A SAF e o futuro do Fluminense (por Bruno Carnevale)

Poucas vezes na história o Fluminense esteve diante de um momento tão decisivo para o seu futuro. A SAF deixou de ser uma hipótese distante para se tornar uma possível realidade, que exigirá debates com profundidade e responsabilidade. O risco que corremos, especialmente em um ano eleitoral, é permitir que a discussão seja desviada para ruídos políticos, vaidades e interesses personalistas, em vez de se concentrar no essencial. A hora do debate se aproxima, e precisamos estar preparados para tratá-lo de forma técnica e madura, evitando que o destino do clube seja decidido de maneira rasa e oportunista.

Mário Bittencourt conduz o ritmo do processo e pode vir a ser o CEO da SAF. Ainda que a transição para o modelo dependa da aprovação do Conselho Deliberativo e, depois, dos sócios, é natural que seu nome apareça como o mais indicado para conduzir a fase inicial, já que hoje é quem mais conhece o clube por dentro — algo que pode transmitir confiança aos investidores. Mas, justamente por isso, o conflito de interesse se torna evidente sob o prisma de seus opositores. E, no fim das contas, onde fica o Fluminense, que deveria ser o principal da discussão, já que presidentes e CEOs são sempre transitórios?

O caminho da necessária profissionalização do Fluminense passará, antes de tudo, por um modelo de governança robusto, transparente e moderno. Não se trata apenas de trocar a forma jurídica, mas de garantir que profissionais de alto nível estejam verdadeiramente dedicados à direção do clube. É preciso discutir como a dívida será reestruturada e equalizada, evitando que o passado de gestões pouco responsáveis siga engessando o futuro. Também deve ficar claro quais são os planos estratégicos de médio e longo prazo: quanto será investido, onde esses recursos serão aplicados e de que forma o Fluminense se posicionará para competir em alto nível de forma sustentável. Outro ponto central é o perfil de quem investirá no clube: mais do que o capital, uma precificação justa e o veículo de investimento: importa saber o que esses parceiros agregam em experiência, conhecimento e capacidade de abrir caminhos para que o Fluminense alcance novos patamares. Como conciliar o retorno de capital esperado pelos investidores com o retorno esportivo que a torcida exige? E, por fim, é essencial definir mecanismos que evitem que o clube caia, no futuro, em um limbo de brigas societárias que comprometam a estabilidade e desviem o foco do que realmente importa: o futebol.

O maior risco da discussão sobre a SAF é que ela se perca nas disputas internas e nos interesses pessoais que dominam a política do Fluminense. Há o perigo concreto de transformar um projeto estratégico em um ringue de vaidades e ressentimentos, em vez de pensar no futuro do clube. E tudo isso se agrava pelo fato de que teremos eleições do clube correndo em paralelo com o projeto da SAF, o que tende a intensificar narrativas oportunistas, muitas vezes movidas por interesses ocultos.

A SAF, se concebida com inteligência, pode trazer ganhos reais ao Fluminense, como a profissionalização da gestão, investimentos estruturais que deem fôlego ao clube e maior competitividade em um cenário cada vez mais exigente. Temos a vantagem de aprender com erros e acertos de outras experiências e, assim, desenhar um modelo mais maduro, refinado e adequado à nossa identidade. O desafio e a oportunidade estão sobre a mesa: transformar a SAF do Fluminense na mais sólida e exemplar do futebol brasileiro — e não em mais um capítulo da retórica que alimenta a política decadente do clube. O Fluminense não pode perder o bonde da história, pois é parte essencial da própria história do futebol brasileiro.

No fim, a pergunta é inevitável: seremos capazes de conduzir o processo com inteligência, fidalguia e foco no futuro ou o deixaremos se perder no jogo mesquinho da política?