Os novos planos de associação… (por Felipe Fleury)

…e o dever de informação

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Eu tive a oportunidade de escrever, aqui mesmo no Panorama Tricolor, um texto nominado “Cem mil maníacos pelo Fluminense”, em que defendi a tese de que cem mil sócios torcedores dariam a sonhada autossuficiência ao Tricolor. Para tanto, sugeri algumas ideias a fim de fidelizar o torcedor ao projeto, evitando-se um dos maiores problemas da sobredita associação que é a volubilidade do sócio, normalmente atrelada à situação da equipe dentro de campo.

Assim, após meses de estagnação no que concerne ao aporte de novos associados e à inação do departamento de marketing tricolor, a esperança ao que parece se renova. Foram apresentados esta semana novos planos de associação que serão geridos pelo Fluminense e operacionalizados pela empresa Golden Goal Sports Ventures Gestão Esportiva Ltda – leia-se Chime Sports Marketing (CSM), grupo de marketing inglês (dono das marcas Icon, Fast Track, Iluka e Essencialy) que adquiriu 60% da Golden Goal Sports Ventures para entrar no mercado nacional de marketing desportivo.

À primeira vista, a CSM é uma empresa expert no assunto, responsável, inclusive, pelo marketing nas ruas de Londres por ocasião das Olimpíadas naquela cidade. E a Golden Goal Sports, vamos chamá-la assim, também atua gerindo os negócios do A. C. Milan no Brasil, operacionaliza o projeto cidadão rubro-negro e gere os camarotes do Engenhão, dentre outros projetos menores, informações estas obtidas no site da empresa.

O Fluminense, assim, descentralizou a operacionalização do seu projeto de sócio-torcedor e os resultados mais próximos estão aí: cinco novos planos de associação, o que, para um clube que não possui um estádio moderno, onde sejam vinculados aos planos a utilização de camarotes e lugares cativos, está de bom tamanho.

Se o projeto vai deslanchar, isso é outra história.

Para o presidente Peter, conforme anunciou no dia do lançamento dos novos planos, o sucesso da empreitada dependerá do engajamento do torcedor. Neste ponto, eu ouso discordar do nosso mandatário, uma vez que se dependesse apenas de engajamento, nenhuma das contrapartidas anunciadas nos recentes modelos de sócios seriam necessárias, bastaria o velho programa, que nunca ultrapassou o patamar dos vinte e cinco mil sócios-torcedores.

O engajamento é necessário, contudo é preciso mais.

As novas vantagens, evidentemente, incentivarão o torcedor a aderir ao programa ou a migrar para outro plano que lhe pareça mais interessante, mas o que efetivamente motiva o torcedor verdadeiramente engajado é o seu amor pelo clube. Este fica. Aquele que se associa apenas pelos benefícios de que poderá usufruir deriva à mercê da maré e poderá, como sói acontecer, cancelar seu título ante eventuais sequências de resultados ruins ou resultados acachapantes. Não deveria ser assim, mas, infelizmente, a volatilidade da torcida é algo com que se deva lidar.

Talvez antevendo situações como essas, a empresa fez constar do novo contrato – leiam, por favor, no novo portal do sócio torcedor em https://www.sociofutebol.com/conteudo/14 – uma cláusula que prevê multa ao associado que desistir do plano contratado – a multa não incidirá se o sócio não renovar o contrato ao seu término, o que deverá ser expressamente manifestado na forma do disposto no item 5.10.1.

À evidência, é um direito da empresa resguardar-se, mas não acredito que essa seja a forma adequada de tratamento a quem aderiu ao projeto espontaneamente, por amor ao seu clube, em razão do que seria plausível que lhe dessem o direito de também sair sem qualquer ônus, principalmente porque não estará indenizando a empresa por serviços usufruídos, mas pagando verdadeira multa contratual. Talvez isso seja um obstáculo que se contraponha aos novos benefícios, fazendo com que vantagens e desvantagens se compensem, o que poderá inviabilizar a adesão da quantidade de novos sócios pretendida.

