Fluminense: futebol de resultados e incertezas (por Aloisio Senra)

Tricolores de sangue grená, Roger tem um aproveitamento até aqui impressionante no Fluminense, sem sombra de dúvidas. Isso, é claro, se analisarmos apenas os números frios, não o nível dos adversários que enfrentamos. Evidentemente, é muito melhor ter muitas vitórias contra adversários fracos que empates ou derrotas, mas será o suficiente para sustentar o Fluminense durante o restante da temporada? Talvez o que mais me preocupe, no frigir dos ovos, seja notar que nossa ideia de jogo não varia muito. Seja contra o River Plate em casa ou contra a Portuguesa fora, a estratégia tem sido sempre a mesma: dar a bola ao adversário para reagir às suas investidas, tentando roubá-la e partir no contra-ataque. Um jogo de muito suor, aplicação tática principalmente dos “pontas” que se sacrificam para reforçar a marcação nos lados do campo e dificultar a subida adversária. No segundo tempo, sempre aos 10 ou 15, mas nunca no intervalo, vêm as trocas, não importando muito se estão bem ou não. Sai Kayky, entra Gabriel Teixeira. Luiz Henrique por Caio Paulista. Nenê por Cazares. Fred por Bobadilla ou Abel Hernández (um dia foi o John Kennedy). Ele normalmente guarda a quinta mexida pra trocar um volante. Reparem, em 90% dos jogos acontece exatamente isso.

E ainda que tudo seja muito previsível e o Flu seja o time de uma nota só, resolvendo jogos na individualidade de alguns jogadores, seja na habilidade de Kayky ou no faro de gol de Fred, seja na bola parada de Nenê que encontra a rede ou algum outro jogador em condições de marcar, e/ou aproveitando-se da fragilidade dos adversários ou do cansaço dos mesmos do meio pro fim do segundo tempo, posso afirmar, sem medo de errar, que Roger não tem tido coerência. Não faz as mudanças óbvias para o que o jogo pede, não varia seu esquema, não ousa quase nunca. Pode-se argumentar que ele não tem peças para treinar variações, mas boa parte da culpa por isso é dele, que deixou de avaliar em campo e para a torcida ver também jogadores como Miguel, Jefté, Metinho, André, Wallace, Matheus Martins, Artur e Marcos Pedro, que mereciam – e ainda merecem – ter chances. Enquanto isso, há vários recém-contratados que estão acima do peso, claramente fora de forma e que, em vez de readquirirem a mesma durante o Carioca entrando no segundo tempo, foram alçados ao status de solução.

E agora o Roger, que não testou quase ninguém e permitiu que o Michel Araújo, por exemplo, fosse emprestado, se vê obrigado a usar as contratações como opções imediatas, sob a chancela da necessária “experiência” para a Libertadores. E os caras ainda estão acima do peso, é visível. Enquanto isso, jogadores são mantidos por mais tempo que o necessário, não são substituídos na hora certa ou, até mesmo, dão lugar a outros que ou cumprirão a mesma função e não mudarão a cara da partida quando necessário ou, o oposto, colocarão em risco o resultado ou o sistema tático por realizarem funções distintas por necessidade de improvisação. Ou o que vocês acham que aconteceria se Danilo Barcelos se machucasse em Guayaquil? Em suma, Roger está cada vez mais virando refém de suas escolhas prévias e, quanto mais demorar para tentar buscar soluções de qualidade para as situações que o time ainda não consegue contornar, mais vai tender a jogar no fio da navalha. Pragmatismo muitas vezes ganha os jogos, mas quando temos mata-matas pela frente, precisa de mais do que isso. Odair que o diga.

O futebol de resultado até aqui tem rolado, mas não agrada a quem tem um olho mais clínico e sabe que as vitórias, nesse modelo, têm prazo de validade, ou vão começar a depender cada vez mais do “gol cagado”. Estamos nos reaproximando perigosamente do Fluminense de Odair e nos afastando do Fluminense de Marcão que terminou o Brasileiro jogando o futebol mais competitivo do Brasil. É isso que queremos? É o necessário para sermos campeões de qualquer das competições que disputamos esse ano? Pelo que vimos até aqui, certamente parece ser o bastante para nos classificarmos para as oitavas da Libertadores e para as finais do Carioca, mesmo com um time reserva. Mas e depois disso? Como o Fluminense de Roger atuará contra rivais mais fortes, ou que sejam mais eficientes quando tiverem a bola? Martinelli e Calegari, destaques do time no final da temporada passada, caíram de produção. Será que a culpa é deles ou é do esquema que exige deles 120% todo jogo? Até agora, o Fluminense jogou poucas vezes como o gigante que é sob o comando de Roger. É preciso tornar isso algo recorrente. Caso contrário, Gravatinha precisará trabalhar muito para nos levar a certos triunfos.

Trabalha, Roger!

Curtas:

– É claro que o time pode parecer mal treinado devido ao pouco tempo mesmo para tal. Viagens, desgaste, putarias da Conmebol, etc… não estou desconsiderando nada disso. O time é guerreiro, se doa, e muito do que conseguimos até aqui tem a ver com o comprometimento da equipe e com o peso da nossa camisa. A crítica não é direcionada a essa questão. Infelizmente, é preciso mais do que vontade e raça para conquistar títulos.

– Roger precisa resolver alguns problemas se quisermos ter um bom início de Brasileiro, não tomarmos sustos na Copa do Brasil e, principalmente, termos um time mais azeitado para o mata-mata vindouro da Libertadores, que estou certo que integraremos. O buraco no meio deixado pelo avanço dos volantes precisa ser revisto. A lateral-esquerda precisa ser revista. A ideia de jogar com dois pontas como ajudantes de laterais todo jogo precisa ser revista. Seja com contratações adicionais ou chances a jogadores que ainda não as receberam, é imperativo o ajuste. Alguns conceitos – e jogadores – simplesmente não vão funcionar contra adversários mais fortes, e têm que ser substituídos.

– Mas para que o que citei acima possa acontecer, a panela precisa deixar. Nenê e Fred não precisam ser substituídos ao mesmo tempo todo jogo. Nenê não vai funcionar em jogos que exijam alto nível de jogadores com as limitações dele (basta ver o que fazem alguns times com jogadores mais velhos, a menos que não tenham outra opção, o que não é o nosso caso). Ao mesmo tempo, Cazares só será importante (assim como Wellington e Bobadilla, imagino) se estiver em forma. As decisões estão chegando e o espaço para errar, acabando.

– Palpites para os próximos jogos: Fluminense 2 x 0 Junior Barranquilla; Fluminense 3 x 1 Portuguesa.