O que realmente importa (por Felipe Fleury)

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Quando o desembargador Bernado Garcez bateu o martelo na última quarta-feira, reconhecendo que o pó-de-arroz utilizado pela torcida tricolor há décadas, e há alguns anos proibido nos estádios, não provoca malefício algum a quem quer que seja e pode ser utilizado livremente, como reza a tradição de nossa torcida, ele também deu um recado bem claro ao autor da claudicante ação proibitiva: “Vocês devem se preocupar com o que realmente importa”.

Alguns anos foram perdidos em tempo e dinheiro, tanto na defesa da utilização do talco quanto na tentativa de sua proibição – só que neste último caso, dinheiro público desperdiçado, ao se provocar a atuação do Poder Judiciário para se pronunciar sobre um assunto que não possui relevância alguma para o Estado, pois sempre se soube – e posteriormente foi definitivamente comprovado nos autos – que o talco utilizado pela torcida do Fluminense para fazer sua festa no estádio não provoca qualquer dano à saúde ou à integridade física do torcedor.

Como eu disse, um processo dessa monta gera gastos, contribui para o atulhamento do Judiciário, já tão assoberbado com inúmeras outras demandas mais relevantes, e não apresenta qualque interesse para o Estado, o autor da ação.

Então o que explicaria toda essa pendenga judicial por algo tão irrelevante? O próprio desembargador Garcez, jurista experiente, culto e sensato, praticamente respondeu a pergunta ao afirmar que o Estado deveria se preocupar com coisas realmente importantes. E ele só não foi mais direto, porque a ética e o respeito inerentes ao seu caráter não permitiram.

Dizem – não posso confirmar isso – que o procurador que deflagrou a ação agiu por interesse pessoal, mais especificamente, rivalidade clubística. Não estou bem certo dessa eventual relação entre o autor da ação e o nosso maior rival – clube para o qual, segundo consta, ele torceria -, mas não há qualquer outro motivo concreto que autorizasse o Estado do Rio de Janeiro, através de sua procuradoria, a manejar uma ação tão desarrazoada, tão despropositada, senão a parvoíce e a mesquinhez de seu representante.

É uma pena que as despesas do Estado, derrotado, não sairão do seu bolso. Talvez por isso tenha enveredado nessa tentativa vã de macular uma das maiores tradições da torcida do Fluminense, a festa do pó-de-arroz, que não machuca, não contamina, mas tão somente embeleza e mantém viva uma das poucas, talvez a única, manifestação original do torcedor de um clube do futebol nacional.

A grande verdade é que a tradição do pó-de-arroz, guerreada injustamente como uma ameaça, deveria ser enaltecida e, inclusive, tombada junto ao patrimônio histórico-cultural brasileiro. Só não sugiro isso aos brilhantes advogados que defenderam tão valorosa e desinteressadamente a causa, porque imagino que já foram além de suas medidas e que o encargo, agora, deveria ser transferido a quem dele nunca deveria ter se desincumbido, a quem comanda o clube.

Mas voltemos ao procurador, seu interesse pessoal e sua conduta. O que o motivaria, realmente, a agir como agiu? Certamente não foi o seu senso de homem público.

Não é de hoje que o Fluminense é alvo de ações raivosas. Já imaginei tratar-se de recalque dos menos abonados rivais regionais ou nacionais em virtude do já finado patrocínio da empresa de planos de saúde, mas essa ideia desapareceu depois que a parceria se desfez.

O ódio persiste. A causa é mais profunda; é a incompatibilidade com as cores verde, branco e grená, com o próprio “DNA” tricolor, com o estilo de vida do torcedor do Fluminense. É inveja pura. Não falo de pobreza ou riqueza, mas de educação e da falta dela, ou de caráter e de mau caratismo. Essa diferença, embora não possa ser considerada uma regra – longe disso, porque todas têm as suas exceções -, indica uma característica marcante de nosso torcedor, algo que o diferencia de todos os demais.

Ou alguém conhece algum procurador ou outra autoridade tricolor que tenha, movido por sentimento abjeto, deflagrado alguma ação contra algum clube rival impugnando, por exemplo, a licitude do patrocínio de bancos públicos, ou impedindo acordos de financiamento de dívidas tributárias, presentes os seus requisitos legais?

Em que pese a gravidade maior repouse sobre a utilização da máquina pública para promover ações contra o Fluminense, ou sobre a preponderância do interesse particular e rasteiro para prejudicar o clube nos seus litígios judiciais já estabelecidos – como no recente caso do parcelamento da dívida tributária – os excrementos raivosos dessa gente também proliferam pela iniciativa privada.

As mentiras criadas para nos transformar em vilões do futebol brasileiro; as falsas histórias de viradas de mesa; a maior fraude de uma competição futebolística – que a imprensa cobriu de forma superficial e leviana atribuindo-nos a responsabilidade pelo descenso da Portuguesa de Desportos –; a FERJ e a máfia que nos perseguiu durante a última edição do finado campeonato carioca e ainda o episódio grotesco de um nauseabundo personagem que tenta recolher e destruir livros que contam a história tricolor, dão uma ideia – apenas uma ideia – daquilo que sofremos por sermos o que somos.

Não se trata de mania de perseguição. Contra fatos, diz-se, não há argumentos, e todos nós, tricolores, os conhecemos como as palmas de nossas mãos.

Não penso que essa situação vá mudar algum dia. Afinal de contas, para isso acontecer, teríamos que ser o que não somos, iguais a eles.

Só espero, todavia, que os nossos detratores sigam a orientação do desembargador Garcez: que se preocupem com o que realmente importa e nos deixem em paz.

Porque eu, como tricolor, não me preocupo se o Botafogo é um clube falido, se o Vasco poderá ser rebaixado para a série B, ou se Zico levará adiante a sua candidatura à presidência da FIFA. Eu, como tricolor, me preocupo apenas com o que realmente importa, com o Fluminense.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @FFleury

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