Essa fidelização à fórceps é comum nos contratos de telefonia celular, TVs a cabo etc, mas não me parece que caia bem numa relação entre o torcedor e o seu clube, onde a liberdade de ir e vir, apesar de gerar insegurança para o destinatário das verbas, deveria ser respeitada. No mínimo, informada com ampla divulgação.

Aí está a cláusula do contrato que impõe a multa:

13.1.1. Caso o torcedor não tenha interesse em manter o plano contratado com o Programa, deverá avisar à EMPRESA RESPONSÁVEL através da Central de Atendimento no número (21) 3385-9930 disponível no site, informando sobre a sua intenção. Nesta hipótese, o usuário deverá pagar, a título de multa pelo cancelamento antecipado, 50% (cinquenta por cento) do restante do valor que ainda seria devido pelo usuário em razão do plano contratado e do período restante de contrato.

De toda a sorte, mesmo que se entenda que a cobrança da multa é justa – note-se, vale repetir, que o sócio desistente indenizará a empresa por benefícios de que não usufruiu – seria prudente que o Clube, principal beneficiário da renda de seu associado, fosse claro ao prestar as informações ao torcedor que pretende aderir ao projeto, sob pena deste sentir-se lesado futuramente. Essa informação eu descobri ao ler o contrato e não foi divulgada pelo Fluminense através de seus canais oficiais e nem consta do novo site do portal do sócio em sua página principal ou na chamada para os planos de associação.

E não foi apenas isso o que descobri. Como sócio-torcedor, recebi um email informando que eu deveria atualizar a minha senha de acesso ao portal. Como determinado, fui direcionado a uma nova página do programa sócio-torcedor – não aquela que se acessa através do site oficial do clube – onde criei uma nova senha e conheci o novo ambiente virtual. Vasculhando o local, no campo referente à assinatura, verifiquei que lá constava que a minha forma de pagamento seria boleto bancário, o que me causou estranheza, pois sempre realizei a minha contribuição por débito em cartão de crédito. Fiz a mudança para débito em cartão, mas imaginei que tal fato deveria ter sido explicado, uma vez que outros dados do meu perfil pessoal não estavam atualizados, como o meu endereço. Ou seja, se não tivesse percebido a alteração na forma de pagamento, como receberia o boleto bancário para quitação se nem mesmo o meu endereço residencial constava dos arquivos do portal? Tal fato, por certo, poderá causar problemas a muitos tricolores desavisados.

Entendi, então, que ao atualizar a minha senha, aderi automaticamente à renovação de meu programa sócio-torcedor, agora gerido pela empresa Golden Goal Sports – cuja data do pedido consta como sendo o dia 30 de março de 2015, primeira cobrança, e a última cobrança está indicada como sendo em 10 de janeiro de 2016 – inclusive acatando um contrato cuja leitura e aquiescência não foram pré-requisitos para a adesão e que não existia no programa anterior.

A empresa, em que pese – não duvido disso – suas melhores intenções na operacionalização do projeto de associação ao Fluminense, faltou com o seu dever de informar com a mesma amplitude vantagens e desvantagens do novo projeto.

Assim, mais do que benefícios e outras contrapartidas, o que realmente fidelizará o torcedor, seja ele engajado ou não, é o dever de informação, corolário da transparência e da boa-fé que devem nortear as relações entre o clube e o seu sócio, além da prestação de contas dos valores auferidos, a fim de que se verifique, como também prometeu o presidente Peter em entrevista ao globoesporte.com, se os mesmos serão utilizados na formação da base em Xerém e na contratação de um grande elenco.

São atitudes simples, mas que indicam que essa parceria pode ser duradoura se houver confiança recíproca de ambas as partes. Para o torcedor engajado, a confiança num projeto sério e transparente é o seu maior incentivo para fidelizar-se como sócio do Fluminense.

