Fairplay é o cacete! (por José Augusto Catalano)

Nosso esporte mudou. Pra pior. Hoje contam se nos dedos um Juninho, um Rogério Ceni, um Marcos. Os craques, por mais geniais que sejam, são passageiros. Beijam escudo de um hoje, amanhã beijam o de outro clube. Pior que isso, no novo clube, não comemoram os gols sobre o antigo empregador.

Cabe aqui um parêntese: as tais dancinhas, coreografias, são ainda piores. Se os senhores querem aparecer, que façam seu picadeiro em outro gramado, e vestindo camisa que combine com essas palhaçadas. Graças a Deus, o Vasco não é assolado por essa tristeza, Vamos adiante…

Voltando ao nomadismo, à falta de identidade com os clubes, na Europa o problema é ainda mais grave. Os manchester, os dois de milão, só pra citar quatro exemplos fortes, são verdadeiras babel. Nada de xenofobia, mas que identidade isso pode criar com seus torcedores? Vi jogos da Inter de Milão em que não havia nenhum italiano em campo. As seleções são afetadas por isso. Ou seus jogadores estão longe, em outros mercados, ou, como aconteceu com os italianos, ou eram banco em seus times, ou titulares em equipes menores, desacostumados, portanto, com a pressão de um time ou seleção de grande porte, que tem obrigação de ganhar sempre.

Lembro que, em 82, as figurinhas da copa, que vinham nos chicletes ping pong, mostravam caras totalmente desconhecidas. Conhecia-se a Itália, a Alemanha, alguns da França. Hoje não surge mais um N’Kono, um Milla, um Makanaky numa copa. Quando jogarem numa copa, já estarão na Europa há tempos.

Nessa época do politicamente correto, de fairplay, uma batalha de Nuremberg (Portugal x Holanda, copa de 2006)  é exceção. Dezesseis amarelos, quatro vermelhos (Deco entre eles), pancadaria em campo. Os dois times queriam ganhar. As circunstâncias foram aquecendo o jogo até transformá-lo numa fornalha. Exceção porque hoje, com essa babelização, as rivalidades foram pasteurizadas. Até bem pouco tempo, Julio Cesar, Maicon e Lúcio, titulares absolutos da seleção, jogavam com Zanetti, Milito e Gambiasso. Tirando algum momento muito peculiar, nunca que um veríamos uma falta mais dura de um brasileiro num argentino desses, ou vice versa. Na cabeça esta o companheiro de clube ou, no mínimo, o investimento do clube. Dar um pau firme num companheiro de time poderia ter consequências pesadas para o bolso do criador do caso.

Não estou aqui defendendo a porrada pura e simples, mas sim afirmando que as rivalidades tradicionais do futebol se acalmaram por causa desta embaralhada de nome e países. E que a hipocrisia cresceu. Nove em cada dez amantes de futebol acharam a pancadaria do parágrafo anterior inesquecível. Mas a imprensa, ah, a imprensa… Ficou horrorizada, execrou o comportamento sanguinário dos times. Como se antigamente coisa pior não acontecesse quase todo dia. Não vi Tomires e Pavão jogarem, mas certamente era pior. Bellini, Orlando e Coronel faziam um rodízio de porrada em Garrincha (hahahahah… que maravilha!). Em 1954, houve a famosa Batalha de Berna (que ainda não consegui achar na internet pra baixar) na qual o Brasil, até onde sei, baixou o sarrafo na Hungria de Puskas. A enciclopédia foi expulsa. Pelo visto deixou o livro cair no pé de um adversário…

Em suma, hoje é todo mundo amiguinho. Inclusive os comentaristas e repórteres o são dos jogadores e de seus assessores de imprensa. Caminhamos então prum mundo asséptico, sem críticas, todos na maior normalidade e neutralidade. As exceções são aquelas cuja rivalidade transcende o campo de futebol e tem fundamentos históricos tais como Catalunha e País Basco X Espanha (leia-se Real Madrid)

Fairplay é o cacete!

José Augusto Catalano

Panorama Tricolor/ FluNews

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Contato: Vitor Franklin