Eu estava em minha peregrinação habitual, ao lado de meu amigo Beremitz, quando me deparei com uma cena inusitada: um grupo de sócios discutiam acaloradamente em pleno caminho.
Algo envolvendo uma herança e algumas dívidas.
Prontamente, Beremitz resolveu questionar o que estaria ocorrendo. Ele era um exímio calculista, amava a matemática. A alcunha pela qual era conhecido era O Homem que Iludia, tamanha sua capacidade de emaranhar os números.
“O que se passa, nobres irmãos?” Perguntou ele. A resposta veio de um dos homens que discutiam.
“Nobre caminhante, temos aqui um problema matemático. Recebemos 35 camelos de herança de nosso pai, porém, temos uma dívida impagável, e ainda precisamos dividir estes camelos por 03.”
Muito habilidoso, Beremitz popôs uma solução nada ortodoxa:
“Ora, quanto é a dívida e por quanto está avaliado cada camelo?”.
“A dívida chega a 800 milhões de dinares, e cada camelo vale ao menos uns 7 milhões de dinares, não podendo, então, haver solução para nosso problema.”
“Ora, pois a solução é tão fácil que agradaria até mesmo ao Profeta.”
Todos o olharam surpresos, inclusive eu que apenas observava tudo.
“Basicamente, o patrimônio de vocês é constituído pelo valor da dívida, mais o valor total de camelos. São 800 milhões, mais uns 250 milhões pelo total de camelos. Meu amigo aqui – apontando para mim – possui 500 milhões de dinares. Ele arrendará os camelos, por 03 parcelas, sendo que lhes dará agora 250 milhões e depois mais duas parcelas de 125 milhões. Findando assim a compra final em dois anos, e os camelos serão dele.”
Eu estava assombrado. Comprar os camelos pelo dobro do preço? O que eu ganharia com isso? Estaria Beremitz completamente louco? Mas ele seguiu:
“A administração do aluguel dos camelos, porém, passará para as mãos de meu amigo neste exato momento. E ele me nomeará como administrador dos camelos. Assim, a cada ano, os aluguéis destes camelos serão usados para o pagamento da parcela de vocês e abatimento da dívida. Ao fim, vocês depois de 05 anos devolvem os 500 milhões de dinares de meu amigo, que nem mesmo lhes cobrará juros, e acaba-se o negócio. Vocês ficam livres da dívida e do problema da divisão da herança.”
Eu estava boquiaberto. Eles louvaram a sabedoria do Homem que Iludia.
“Viva Beremitz! O Senhor esteja com ele!”
Entreguei os 250 milhões de dinares aos sócios e recebi os 35 camelos. No mesmo dia recebi já o valor dos aluguéis daquele dia, que totalizaram quase 10 milhões de dinares.
Olhei triste para Beremitz e o indaguei:
“Você me fez desembolsar 250 milhões de dinares e ainda mais 250 em dois anos, e está aí sorridente? Confesso que não o compreendo.”
“O importante, é que os sócios não me entendam, meu nobre amigo. Deixe a meu dispor a administração dos camelos, e verás no futuro que todos sairemos ganhando.”
E saiu andando tranquilamente, avaliando os camelos com um enorme sorriso no rosto.