Coragem, Peter! (por Sergio Trigo)

peter siemsen

Prezados amigos, saudações tricolores!

‘Acho que do chão se levanta tudo, até nós nos levantamos’.

A frase acima é do escritor português José Saramago, falecido em junho de 2010, em referência à sua obra intitulada “Levantado do Chão”, lançada em 1979, com a qual esbarrei quase ao acaso em uma das minhas incursões aos sebos literários do Centro do Rio de Janeiro, em busca de erudição e descontos. Desde o referido encontro, tornou-se impossível não associar o título do livro ao momento do Fluminense Football Club…

A partir do final dos anos 1980, o Tricolor passou a experimentar dificuldades dentro e fora de campo, que tiveram no espaçamento de suas conquistas desportivas um de seus principais indícios. Mesmo assim, em 1995, o clube viveu um dos mais belos momentos de sua história, quando conquistou de forma épica o título estadual daquele ano, com um gol de Renato Gaúcho nos estertores do Fla-Flu que decidiu o certame, em um momento em que tudo já parecia perdido.

A conquista sugeria a redenção de um clube que caminhava a passos largos em direção ao abismo e foi anunciada como o prenúncio de um novo período de glórias nas Laranjeiras. O tempo, porém, revelou que o título isolado guardava relações mais próximas com as atuações de um predestinado e de um grupo de jogadores que superou as próprias limitações para conquistá-lo do que com a redenção de um gigante. O clube, em si, já se encontrava a caminho dos subterrâneos do futebol brasileiro.

Daí por diante, o Fluminense conheceu os piores momentos de sua história, que acabaram por levar o futebol do clube e seus torcedores, razões primordiais da existência do Tricolor, a lugares outrora inimagináveis. De glórias e vitórias mil, a rotina tricolor foi substituída por dívidas e humilhações dentro e fora dos gramados. A situação beirou o irreversível e das entranhas das Laranjeiras chegaram a surgir as mais estapafúrdias propostas, entre as quais, o encerramento das atividades do departamento de futebol do Fluminense. Não contasse o Tricolor com tão influente e numerosa torcida, penso que alguma dessas propostas teria prosperado…

Ferido na sua dignidade, o clube limitou-se a sobreviver durante algum tempo, até que, aos poucos, começou a dar sinais de recuperação, apoiado por uma sugestiva parceria com uma empresa de saúde. Depois de conquistar o título que tricolor algum jamais ousou disputar, o clube acabou beneficiado por uma confusão envolvendo outros clubes brasileiros, a CBF e a FIFA, que foi parar na justiça comum.

Devolvido ao lugar de onde jamais deveria ter se ausentado, o Fluminense voltou a realizar boas campanhas e pouco a pouco começou a reconquistar o seu lugar no cenário futebolístico nacional. De 2005 para cá, o clube se levantou e reassumiu o seu papel de protagonista no futebol brasileiro e, apesar dos percalços, desde então a torcida tricolor pode desfrutar momentos inesquecíveis, como a conquista da Copa do Brasil de 2007, a linda campanha da Taça Libertadores de 2008, a épica campanha de do Time de Guerreiros em 2009, os títulos de Campeão Brasileiro de 2010 e de 2012, e o carioca de 2012.

É inegável que a parceria com a Unimed contribuiu em muito para tais conquistas, ainda que por vezes tenha nos imposto condições, a meu ver, desfavoráveis ao clube. Porém, assim como os títulos citados acima, vivemos momentos difíceis e vimos no ano passado o retorno de antigos fantasmas que assolaram as Laranjeiras por mais de uma década. Em suma, a presença desse (ou de qualquer outro) patrocinador não é garantia de sucesso.

Mais do que as predileções pessoais do presidente da patrocinadora, a questão que hoje se apresenta nas Laranjeiras deve ter por foco a autonomia do Fluminense Football Club. Em uma parceria que envolve cifras milionárias, é comum que o investidor pleiteie o direito de opinar em determinadas questões. É assim na maioria das empresas. Compete, no entanto, aos administradores do negócio estabelecer os limites de atuação de seus parceiros.

O clube precisa conseguir caminhar com as próprias pernas e ter a autonomia necessária para as tomadas de decisão. O clube deve buscar a retomada sustentável de sua grandeza em vez de limitar-se a sobreviver apoiado em um parceiro que, naturalmente, possui seus próprios interesses.

Peter está diante de uma ótima oportunidade para colocar clube e patrocinadora em seus devidos lugares. Para fazê-lo, no entanto, será preciso coragem e determinação. Ainda que tenha se mostrado vacilante em alguns momentos recentes, acredito que o presidente esteja disposto a fazê-lo. Cumpre destacar que, para isso, será preciso ter a certeza de que não existem acertos ocultos ou tenebrosas transações que atrapalhem o grito de independência, a serem revelados.

É preciso perceber a existência de um processo em curso, que cedo ou tarde trará mudanças de cenário. É necessário aproveitar o momento, estruturar o clube internamente e fazer o que precisa ser feito, para que haja vida após o fim da parceria. E, por “vida”, entenda-se uma vida digna das tradições do Fluminense.

Apoiado na força de sua camisa, de sua torcida e de sua marca, o Fluminense há de se levantar novamente.

Uma plaquinha de agradecimento e um aperto de mãos cairiam muito bem.

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Saudações TRIcolores.

Panorama Tricolor

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P.S.: Se você, assim como eu, tem o hábito de guardar os ingressos de partidas do Fluminense, entre em contato comigo. Possuo uma coleção de ingressos de quase mil partidas do nosso Tricolor e tenho interesse em trocar ou adquirir aqueles que não figuram na minha coleção.