Cadê meu Fla x Flu? (por Paulo-Roberto Andel)

Há tempos.

Onde está o meu Fla x Flu?

Há tempos.

O jogo desta tarde bem sabemos, é no Maracanã e decide a simbólica Taça Guanabara. De toda forma eu queria o tri. Quero. Muito.

Taí o jogo que nunca termina.

Meu Fla x Flu é um poço sem fim de lembranças, muitas felizes, outras não. E daí? A vida é assim.

O meu Fla x Flu começava sempre uma semana antes do jogo, lendo todos os cadernos de esportes possíveis, escutando as jornadas esportivas, limpando os botões tricolores com Poliflor e flanela.

No sábado o peito já batia mais forte. Meu pai nunca dava certeza se iríamos ou não ao Maracanã. Hoje entendo: ele não sabia se teria dinheiro. No domingo dava tudo certo, e os melhores momentos da minha vida com meu pai estão ligados ao futebol, ao Fluminense.

Às vezes chegávamos tão cedo que os portões estavam fechados, então sentávamos na escadinha da entrada Bellini do Maracanã, algo impossível hoje por causa da máfia das grades.

Depois era o sonho. Podia ser o Fla x Flu da água no chope ou o do golaço do Cristovão, o mesmo que São Paulo Goulart pegou o pênalti do magoado Zico – veja os jornais do dia seguinte. Até naquele em que perdemos por 3 a 1 em 1981 fomos valentes e brigamos até o último round.

Teve aquele do returno de 1983. Perdemos de virada também, mas quem viu o sorriso lindo da Eliane no estádio superou tudo. E depois o carrasco Assis fez o serviço com sobras. Desde então cada jogo tem sido uma página de um livro interminável.

Muito antes de mim, o Fla x Flu fez chover em 1912, 1941, 1963, 1969 – aí eu já tinha um aninho. São 112 anos de confronto, são muitas histórias. Do gol de barriga já falei demais – nada, absolutamente nada será igual àquela tarde noite de 1995.

O jogo deste domingo parece quente. Temos que vencer, mas a torcida naturalmente está focada na decisão de quinta. Eles parecem melhores no momento, mas sabemos crescer nestas horas. O Fluminense tem três batalhas: Fla, LDU e Bota. Acho que dá. Temos André, Martinelli, Arias, Cano, é uma turma da pesada. Eu queria ver o Felipe Andrade nessa, do jeito que vi Edinho um dia. P

O meu Fla x Flu estava (está?) na minha família, nos meus amigos e amores, naquela arquibancada mágica onde mal se podia mexer duas horas antes da bola rolar. Estava em Jorge Curi, Waldyr Amaral e João Saldanha. No 434 de Copacabana à amada UERJ. Estava nas peladas de futebol de praia no campo do Juventus, em Copacabana. Naquele sinalzão que as rádios emitiam nos minutos finais do jogo e o Maracanã todo ecoava.

O Fla x Flu também está nos pés descalços daqueles garotinhos que pediam moedas para o ingresso nas bilheterias, todos do meu tamanho ou até menores, e que quando conseguiam os bilhetes saíam correndo felizes, abraçados como se tivessem feito um grande gol.

Num instante me vejo sozinho, porque o meu Fla x Flu está recheado de heróis anônimos, famosos, gente muito importante para mim e agora morta, morta mas ao mesmo tempo viva – não paro de pensar neles.

Às vezes me sinto o único sobrevivente do meu mundo particular e isso me corta o ventre, mas então eu volto ao velho domingo de manhã e procuro pelo meu pai, sonhando que é possível reviver o passado.

Quem sabe eu não sonho e ele me chama para irmos ao Maracanã sem grades, do jeitinho que era em 1978? Quem sabe eu saio das minhas ruínas?

O jogo que nunca termina é o sonho que sempre há de povoar o nosso imaginário.

Ainda não sei onde está o meu Fla x Flu, mas ele é vivo demais. Vivo.