O lendário Fla-Flu da Lagoa (por Rods)

Fla-Flu da Lagoa

Não há discussão, o Fla-Flu é o clássico dos clássicos. Outros podem se equiparar em rivalidade, como Brasil e Argentina, Corinthians e Palmeiras, Atlético e Cruzeiro, Inter e Grêmio, Bahia e Vitória, Barcelona e Real Madri e até, após a virada do século, do próprio Flamengo com o Vasco. Mas é o charme, os detalhes, as peculiaridades, os capítulos da história de um confronto, suas lendas que o tornam maior que os outros.

E, desses capítulos, a dissidência de alguns jogadores que acabaram por levar o futebol à Gávea é apenas o primeiro. De todos, o mais divertido talvez seja o lendário Fla-Flu da Lagoa, que aconteceu no dia 23 de novembro de 1941, há 74 anos atrás.

É claro que a barrigada de 95 nos proporcionou uma diversão sádica, mas a decisão do Campeonato Carioca de 41 é lembrança de um futebol sem melindres, sem mimos, sem toda a ganância de hoje. Malandro, mas, por assim dizer, de uma malandragem inocente. O jogo se tornou praticamente um causo do futebol.

Vamos ao cenário. O ano de 1941 foi bem importante na história brasileira e dois fatos merecem destaque:

Dia 22 de março: o Taubaté, navio da Marinha Mercante Brasileira, foi atacado pela força aérea alemã. Não houve aviso, nem explicação e nem pedido de desculpas. Ali foi dado o primeiro passo para que entrássemos na 2ª Guerra Mundial, um ano depois.

Dia 1º de maio: Getúlio Vargas anuncia a criação das Leis Trabalhistas. Se hoje você comemora o feriado, imagine os trabalhadores da época que não tinham qualquer tipo de proteção? Alguns historiadores questionam as reais intenções do então presidente, mas, por outro lado, o ato criou um grupo de seguidores incondicionais e, por décadas após sua morte, seu túmulo foi visitado pelas chamadas “Viúvas de Getúlio”.

Mas chega de aula de história e vamos ao futebol. Após o título de 40, o Fluminense fez uma bela campanha em busca do bicampeonato, com direito a uma goleada sobre o Vasco por 6 a 2. Como naquela época ainda não existia o Maracanã, os grandes mandavam os jogos em seus estádios: o Fluminense nas Laranjeiras, o Vasco em São Januário, o Botafogo em General Severiano e o Flamengo na Gávea. Este último, palco do Fla-Flu que definiria o campeão do ano.

Neste ponto, preciso informar que parte da Lagoa Rodrigo de Freitas ainda não havia sido aterrada e a água ficava a poucos metros do gramado.

O empate dava o bicampeonato ao Fluminense e, assim, aos donos da casa, só a vitória interessava. O tricolor era comandado por Ondino Vieira, que mandou a campo Batatais; Machado e Renganeschi; Malazzo, Brant e Afonsinho; Pedro Amorim, Romeu, Russo, Tim e Carreiro.

Muito – e justamente – se fala do Castilho ao sacrificar um dedo pelo Flu, mas o goleiro Batatais, que defendeu a Seleção de 38, deslocou a clavícula durante a decisão e, ainda assim, conseguiu fazer algumas defesas importantes. Não saiu de campo, pois não se podia fazer substituições no futebol da época. Outro destaque era Adolpho Milman, o Russo, que é o nosso 7º maior artilheiro. Seu apelido se dava por ter nascido na província russa que hoje é o Afeganistão.

Pois bem, ainda no primeiro tempo, o Fluminense abriu dois a zero com Pedro Amorim e Russo.

“Pedro Amorim cobrou a falta e a bola foi e voltou à cabeça de Affonsinho três vezes. Na última partiu de direção a Carreiro que desviou para Russo, colocando-a este novamente no arco defendido por Yustrich. Era o segundo goal do Fluminense. Uma vantagem quase intransponível”, escreveu O Globo Sportivo.

O Flamengo diminuiu antes do intervalo e na segunda etapa, partiu pra cima em busca da virada. Pirillo, artilheiro rubro-negro e do campeonato, havia feito o primeiro e fez também o de empate. Aí foi pressão total.

“Carreiro já havia sido expulso do gramado por excesso de preciosismo do árbitro. Batataes mal conseguia dominar a dor do braço ferido com uma pisadela proposital de Pirillo. Com o ‘keeper’ quase sem ação e um ‘player’ a menos, restava ao Fluminense defender-se da melhor forma. A forma indicada era a cera”, continuava o jornal.

Lagoa

E a cera nos minutos finais veio de uma forma inusitada: chutões para a Lagoa. O Flamengo pressionava, o Fluminense recuperava a bola e chute pra Lagoa. Isso se repetiu até acabarem as bolas – não eram tantas como hoje – até que o time de remo fez jus ao seu nome e botou seus remadores para trabalhar. Pela proximidade da água, era até uma prática normal, mas não daquele jeito. A velocidade e o desespero em buscar as bolas, que foram colocadas “para nadar”, eram tamanhos que a cena em si parecia uma competição.

Naquele tempo, o cronômetro era parado quando a bola não estava em jogo, logo, a cera tinha um efeito muito mais cansativo e “resfriador” do que de fazer passar o tempo. No fim, a tática deu certo, deu o bicampeonato ao Fluminense e deu nome à decisão. O Fla-Flu da Lagoa será sempre lembrado na história.

Como eu disse, o jogo virou praticamente um causo, pois nem todos os jornais da época noticiaram e alguns historiadores divergem do caso. É bem capaz que a história tenha sido aumentada e até, em parte, inventada.

Porém, aqueles que testemunharam a decisão garantiam que tudo aconteceu e o relato do Globo Sportivo ficou como “prova concreta”. Uma possível desculpa deles que virou um dos vários motivos para rirmos de suas caras.

Quero aproveitar o aniversário do lendário Fla-Flu da Lagoa e dar os parabéns ao meu pai, que completou seus 72 anos no mesmo dia. É ele o grande responsável por me fazer tricolor, motivo pelo qual serei sempre grato. Parabéns, Seu Vernon!

ST!

Panorama Tricolor

@Panoramatri @Rods_C

Imagem: Rods – EM / Reprodução

Fonte: goal.com / wikipedia

3 Comments

  1. Amei conhecer mais um capítulo do meu amado Fluminense! O não conhecimento desse “causo” me rendeu algumas tiradas de sarro por parte de meu esposo, outro tricolor apaixonado, o que me fez procurar informações a respeito. Adorei o relato, parabéns . Saudações Tricolores!!!

  2. Caro RODS,
    Prazer em “conhecê-lo”. Você foi-me apresentado pelo senhor seu Pai, o querido amigo VERNON, colega dos exercícios necessários/recomendados que fazemos na Reabilit, uma
    clínica de fisioterapia, aqui em Brasília.
    Gostei muito da sua crônica sobre essa história ou estória.
    Sobre o FLA X FLU, existem capítulos memoráveis que nos proporcionam momentos de alegria, como também de sofrimento. Parabéns e “SAUDAÇÕES TRICOLORES”…

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