Fla ou Flu: quem tem mais time? (por Marcelo Savioli)

Amigos, amigas, se você usa as palavras “mais”, “maior” ou “melhor” numa frase e não coloca a palavra “Flamengo” nela o flamenguista entra em surto. Façam a experiência! Os caras começam a salivar, rolam no chão, se debatem freneticamente, choram e você ainda corre o risco de sofrer uma agressão e perder um amigo.

Perguntem a um flamenguista quem é o favorito para a conquista do Flamengão 2023 e todos responderão a mesmíssima coisa: é o Fluminense. Sim, os flamenguistas acham que o Fluminense é o favorito, contrariando, inclusive, esse tricolor que vos fala, já com algumas décadas de jornada, suficientes para saber que favoritismo em Fla-Flu decisivo é um convite à zebra.

Ora, se os Dissidentes são os maiorais, têm o maior orçamento, as maiores estrelas, o super time, como pode ser o Fluminense o favorito? A explicação parece decorada, na ponta da língua. O Fluminense vive um melhor momento, tem o time mais organizado e o técnico deles, aquele mesmo, que deu um nó na gente no segundo jogo da semifinal da Copa do Brasil e, na final, só caiu para eles nos pênaltis, é um burro.

Para os dissidentes, o Fluminense é um time de jogadores modestos, mas Fernando Diniz é uma espécie de mágico, que faz uma orquestra com músicos de segunda ou terceira categoria executar com perfeição a Nona Sinfonia.

A soberba é um traço de caráter dos dissidentes e com ela, naturalmente, vem a cegueira. Não é algo inato, mas um transtorno de personalidade adquirido, que só se manifesta quando surge na conversa a palavra “Flamengo”. Tirando tal circunstância, podem ser pessoas amáveis, inteligentes e até sensatas. Pense numa pessoa que você admira muito, mas que é flamenguista. Perceba como ela se transforma quando o assunto é a Dissidência.

Sabemos muito bem a causa de tal patologia. É só lembrarmos da final do Flamengão 2007, a anulação do gol do título do Botafogo, marcado por Dodô, absolutamente legal, anulado pela arbitragem de Djalma Beltrami. A “indevida” reclamação dos botafoguenses foi transformada em “chororô”. Mas, se formos lembrar de todos os episódios análogos, teremos que escrever um livro.

Como diria uma certa torcida, que veste verde, branco e grená, na maior bofetada sem mão da história do futebol: “orgulho de não ser como vocês”.

Lembro, como se fosse hoje, daquela final de 2017, quando Wagner do Nascimento Magalhães deixou de marcar falta escandalosa de Réver em Henrique, que culminou no gol que decidiu o Flamengão daquele ano. Reparem que já citei o nome de dois árbitros nessa crônica. Só não vou citar o nome do amigo flamenguista que quase surtou quando eu, alguns minutos após o término do jogo, puto da vida, mas sem qualquer agressividade, falei que o árbitro decidiu a partida. Pronto! Acabei com a felicidade do pobre coitado, que quase chorou de raiva.

Aliás, falando em chorar de raiva, tive diálogos divertidíssimos esses dias com rubro-negros. O tema em questão era qual dos dois times é melhor. Fla ou Flu? Flu ou Fla?
Lembrando que eles acham que o Fluminense é favorito para a decisão do Flamengão 2023. “O Fluminense não tem nenhum craque, mas é um time bem treinado”, eles dizem. E está dada a explicação que cabe confortavelmente em seus corações, mas aí tem uns caras que adoram desarrumar as coisas e colocar controvérsia onde não é devido.

Aqui termina a conversa de botequim e vamos à análise séria do assunto. Diniz é um gênio? Quem é o presidente do fã clube para contrariar tal premissa? Para mim, não é de hoje, Diniz é o maior técnico do Brasil nos últimos 250 anos. Por que, todavia, esse técnico não conseguiu tirar o Vasco da Série B em 2021 e não vingou no Santos?

