Ainda o Engenhão (por Jorge Dantas)

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Engenhão: ruim com ele, pior sem ele.

A interdição do Engenhão revela uma triste realidade do futebol brasileiro, e em especial do carioca: a falta de estrutura para a prática de um futebol de qualidade, rentável e atrativo.

Jogar nos campos do Rio de Janeiro hoje é uma aventura, uma verdadeira ofensa à arte de jogar bola.

Os estádios disponíveis que restam mal abrigam a torcida, que fica exposta ao sol ou à chuva, sentada em desconfortáveis escadarias de concreto quentes ou molhadas, conforme o clima.

Dá vergonha ver jogos em Moça Bonita, um dos “melhores” estádios do Rio de Janeiro, onde chovem pipas de papel seda com suas perigosas linhas de cerol sobre gramados esburacados, que obrigam paralisações repetidas das pelejas para que o gandula ou os próprios jogadores, juiz e bandeirinhas as recolham para dar sequência às partidas – chochas e sem brilho, diga-se de passagem – com “segurança”. E a pobre e maltratada torcida, que ainda insiste em se deslocar para os estádios em trens decadentes, sujos, quentes e lotados ou em ônibus velhos e sem um mínimo de conforto, ainda tem que pagar ingresso para ver pernas-de-pau darem chutões e patadas em campo.

Imagens de jogos grotescos praticados em ambientes adversos e ultrapassados correm o mundo, passando uma idéia de atraso social, de falta de qualidade do nosso povo e de baixo senso de organização e planejamento, confirmando que infelizmente o Brasil é mesmo um país atrasado e despreparado para organizar uma Copa do Mundo com a qualidade que se vê na Europa. Isso sem falar que, na hora do aperto, os sofridos torcedores têm que usar banheiros imundos, fétidos e sem água, que mais parecem pântanos de urina.

O Rio de Janeiro viu o seu futebol profissional se sedimentar em um único estádio de futebol capaz de receber massas de torcedores: o Maracanã. E foi nesse ambiente mágico que as torcidas prosperaram e o futebol carioca se tornou forte e vencedor. Mas, como tudo na vida o nosso querido “Maraca” envelheceu, se tornou obsoleto. Sob obras, fechado há mais de dois anos, restou aos clubes o Engenhão, estádio que não ganhou a simpatia das torcidas.

Opcionalmente, restam aos valorosos quatro grandes clubes da cidade, com pretensões de serem reconhecidos como de “classe mundial”, estádios modestos como São Januário – ultrapassado e mal localizado, da Cidadania, em Volta Redonda, distante uma hora e meia do centro do Rio, e demais “campos” de clubes pequenos do subúrbio (Madureira e Bangu) e das cidades do litoral e do interior fluminense. A dupla Fla-Flu, dois dos maiores clubes do país, ou não tem estádio (Fla) ou não tem condição de abrigar nem os jogos do Cariocão (Laranjeiras).

E pensar que na década de 1950 o Flu perdeu uma bela e única oportunidade de adquirir um terreno na Barra da Tijuca, com praia e tudo, onde poderia ter erguido um majestoso estádio de futebol e um grandioso CT. O terreno era 14 vezes maior que a área das Laranjeiras e 18 vezes o futuro CT. Mais tarde, na década de 1970, novamente o Flu perdeu a chance de construir um estádio moderno, também na Barra da Tijuca. E tudo por conta de alguns conselheiros retrógrados, sem visão, mentalmente preguiçosos e perniciosos, que atrapalharam e continuam atrapalhando o Tricolor numa espécie de traição ao clube.

Hoje, nos vemos nessa situação ridícula de não ter estádio, de mendigar a boa vontade do Vasco para ter onde jogar, de ver o projeto de conquista da Libertadores ameaçado por não ter um estádio identificado com o clube, onde os jogadores se sintam confortáveis, seguros e confiantes, de ver jogos darem prejuízo sistematicamente e não enxergarmos um futuro com um estádio próprio, que nos dê segurança e condições de criar receitas que garantam investimentos em projetos que lancem o clube na direção de um cenário de modernidade, que viabilize um projeto de crescimento de torcida, de aumento de receita que viabilize investimentos em grandes times e em mídia de divulgação e que o leve a conquistar um lugar dentre os maiores clubes do planeta.

Esse quadro desfavorável somente aumenta a desconfiança e o desalento do torcedor, maltratado pelo Estado e pelos clubes, relegado a uma situação secundária e vendo o Estatuto do Torcedor ser descumprido pelas autoridades que comandam o futebol, que parecem matar a galinha dos ovos de ouro, tal o desprezo e falta de inteligência que tratam o torcedor. Enquanto a Federação de Futebol enche os cofres e os bolsos de seus dirigentes, os clubes vivem à mingua, devendo fortunas e vendo seus projetos de crescimento serem engolidos pela sarjeta da incompetência que assola o nosso pobre futebol rico.

Jorge Dantas

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

2 Comments

  1. Não sei exatamente de quando é o estudo, mas é posterior a 2000. Uma pesquisa inglesa citando os melhores estádios do mundo pra se assistir futebol. São Januário era um dos dez melhores.
    Comprar ingresso é um inferno. Estacionar é outro. Mas..
    “Ultrapassado” por que? faltam pufes? estofados? tapetes vermelhos?
    “Mal localizado” ? A cinco minutos do Pavilhão de São Cristovão – saída pra qualquer canto da cidade?
    Desculpe a crítica, mas você está bebendo na fonte da fla-press, que jamais vai admitir que São Januário é um estádio charmosíssimo, delicioso para se assistir futebol. Os problemas certamente não estão no interior do estádio.
    Infinitamente melhor do que a porcaria do Engenhão, agora interditado.
    Grande abraço e saudações Cruzmaltinas.

  2. Rods comenta:

    Jorge, eu fiz até uma brincadeira com tom de verdade e precognição no FB e no Twitter:

    O que o Campeonato Carioca de Futebol e o Campeonato Brasiliense de Surfe tem em comum?

    Ambos são disputados no nordeste.

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