Quem se lembra? (por Paulo-Roberto Andel)

Agora somos céu. Tudo é festa, felizmente. Em poucos anos, o Fluminense recobrou o gigantismo de sempre é isso é que impõe fel aos textos de jornais. O tricolor é o rei de 2012.

Somos vocacionados para a conquista. O Fluminense nasceu no berço esplêndido das vitórias, todas temperadas com o rigor da dramaturgia. Pois bem, ganhamos este ano de forma diferente. Não que tenha sido fácil, nunca o é, mas a carga dramática foi bastante atenuada pela força que o Fluminense demonstrou nas finais do campeonato estadual e em todo o brasileiro, sobrando no terço derradeiro desta competição.

Ontem, já em clima de fim de festa, conversei com nosso companheiro de site Luiz Couceiro pelo telefone. Entre tantas coisas engraçadas, recordamos os tempos do futebol de praia em Copacabana há uns vinte anos, o cenário político-econômico daqueles tempos e, de forma inevitável, o futebol tricolor surgiu.

Eram tempos difíceis. O Fluminense era desacostumado a qualquer jejum de títulos. A bola começou a bater na trave, 1986, 1987. Copa União de 1988, o inesquecível jogo contra o Vasco, depois caímos na Fonte Nova pelas semifinais. E tome 1989, 1990, outra semifinal de campeonato brasileiro em 1991, outra perda, fomos trapaceados na final do estadual também, Copa do Brasil de 1992 idem. Isso durou até o maior gol de todos os tempos no centenário de 1995. Foi uma época que nos marcou talvez por certa negatividade, mas também por ser diferente de tudo o que vivemos e soubemos antes: o Fluminense sem títulos? Vejam, não foi o caso de ficar fora da disputa – perdemos várias chances, montamos times mais brigadores, menos técnicos, mas que lutaram por títulos assim mesmo, embora sem sucesso.

Mas quem disse que o torcedor é torcedor apenas nas vitórias?  Apesar de reconhecida – e amplamente dissecada por Caldeira -, a chamada “tricolebagem” não nasce no vente dos tricolores.

Ao nos lembrarmos daqueles tempos escassos, rimos muito. A memória afetiva não foi apagada porque não fomos campeões.

Macalé? Macula? Eram bons. E só.

Bobô tinha classe, Caetano soube fazer os versos.

O Zanata na lateral-direita com um aplique nos cabelos de Tina Turner.

Zagueiros? Luiz Eduardo, Luiz Fernando, Mazola, Luiz Marcelo (que fez gol de cabeça em Fla-Flu), Mazola.

E Paulo Apito na lateral-esquerda? Contra o Atlético Paranaense, ele mesmo “apitou” (assobio), os rubro-negros pararam, ele ajeitou a bola com a mão e cobrou uma falta.

Dacroce de volante, Ribamar como coordenador de jogadas. João Carlos, Helio “Maluco” (pai do Bernardo, que deve voltar para o Vasco) e Rinaldo (que cobrou a falta na seleção depois de Pelé ter ajeitado a bola…).

Serginho, Pires, Dudu, Chiquinho, Cícero (tido como o “novo Falcão”, por ser lourinho e catarinense). Edvaldo Negão na ponta-esquerda, que conseguiu chutar o chão num cruzamento contra o Vasco e se machucou sozinho.

Em 1993, sofremos com o miolo de zaga formado por Júnior Mineiro e Andrei. Nei era ótimo goleiro, não foi valorizado à altura. Antes, numa chuvarada e com direito a muitos tiros no Maracanã, Julinho fez dois gols de falta contra o Botafogo. Jerry veio do Cruzeiro e poderia ter ido melhor. Mais do que antes, quando parecia ser vacas-magras, tínhamos um luxo em 1991: Valber e Torres, este sim um miolo fantástico.

Antes, Carlos André era o homem de ferro na lateral-direita. A garotada prometia: João Santos, Alberto, Franklin, Gama, Zé Maria (presente e decisivo naquele jogo que comentei contra o Vasco, Copa União 1988).

Será que Rau tinha futuro como zagueiro-central? Se Ricardo Pinto tivesse sido poupado depois da desgraça em 1993, será que a tragédia de 1996 não aconteceria? É um mistério.

Por que nunca mais valorizamos gente nossa como Sérgio Cosme, Ismael Kurtz, Sebastião Araújo?

O garoto Alexandre entrou em campo no Fla-Flu, recebeu o cruzamento errado de Zé Teodoro, cabeceou firme, garantiu nossa vitória de virada e nunca mais jogou. Por onde está?

Eu e Luiz conversando sobre o passado. A história não é feita somente de glórias, ainda que tenhamos muitas a granel. Na verdade, a história é feita de vida.

Quando pensamos nos que passaram e nem sempre foram felizes com nossa camisa, não estamos tributando o Fluminense em si, mas sim à vida. Os nove anos entre a vitória contra o Bangu e o centenário imortal não foram os da supremacia do Fluminense, mas como fomos felizes – mesmo sem grandes títulos. É que soubemos viver as arquibancadas mais do que nunca.

Cantar e gritar é fácil nas vitórias, nos grandes momentos como este agora em que vivemos. Só não está feliz quem é louco.

Naqueles tempos, amigo, para gritar não bastava ser feliz. Era preciso ser tricolor nas entranhas.

Por ora, um brinde ao tetracampeonato e às vacas gordíssimas.

Paulo-Roberto Andel

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Contato: Vitor Franklin

À venda, o novo livro de Paulo-Roberto Andel: http://www.7letras.com.br/duas-vezes-no-ceu-os-campeoes-do-rio-e-do-brasil.html

2 Comments

  1. E aí galera?
    Rapaz, eu me recordo bem do Polaco e do Rangel, que atuaram naquele América de 86 e que depois jogaram no Flu. O Torres, novinho: como caía bem aquela camisa nele, hein? Outro jogador das vacas magras de quem gostava era o Eduardo (Lateral Esquerdo). João Santos e Franklin eram bons de bola, o Flu deu mole e eles foram para o Bragantino (campeões paulistas). Macula veio do Bangu (gostava dele!!). Enfim, tempo ruim que não volta mais (se Deus quiser!!)

  2. Eh Andel. Nao valorizamos gente nossa. Vide Tartah. Estou com medo de que aconteca o mesmo com o Marcos Junior. Ele seria reserva amanha, pelo que deu pra entender, se nao tivesse acontecido o lastimavel acidente com o Mateus.

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