A lei de Gerson (por Paulo-Roberto Andel)

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Já estava escrito, não havia nada a fazer.

Com 18 anos de idade, ótimo salário, carrão importado e diante da incrível legislação esportiva brasileira, o jovem Gerson sai do Fluminense e este, por sua vez, capta uma bolada de grana, 50 milhões (ou mais milhões ou menos milhões, são milhões pra cacete), que (talvez) possa deixá-lo menos desconfortável do ponto de vista econômico. Os clubes brasileiros vivem em penúria, explorados pela Rede Globo e vem à tona a natural tendência de exportar matéria-prima para adquirir manufaturados.

Tudo é rápido demais.

No começo deste ano, tirando os nossos maníacos que sabem tudo de clube, até a cor do cadarço do roupeiro, a turma não conhecia Gerson direito. Claro, havia as referências positivas dos olhares atentos, mas nada além disso – muitas vezes, brilhantes garotos dos juniores não rendem no time profissional. Cadê o Toró e o Lenny?

Uma vez ou outra, mesmo longe de ser um Deco ou R10, Gerson cumpriu grandes atuações. Era uma promessa das melhores: visão de jogo, qualidade no passe, destreza. Logo despertou a opulência de além-mar; era carta fora do baralho. Questão de tempo.

O que eu acho estranho, não nesse caso somente, mas no futebol em geral, é a coisa de um rapaz sair do nada para o estrelato, muitas vezes sem qualquer tipo de preparo intelectual e/ou psicológico, e em seguida mergulhar em gramados do exterior. Claro, o esporte é profissional, os garotos muitas vezes vêm de humílimas condições de vida, é natural que procurem pelo melhor o mais rápido possível. Mas antigamente era diferente: não bastava a um sujeito a suspeita de ser craque – era preciso demonstrar o talento por duas, três, quatro temporadas. Nowadays, qualquer um vale trocentos milhões – sem desmerecer Gerson, lógico.

Há um outro fator que influencia muito: um pai mala. No caso do jovem jogador em questão, mera constatação.

O Fluminense tem sido reconhecido nos últimos anos como um formador de jogadores de qualidade. Muitos hoje espalhados pela Europa e Ásia. Maicon Bolt se mantém firme no futebol russo. Wellington Nem, mais ou menos, teve contusões. Alan, dos melhores já formados na era recente, ficou cinco anos na Áustria e agora joga na China. Rafael, lateral gêmeo de Fábio, acabou de ser contratado pelo Lyon, depois de cinco anos no Manchester United – os irmãos jamais vestiram nossa camisa profissionalmente.

Quem se lembra do atacante Wellington Silva, que criou caso para ir embora e fechar com o Arsenal da Inglaterra? Imediatamente foi emprestado, rodou por equipes de pequeno porte da Espanha e agora luta para se estabelecer em solo bretão.

Nas últimas semanas, Gerson foi (justamente) criticado com veemência pela suposta falta de dedicação no campo. Acordava, vivia e dormia com a cabeça no Barcelona, claro. Sonhava em tabelar com Neymar e Messi. Um caminhão de dinheiro chegou na hora exata, mas o destino tomou outros rumos: negociado com a Roma, será emprestado ao Bologna por um ano para “ganhar experiência” (embora já tenha jogado bem no que sobrou do Maracanã, o que não é pouca coisa).

O tradicional clube italiano, apelidado de Rossoblú, acabou de voltar à divisão principal do calcio. Com um passado de glórias, seu último título de grande importância foi a Copa da Itália na temporada 1973-1974. Recentemente, seu craque brasileiro foi Ibson, hoje no futebol estadunidense.

Não fosse a força da grana que ergue e destrói coisas belas, talvez Gerson escrevesse seu nome na constelação do Fluminense. Talvez.

Não deu tempo, havia outras prioridades.

O dinheiro veio com enorme voracidade, mas só o futuro irá dizer se esta era realmente a melhor opção para as partes envolvidas. Que todos logrem êxito. Por enquanto, sem agourar ninguém, a primeira impressão que fica é a de um negociaço-aço-aço para os cofres das Laranjeiras. Em termos de jogo, que me desculpem e nem quero ser precipitado, mas quando você tem um R10 no meio fica difícil de ter saudade de qualquer atleta. Mesmo que só viaje no fim da temporada, parece pouco razoável o aproveitamento efetivo de Gerson, até por já ter outro compromisso: quem arriscaria um cofre do Tio Patinhas por uma dividida arriscadíssma?

Mas não estou aqui para falar somente da boa grana amealhada. Por um instante, paro e penso em Thiago Silva chorando no gramado daquele Maracanã lotado contra o Ipatinga, ano de 2008 – nossa torcida compareceu em massa apenas para a despedida; já estávamos livres do descenso desde a rodada anterior, depois de um heroico empate contra o São Paulo, futuro tricampeão brasileiro, em pleno Morumbi. Thiago havia saído de um 2006 difícil para as conquistas da Copa do Brasil de 2007, o vice-campeonato da Libertadores e, neste mesmo ano, uma enorme luta pela permanência na série A. Gratidão é tudo.

A reflexão sobre tudo isso cabe a outro personagem: um garoto chamado Robert.

E todos nós seguimos em frente, ansiosos pela manutenção da excelente campanha no Brasileirão. Aguardando as cenas dos próximos capítulos. E tentando antever as jogadas.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: exulla

LIVRO LUCIO E RODO

2 Comments

  1. Grande Andel !

    O jeito e esperar esses caras voltarem pra encerrar a carreira no Fluzao….. E fiquemos felizes se acontecer, porque e dificil o din din nao falar mais alto hj em dia.

    Abracos da Califa,

    Rodrigo

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