Porque Diniz é o melhor técnico do Brasil, mas não é mágico. O melhor técnico do mundo não fará o pior time de todos ser uma força competitiva, e não estou dizendo que o Vasco e o Santos eram essa aberração. O exercício de ir e voltar na história é cansativo, mas vale a pena. É bom lembrar que esse time do Fluminense, com poucas alterações, jogou o melhor futebol do Brasil no começo de 2022.

Apesar disso, o Fluminense encontrou a Dissidência na final do Flamengão 2022 tendo o adversário como favorito absoluto pela terceira vez seguida. Um Fluminense que, graças às escolhas estapafúrdias do nosso amado Abel Braga, e não há ironia alguma no “amado”, quase foi eliminado pelo Botafogo na semifinal.

Eu escrevia aqui, no Panorama Tricolor, que para ganhar o campeonato bastava pegar aquele Time B e colocar dois ou três jogadores do Time A para sermos favoritos para a conquista. Percebam a sutileza presente no que estou evidenciando aqui. O Fluminense seria favorito para ganhar o título do Flamengão 2022 se Abel houvesse escalado o time que jogava o melhor futebol do Brasil na ocasião. E não tinha Fernando Diniz no Fluminense.

Mesmo com os erros, ainda sem Diniz, ganhamos o campeonato com uma exibição grandiosa no jogo decisivo, comandados por Paulo Henrique Ganso. Ou seja, ganhamos da Dissidência com todos os erros e todas as estrelas deles. Imaginem o que poderia ter acontecido se Abel houvesse feito as escolhas certas.

Diniz as fez. Apesar de uma temporada errática, foi, aos poucos, reunindo o que tínhamos de melhor e colocando de lado o que tínhamos de pior. Em razão disso, fomos, em alguns momentos da temporada, apontados como o melhor time do Brasil. Como é possível ser o melhor time do Brasil com jogadores meia boca, quando tínhamos Palmeiras, Dissidência e Atlético MG com elencos recheados de jogadores de primeira prateleira? Quanta incoerência!

Amigas, amigos, a verdade, queiram ou não admitir, é que o Fluminense de 2023 é um timaço. Repito: um timaço. Um time que tem Nino, zagueiro titular do Brasil campeão Sub-20. André, um cracaço, jogador de seleção. Jhon Arias, jogador de seleção colombiana, Cano, um demônio dentro da grande ária, Ganso, uma verdadeira aberração futebolística, no melhor sentido, e vou parar por aqui para não provocar ainda mais a ira dos flamenguistas.

É só uma questão de naturalismo, de ver as coisas como elas são. Eu sei que isso provoca desconforto até nos tricolores e é natural que isso aconteça. Mas o meu papel é analisar os fatos com frieza. Não tem favorito no Fla-Flu decisivo porque são dois times recheados de jogadores de altíssimo nível, ainda que eles tenham o terrível desfalque de Arrascaeta nos dois jogos decisivos. Os flamenguistas podem espernear o quanto quiserem. Os melhores jogadores deles teriam que disputar vaga para jogar no time do Fluminense, o que não muda o fato de serem grandes jogadores.

O Fla-Flu decisivo de alguma forma me faz lembrar o antológico Fla-Flu de 1984, que mais parecia uma degustação futebolística, com Ubaldo Fillol, Paulo Vitor, Leandro, Aldo, Mozer, Duílio, Andrade, Leomir, Tita, Jorginho, Adalberto, Adílio, Romerito, Assis, Washington, Tato, Bebeto e por aí vai. E olha que o Fluminense jogou desfalcado de Ricardo Gomes, Branco e Deley.

A minha visão é de que devemos desfrutar desse momento. Um momento único no futebol carioca nos últimos tempos. Com Ayrton Lucas, David Luiz, Samuel Xavier, Martinelli, Nino, André, Arrascaeta, Pedro, Gabigol, Germán Cano, Arias, Ganso e por aí vai.

O que não pode acontecer é esse erro recorrente na análise, que é achar que a Dissidência tem mais time que o Fluminense. Pode tirar o Diniz da análise e continuaremos tendo duas forças equivalentes, porque o Fluminense, a exemplo do rival, tem um timaço, que é candidato a ganhar tudo que disputar em 2023.