Made in Brazil (por Zeh Augusto Catalano)

Não é novidade pra ninguém que o futebol brasileiro é assolado pelos problemas mais variados. Mas além daqueles que todos já conhecemos – dependência da emissora-patrocinadora, dependência de empresários, endividamento dos clubes, êxodo de jogadores, dentre muitos outros – outros problemas estão ai, diante de nossos olhos. Mas não são mostrados por quem devia.

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A imagem acima é de Ipanema, posto 10. É uma escolinha de futebol do Espanyol, de Barcelona. Perceba que é uma parceria com a prefeitura do Rio. Brasil afora grassam escolinhas, training camps e afins de grande clubes europeus. Brasília tem, por exemplo, uma escolinha do Futebol Clube do Porto.

Ou seja, além de perder os melhores jogadores para a Europa pelo poder econômico dos europeus, que compram os direitos dos jogadores e os levam embora daqui antes que possam efetivamente criar raízes no Brasil, agora eles estão indo direto à fonte. Sem qualquer questionamento. E esse é a primeira dúvida que me vem:

Como pode legalmente um time estrangeiro montar ou patrocinar um evento em plena praia de Ipanema? Quem intermedia a presença dessa entidade, estranha ao mercado, no Brasil?

Imagine então que cem crianças participem desse evento. É bem possível que uma dessas crianças tenha vocação pra jogar bola. O tal do “potencial”, palavra que detesto e que quase sempre vem acompanhada de frustrações. O que vai acontecer? Algo similar ao que ocorreu com Lionel Messi. Com um problema ligado ao crescimento, o Barcelona bancou a família inteira na Espanha desde os 11 anos de idade. E lá foram os Messi embora da Argentina. O final da história já conhecemos.

É um excelente negócio. O investimento no evento é ridículo e certamente tem por objetivo o descobrimento de (um? dois?) novos talentos. A grana que um clube desses vai ter de investir para levar um pirralho e sua família para uma vida confortável é nada perto do retorno futebolístico e financeiro que poderá ter se esse menino virar um jogador, mesmo que mediano. Visto pelo lado do brasileiro, da família desses meninos, qualquer oferta nesse sentido é próxima de um sonho.

Então, voltemos aos nossos clubes com suas infraestruturas precárias e contas quebradas. Com as chamadas “divisões de base” loteadas por empresários. Divisões essas cujos jogos são disputados em locais cada vez mais ermos, em horários cada vez mais malucos, provavelmente para que o torcedor como eu ou você sequer conheça o garoto, para facilitar sua transferência e o lucro.

Surgiu com toda força uma nova concorrência. Não mais o dinheiro e a possibilidade de contratação de seus melhores jogadores pelos clubes estrangeiros. Eles estão cortando esse caminho e vindo buscar nossas crianças.

A reação a esse problema deveria ser nacional, via governo federal, ministério dos esportes ou mesmo via CBF. A longo prazo, este comportamento se tornará mais e mais lesivo ao nosso futebol e nossos clubes já destruídos. Neymar, que nem craque é ainda, foi embora cedo. Com a ampliação dessas atividades, provavelmente o próximo craque brasileiro será um cidadão espanhol ou inglês e jamais terá vestido qualquer camisa de clube brasileiro.

Por último, imagine um campo de treinamento de futebol do Fluminense em Barcelona, Madrid… Surreal, não? Pois é…

Por que ninguém fala disso na grande mídia?

Panorama Tricolor
@PanoramaTri