Frise-se, por fim, que independentemente da justiça da cobrança – cujo mérito não discuto aqui – a Golden Goal Sports e o Fluminense, pois ciente do contrato de adesão, falharam ao não dar a devida publicidade às novas regras, sobretudo no que concerne à contrapartida do sócio em pagar multa em caso de desistência do plano durante a sua vigência, o que constitui, sem sombra de dúvida, falha no dever de informação, uma vez que tal previsão não incidia sobre os contratos de associação firmados antes de 31 de março de 2015.

Transformar uma relação que se baseava, preponderantemente, na espontaneidade e solidariedade do torcedor numa relação precipuamente consumerista, pode parecer profissional e até ser financeiramente mais proveitosa para o clube e a Golden Goal, mas se assim pretendem agir, que não se esqueçam de cumprir as determinações legais que protegem os consumidores, mormente aquela que já se descumpriu e consta do artigo 8º. do Código de Defesa do Consumidor.

Vale lembrar aos gestores do Clube que o torcedor sempre será o seu maior e mais fiel parceiro e assim merece ser tratado. Advertência oportuna que se faz para que a relação torcedor-Fluminense-Golden Goal seja longa e proveitosa para todos.

Leia o contrato em https://www.sociofutebol.com/conteudo/14

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @FFleury

Imagem: ffc

#Sejasóciodoclube

9 Comments

  1. Eu custo a acreditar que o Fluminense tenha recorrido a uma cláusula de aprisionamento. Nada mais antigo e desonesto. Que fase que nós estamos passando, meu caro…

    1. Pois é, Savioli. Também acho que não era necessária, mas vamos ver no que vai dar…Um abraço e ST

  2. Agradeço Felipe por ter postado sobre isso, refiz minha senha e até vi que a opção era boleto, porém não atualizei para cartão, pois não entendi ser necessário e talvez até um erro no site, afinal, meu cadastro estava lá.
    Depois querem reclamar do torcedor, mas como vc bem frisou, transparência é fundamental, lamentável…..e ainda corro risco de me ver cobrado com uma multa pq eles fizeram m…

    E o técnico novo faz uma continuação do trabalho do Cristóvão.
    E as táticas não mudam.
    É de…

    1. Eu é que agradeço a sua leitura, Carlos. Faço apenas a minha parte, muito pequena por sinal, mas se servir a ajudar alguém já terá valido a pena. Um abraço e ST.

  3. Qdo soube dos novos planos, achei que seria a chance de me tornar sócia torcedora. Triste ilusão! Os planos são até interessantes, entretando, estão fora da minha realidade. O boleto bancário ‘obriga’ a pagar o valor anual à vista. E a outra opção é o cartão de crédito. Como eu não uso esse recurso, mais uma vez, não serei sócia…

    1. Infelizmente, Alcina, são restrições que não se coadunam com o propósito de trazer mais e mais sócios para o Fluminense. Um abraço e St

  4. Confesso que não entrei nos detalhes de todas as opções dos novos planos, redefini minha senha e também optei por continuar com pagamento com cartão. Em relação aos novos planos, principalmente os mais caros, não consegui ver vantagens em relação ao sócio-contribuinte e ao sócio-proprietário, uma vez que estes têm acesso livre em todo o clube, mesmo este último tendo que pagar o valor do título.

    1. Bom dia, Eduardo. A questão principal desse novo modelo é que ele é operacionalizado pela empresa Golden Goal e, de acordo com as novas regras, o sócio-torcedor que desistir do seu plano na vigência do contrato estará sujeito à multa contratual. Não discuto o mérito da cobrança da multa, apesar de achá-la injusta, mas a falta de sua divulgação. Foi dada ampla publicidade aos novos planos, mostrando-se as suas vantagens, mas não fizeram o mesmo com as desvantagens, como a multa. ST

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