Os risos, as cores e os riscos da juventude (por Eric Costa)

Transcendentais, eternos e etéreos nos diriam o quanto a vitória tricolor de último sábado estava escrita. As unhas roídas, a cerveja tomada a mais, a inquietude nas pernas foram jeitos que o duro concreto da vida terrena encontrou para demonstrar e brincar com nossa limitação de compreensão.
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Mas estava lá. Solidificado, firme e construído o triunfo de uma equipe perfeitamente assimétrica e redondamente imperfeita. À exclusão de tábuas rasas e proporções áureas, os onze, vinte e três, trinta ou trinta mil em campo só palparam a materialidade de uma vitória em suspenso na escadaria de nuvens até o Maracanã por um motivo: tornaram o desejo de vencer em sua Terra do Nunca.
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Sem carregar consigo a pequenez física Peter Pan, dele herdamos o ar sonhador. O ar pueril e infantil na melhor acepção do termo: de pureza, de transparência, de horizontes amplos e de fidelidade aos seus sentimentos.
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Naquele sábado, a criança ferida que cada um de nós carrega no peito foi acarinhada. O garoto do asfalto que perdeu os pais cedo, a menina cuja comunidade é marcada pela violência e repressão, o adolescente sonhador, a 3 mil km de distância, que se surpreende com o mundo estranho de capitais que não respiram futebol: todos estes encontraram afago nas três cores e no único escudo que sorri, sejam eles hoje adultos de trinta, quarenta ou idosos de setenta anos.
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E juntos se libertaram. Puderam ser quem queriam ser por uma noite, um final de semana e por até quando a memória lhes permitir. Choraram, gritaram, vociferaram as vísceras. Foram também a vidraça de muitos. Afinal de contas, no adorável mundo fake em que só vale o recorte programado e não o mosaico, ser a criança ferida que o coração de cada um abriga incomoda.
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Ser fiel a si incomoda.
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Ser Fluminense incomoda.
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Ano passado, quando o genial Paulo Gustavo nos deixou, uma de suas últimas palavras foi sobre o riso como ato de resistência. Sob a nuvem cinzenta de um país que parece retroceder, rir visceralmente tornou-se isto. Um ato menos espontâneo, e mais necessário do que nunca em sua existência para continuar resistindo. Em uma maré na qual muitos REMAM, a nós convém a suavidade de estar na terra firme de nossa Terra do Nunca verde, branco e grená.
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Torcer pelo Fluminense é um ato de resistência.

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Ser adulto não é fácil. Ter o parque de diversões lúcido, limpo, límbico e aceso na mente de cada um de nós é o único caminho fácil de só termos máscaras em nossos narizes e bocas, mas não nos nossos olhos.

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“Gente demais, com tempo demais, falando demais: vamos atrás de um pouco de paz”

Saudações tricolores!