“Toda unanimidade é burra” (por Marcelo Savioli)

Amigos, amigas, a frase de Nelson Rodrigues raras vezes foi tão oportuna. E quando eu falo de “unanimidade”, estou me incluindo.

Dez em cada dez analistas, daqui do PANORAMA à Gazeta de Vai-Volta, analisaram a partida do último domingo atribuindo a derrota tricolor à insistência de Fernando Diniz em manter Keno no time, aberto pelo lado esquerdo, com Jhon Arias fazendo amplitude pelo direito.

A minha única discordância foi quanto à afirmação de que o Fluminense foi triturado pelo Volta Redonda. Não é possível corroborar tal conclusão num jogo em que o Tricolor teve o dobro de oportunidades de gol do adversário.

Tirando tudo isso, a nossa reclamação era de que faltavam ao time as jogadas de aproximação, sobretudo porque Arias deixou de atuar no entorno da bola, como lhe é de praxe. O time do Fluminense tinha dificuldade de criar pelo meio, Ganso avançava demais e nossa construção de jogo esteve abaixo das grandes jornadas.

Será que estávamos todos errados na análise? Não, não estávamos, foi o que aconteceu em campo. Vimos todos o mesmo jogo. O erro estava em decretar a inviabilidade de uma variação tática e em condenar Keno precipitadamente ao banco de reservas.

E veio o jogo de sábado para nos mostrar o quanto estávamos errados. O problema não era da variação tática, em si, mas de alguns ajustes. É bem verdade que os dois gols marcados em menos de sete minutos de partida desmontaram qualquer que fosse o projeto do Volta Redonda para o jogo. Mal começou, a fatura já caminhava célere para ser liquidada.

Já no domingo, após o jogo, eu desfolhei as páginas dos sites atrás de uma análise que explicasse com autoridade o que acontecera no sábado. Acabei encontrando a crônica do Mansur, do GE, que foi na mosca. Hoje, lendo o Dedé Moreira, ele começou sua crônica dizendo exatamente o que eu gostaria de dizer. Ele faz referência à crônica do Mansur, abrindo mão de mais analisar taticamente o que levou o Fluminense a meter sete bolas nas redes do Volta Redonda, com direito a três bolas na trave.

Em resumo, o segredo de Diniz foi a movimentação dos laterais. Enquanto Arias e Keno davam amplitude ao jogo, os laterais atacavam por dentro, fazendo as maiorias em torno da bola, mas com uma dinâmica diferente. As trocas de passes eram muito rápidas, com muita movimentação vertical e ataque à área.

O exemplo de tudo o que disse Mansur são os gols de Samuel Xavier, o primeiro, e o terceiro gol, marcado pelo outro lateral, Alexsander. No primeiro, Samuel ataca a pequena área como fosse um centroavante, aproveitando cruzamento de Keno, que fica no um contra um pelo lado esquerdo, algo impensável na partida anterior.

Aliás, Keno passou o jogo fazendo o que queria com os marcadores, enlouquecendo os defensores do Voltaço, enquanto Arias fazia o mesmo pela direita.

No terceiro gol, quem aparece atacando espaço por dentro é Alexsander, que recebeu uma metida de bola milimétrica de Ganso. Talvez pela quantidade de gols, não percebi repercussão à altura para esse terceiro gol do Fluminense. Que tem dois aspectos interessantes. O primeiro é o de mostrar essa dinâmica mais ágil e envolvente do Fluminense. A bola começa a ser trabalhada no campo de defesa, com o Volta Redonda tentando pressionar e roubar a bola, que sai de pé em pé, envolvendo e destruindo as linhas de marcação. Até encontrar Ganso na meia cancha, livre de marcação, com tempo demais para pensar. E aí deu no que deu.

O outro aspecto é uma revelação importante para explicar o show tricolor. Reparem que Ganso está no meio de campo, na zona de criação, com todos os meias no campo de defesa e Alexsander como homem mais avançado. Foi o que acabou de desarrumar a marcação adversária.

O quarto gol mostra outro aspecto interessante do jogo, que é Martinelli jogando como meia mais avançado quando o Fluminense atacava, entrando na área para triangulações e finalizações. Em linda cabeçada, Martinelli fez o quarto, com assistência do tanque de guerra colombiano.
Martinelli, novamente atacando a área, quase marcou o quinto e, numa passagem pelo lado direito, já na segunda etapa, quase provocou um gol contra do defensor do Volta Redonda, com a bola explodindo na trave.

O Fluminense de ontem até me fez lembrar mais aquele de 2019, com suas saídas de trás fulminantes, usando a velocidade dos atacantes para pegar as defesas adversárias abertas, após atrair suas linhas para a caça nas proximidades da nossa área.

Qual é a grande notícia nisso tudo? São duas, na verdade. O Fluminense ganha em alternativas táticas diferentes, porém igualmente letais. O que nos torna ainda mais poderosos para encarar a temporada com chances de vivermos um ano memorável.

A outra notícia é que, dependendo do adversário, Keno, que fez sua melhor partida no ano, com duas assistências para gol, pode ser uma peça letal. Até acredito que essa ideia de jogo será a base das movimentações táticas tricolores.

Só tem algo com que eu não concordo muito, que é o Fluminense ser apontado como favorito nos Fla-Flus decisivos. Não, eu acho que não há favorito. Inclusive porque a Dissidência é quem mais se beneficia das duas semanas sem jogos, pois terá tempo para assimilar melhor as propostas táticas do seu treinador. E nós estamos falando de um grande time, com inúmeras referências técnicas, assim como o próprio Fluminense.

Espero, sim, por um grande jogo, com altíssimo nível técnico e capaz de fazer a plateia levitar de emoção e prazer nas arquibancadas.

Diniz está, mais uma vez, de parabéns. Não só deu um nó no Volta Redonda, como nos colocou a todos no bolso. E não é isso que esperamos do nosso enviado dos Deuses?

Convido a todos para ficarem de olho aqui no PANORAMA, porque não serão duas semanas sem conteúdo. Aliás, ao contrário, conteúdo é o que não falta para preencher as horas de expectativa até o dia 2 de abril.

Saudações Tricolores!