Horizonte (por Lennon Pereira)

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Estava eu aqui a contemplar o belo por do sol no horizonte e me veio à memória a lembrança de Francisco. Um jovem às voltas de completar trinta anos de vida. Um brasileiro médio, que se não se destacava pelo porte atlético ou por feições finas das ascendências arianas, era muito querido pelo olhar atencioso, amável e respeitoso que dispensava a todos aqueles que com ele conviveram.

Tinha sempre tempo para parar para ouvir quem estivesse disposto a contar algo. Seja o que quer que estivesse fazendo, por mais importante que fosse o compromisso, Chico sempre parava para ouvir. Dizia ele que aprendera com um escritor do século XVII um de seus lemas de vida: “Quem anda muito depressa não tem tempo de admirar as janelas de Deus”. Nunca entendi muito bem o que isso queria dizer, mas a verdade era que ele parava e dava real atenção, ouvia com os ouvidos, os olhos e com o coração. Com essa característica, Chico passou a ser aquele a quem todos procuravam quando precisavam de um ombro amigo, de um conselho ou apenas um desabafo.

Muitos amigos, muito querido, Chico guardava sempre um mistério no olhar. Sempre achei que ele tinha um olhar que, no fundo no fundo, era triste, um “q” de nostálgico, ou algo assim.

Apesar de ótimo ouvinte, Chico era pouco falante. Paradoxalmente, ouvia com afinco a todos mas raramente se ouvia Chico falando de si mesmo, contando sobre alguma conquista, alguma incerteza, um medo, uma frustração. Muitos diziam que era o jeito dele, que as pessoas são assim etc. Outros chegavam a comentar que Chico fazia isso de charme e que gostava de ter em torno de si uma aura de mistério, de nostalgia.

Disse-me uma vez uma amiga psicóloga, que não há nada melhor para atrair as mulheres do que um olhar tristonho. Segundo ela, as mulheres não resistem à missão de consolar um coração sofrido. Talvez seja verdade, talvez mais uma lenda urbana. De certo que esse não era o objetivo do nosso amigo. Raramente o via com namoradas. Flertava com uma ou outra, mas mergulhar mesmo era algo que não fazia parte de sua cartilha.

Acabamos ficando muito amigos. Sabe se lá por que motivo, Chico resolveu que comigo se abriria. Algumas vezes, em momentos mais agudos, sentávamos na mesa do bar, ou a beira da praia para falar sobre a vida, filosofar ou apenas viajar nos pensamentos.

E foi num dia desses, sentados na pedra do Arpoador que eu entendi qual era a verdadeira história de nosso amigo e o motivo daquela tristeza no fundo de seu olhar.

Chico apontou a linha onde o céu se encontra com o mar e disse: – “Olha lá meu amigo, a famosa linha do horizonte. Bela, encantadora, misteriosa, admirada, decantada em verso e prosa por poetas, cantores e compositores. A linha do horizonte é como o amor. Se você perguntar, todos sabem dizer o que é, onde fica, desfilam seus encantos e belezas, mas jamais alguém algum dia pôde tocá-la, ou mesmo provar que ela é real. Existe e pronto. Podemos sentir e isso nos satisfaz. Uma vez aqui nessa pedra, a única mulher que amei na vida me disse que nosso amor nunca acabaria e que quando estávamos juntos era como se pudéssemos estar fisicamente ali, na linha do horizonte .

Meses depois adoeceu misteriosamente e morreu. Antes de partir, olhou para mim e, com as últimas forças, disse que seu amor por mim seria eterno. Quando partisse, estaria me esperando um dia, na linha do horizonte que tanto nos inspirou, paisagem que tanto amávamos. Naquele dia prometi a mim e a ela que guardaria nosso amor para toda a eternidade e que estaria a flertá-la, cortejá-la e reafirmar meu amor, toda vez que meus olhos se perdessem no horizonte.”

Chico falou e eu aprendi. Seu olhar não era tristonho nem misterioso. Era apenas um olhar saudoso, de quem conheceu o amor de forma tão plena e arrebatadora, que o fez viver em paz, apenas esperando o dia em que ele e sua amada voltariam a se sentar para namorar, dessa vez não sobre a pedra, mas sobre a linha do amor, eterno…

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

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1 Comments

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    and brings up the fact that Callie cut off her leg.

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