O Fla-Flu pelas tabelas (por Daniele Brandão)

Vazio transitório

Nos arredores não acontecia nada. O ambiente estava morto, um marasmo anormal naquele domingo. Mas o apito se fez ouvir – o início do jogo. Érico se assustou, pois nunca escutara com tanta clareza aquele som estridente. Sentado próximo à entrada, sendo encarado por PMs, ele nem se mexeu. “Eles acham que eu vou entrar na marra”, pensou.

Dentro do estádio o vazio também tomava conta. Portões fechados, a marca da decepção de quem estava sentado nos bancos de reservas e dos que foram cobrir um clássico sem torcida.

Sem festa…

Em vez de um mar de gente, o deserto da arquibancada desocupada. Os gritos dos treinadores ecoavam de um jeito estranho, tanto quanto o impacto seco dos chutes captado pelos microfones. Os jogadores quase se arrastavam sobre o gramado e nem mesmo o juiz, por instantes livre da hostilidade, estava contente.

Nas cabines das emissoras de rádio os locutores tentavam emprestar um pouco de brilho àquela partida, sem resultados. Suas vozes se perdiam na mesma proporção das chances de gol. Era impossível para os cinegrafistas não focar o desânimo que se materializava ali, e a televisão o derramava diante dos olhos de quem a assistia.

Então, um barulho disperso vindo das ruas chamou a atenção de quem estava dentro e deixou apreensivo o torcedor solitário lá fora. Surgiram, ao mesmo tempo e em peso, a torcida tricolor e a do adversário.

Policiais correram, preparando-se para empregar suas armas com força total sob o temor de um embate violento. Mas, ao invés de brigar, cada parte assumiu um lado e a rua virou uma verdadeira geral. As torcidas pareciam competir entre si – o ritmo dos tambores, o balanço das bandeiras, algumas pessoas até se atreveram a dançar. Érico acompanhava a tudo, tão incrédulo quanto os repórteres que correram até os portões.

No campo, o efeito foi transformador. A bola criou vida, os times disposição e as transmissões diversão, outra vez. A música de fora ocupava todos os espaços.

Mas a festa não foi imune ao tempo, e ele voou interrompendo aquele momento sublime. Apontando para o centro, o árbitro soprou com toda a força, sinal duplo soando mais alto que o canto.

Intervalo.

Érico acordou, o apito ainda zunindo em seus ouvidos. Meio-dia…

Só podia ter sido um sonho.

Ao longe, um grupo de tricolores cantava “Horto Mágico”. Era hora de ir para o estádio.

PELAS TABELAS

Panorama Tricolor

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