sobreviver. Dobra a esquina, na contra mão.

Corre e pá.

Peito quente. Sangue escorrendo.

Pedro silêncio. Pedro no chão.

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Muitos Macacos, poucos galhos

Não, eu não sou macaco. Quando disseram que minha irmã era macaca, eu arrebentei a cara da pessoa. Faria de novo. Comparar o negro com algo que se assemelha ao ser humano, não sendo, bestializando-o, é remeter aos tempos em que éramos comercializados em praça pública. Vejo os olhares e atitudes racistas todos os dias. Só quem passa o mesmo, sabe. Somos todos humanos, isso sim.

Por muitos anos ainda seremos vistos como macacos, pois somos ensinados que neste país vivemos uma democracia racial. Não é o que vejo nas universidades, cargos públicos, em bons cargos nas empresas, nas novelas, nos shoppings… Vejo negros nas filas do SUS, do Bolsa Família, nas páginas policiais, nos índices de miséria, dormindo nas ruas.

Portanto “macaco” é a pu…

E não me venham com matérias no jornal pra demonizar os racistas, quando os maiores incentivadores da depreciação da imagem do negro são os próprios meios de comunicação de massa. Mea culpa, por favor.

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Senna eterno

Eu era uma criança fanática por esportes. Ficava acordado de madrugada para ver a final do Mundial de Clubes, que era sempre no Japão. Via todas as lutas do Mike Tyson. Aos 8 anos chorei com o fim das Olimpíadas de Barcelona. Sabia a escalação de várias seleções na Copa de 94. Era doido pelo Chicago Bulls do Michael Jordan, o Barcelona de Romário, a seleção de ouro do vôlei de 92, o Flu de Super Ézio. Mas nada se comparava aos domingos em que assistia às corridas de Fórmula 1. Eu admirava mais o Senna do que o próprio esporte. Ele era meu ídolo maior. Disputava minha paixão com o Fluminense. Eu e muitos milhões choramos naquela manhã de 1 de maio. Ali partia meu maior ídolo. Lembro da redação que escrevi na semana anterior a sua morte, em que eu acreditava que ele ainda seria campeão naquele ano. Lembro também do dia em que eu e meu pai fugimos de uma reunião de pais do colégio para assistirmos à corrida.

Senna nunca nos decepcionava. Mesmo quando não vencia, sua entrega e talento faziam cada brasileiro acreditar que éramos um povo vencedor, que tudo poderia dar certo.

Se continuasse a correr, hoje teria mais títulos do que Schumacher, teria todos os recordes da categoria. Ele parou no auge. Ainda tinha muito a mostrar.

Já parei para pensar e não encontrei na memória alguém que hoje causasse tamanha comoção caso morresse. Não existe e possivelmente não existirá. Ele era o homem certo, na hora certa. Precisávamos dele. Sim, ele existiu.

Sinto pena dos que hoje idolatram Messi, Neymar, Cristiano Ronaldo… Por mais que estes atletas tenham talento, não passam nem perto da inteligência, carisma e atitude que o Senna possuía.

Faz 20 anos de sua morte e o mundo ainda fala dele como se estivesse vivo. E está.
A cada manhã de domingo ainda ligo a tv na esperança de que ele esteja guiando um carro… Emociono-me sempre.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @nestoxavier

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